Liderança e dependência emocional do líder

Edição XXIX | 06 - Nov . 2025
   A liderança nas organizações enfrenta ao menos dois grandes desafios, que precisam ser equacionados se quisermos prosperar em segurança: de um lado, o fato de que a nova geração do mercado de trabalho, principalmente da geração Z, está pouco interessada em progredir na carreira como gestores ou líderes; de outro, e ainda mais importante, temos um problema com os líderes que aí estão, muitos deles enfrentando uma crise de consciência emocional. Isso não se dá no sentido patológico, mas de não saberem o que fazer e de como se comportarem diante da dinâmica do mundo em movimento acelerado.

    Essa fragilidade interna se torna ainda mais sensível quando entramos no campo da liderança intergeracional: diferentes expectativas, valores, linguagens e motivações geram atrito, e poucos líderes estão preparados para orquestrar essa diferença sem sucumbir ao desgaste emocional. Daí surge a questão central: a dependência emocional.

   Dependência emocional disfarçada  de liderança
   Antes de tudo, é necessário saber que o ser humano, como espécie, precisa de aceitação e reconhecimento. Não é uma questão de opção; faz parte da nossa necessidade social. Mas a dependência emocional a que me refiro é um estado em que o líder precisa da aprovação constante do grupo para se sentir competente, valorizado ou seguro em sua posição. Tenho visto muito isso nas minhas palestras, mentorias e programas corporativos.

   Em vez de tomar decisões guiadas por propósito, clareza e, principalmente, necessidade (fazer o que precisa ser feito), ele passa a agir para agradar, evitar conflitos ou manter o próprio ego alimentado. No fundo, a dependência emocional é a busca por aceitação disfarçada de cuidado. O líder acredita estar preservando o clima da equipe, mas, na prática, cria uma relação de dependência mútua, onde ninguém amadurece e todos perdem autonomia.

   Muitos líderes confundem vínculo saudável com necessidade de aprovação. O desejo de ser querido, admirado ou indispensável cria relações de dependência e enfraquece a autonomia da equipe. O líder se torna emocionalmente refém do próprio time: evita confrontos, posterga decisões impopulares e busca ser amado em vez de ser respeitado.
Um exemplo frequente é quando um gestor evita corrigir comportamentos improdutivos para não “magoar” o colaborador; está exercendo poder sob a ótica da carência, não da liderança. Essa postura gera uma cultura permissiva, na qual o medo de desagradar supera o compromisso com o resultado.

   O vício de ser necessário
   Por outro lado, há líderes que não suportam a ideia (mesmo que não percebam isso) de não serem mais o centro das atenções. Criam times dependentes porque precisam se sentir insubstituíveis. Não delegam e quando o fazem, “delargam”. Alimentam o próprio ego em nome da responsabilidade. Se sentem bem no conceito ultrapassado de “gestor bombeiro”, que vive apagando incêndio, mas se mostra relevante.

   É tão ultrapassado esse conceito que os próprios bombeiros já passaram há muito dessa fase de apagar incêndios e salvar vidas como atividade essencial do seu trabalho. Passaram a se ocupar essencialmente na prevenção, na antecipação, na checagem de processos internos nas organizações, nos alvarás e no treinamento de civis nas organizações. É isso que os gestores precisam ter em mente.

   Conheço muitos líderes que centralizam todas as decisões e nunca tiram férias, por exemplo. Não fazem isso apenas por zelo, mas por medo de não serem mais essenciais ou por não entenderem seu real papel. Ocorre que esse comportamento sufoca a equipe, elimina a inovação e impede a sucessão. O líder acredita estar mantendo o controle, mas, na verdade, está limitando o crescimento coletivo. É o ego travestido de zelo.

   Quando o líder é emocionalmente dependente, a equipe se torna obediente, mas não autônoma. As decisões se centralizam, a criatividade diminui e o medo de errar paralisa. Em ambientes assim, ninguém amadurece.

   O lado humano do líder e o paradoxo do comando
   Como disse, todo líder precisa de reconhecimento, isso é humano. Mas quando a validação se torna o combustível principal, a liderança perde poder. O equilíbrio está em desenvolver consciência emocional suficiente para não confundir afeto com aprovação.

   Um líder emocionalmente maduro compreende que o respeito nasce da coerência, não do consenso. Sim, nem sempre pode haver consenso, às vezes o líder precisa ser diretivo. Nesses casos, ele sabe ouvir, mas não se curva a toda opinião. Reconhece o erro, mas não se diminui por ele. E, sobretudo, não mede seu valor pela quantidade de elogios, e sim pelo impacto que causa nas pessoas e nos resultados.

   O verdadeiro líder é aquele que ensina o time a não depender dele. Liderar é criar sucessores, não seguidores. Isso exige desprendimento: renunciar ao protagonismo e aceitar que a maior prova de liderança é ver o grupo funcionar bem na sua ausência.

   Aliás, sempre que me perguntam: como eu sei se sou um bom líder? Eu respondo: tire férias ou ao menos saia uma semana. Se tudo correr bem, é sinal de que você está formando sua equipe com autonomia suficiente e sabendo o que precisa ser feito. Se tudo flui, é sinal de maturidade. Mas se os problemas se avolumam ou seu celular não para de tocar, é sinal de centralização. Precisamos entender que comando não é controle, mas influência.

   Por onde começar?
  Tudo começa no autoconhecimento e se sustenta no autodesenvolvimento. Aliás, esse é o foco de qualquer mentoria executiva que se preze. Começa por conhecer bem suas limitações e suas potencialidades comportamentais e continua pela construção do plano de desenvolvimento.

   Líderes que não investem em si mesmos tendem a centralizar decisões, evitam delegar e mantém equipes em dependência. O medo gera a dependência emocional do líder, que reforça ciclos viciados de apego, controle e insegurança. Essa dinâmica gera um ambiente de baixa autonomia, excesso de ruído emocional e cultura de medo de errar.

   Se acrescentarmos o pouco interesse dos jovens pela liderança formal a essa liderança atual fragilizada emocionalmente, temos um problema estrutural enorme. Precisamos virar o jogo sob o risco de continuarmos a cultivar líderes estressados e organizações vulneráveis às rupturas.

   Até a próxima.
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