Gestão de processos e da qualidade na multiplicação de sementes:

como fazer?

Edição XXIX | 01 - Jan . 2025
Jean Carlo Possenti-jpossenti@utfpr.edu.br
   Trazer para a prática conceitos previstos na legislação nem sempre é tarefa fácil, principalmente na produção de sementes. A Portaria MAPA 538 de 2022 diz que o produtor de sementes deve responsabilizar-se pela produção e pelo controle da qualidade e identidade das sementes em todas as etapas.

   Esta simples redação do § II do art. 3º, além de implicação conceitual, é também norteadora de todos os processos que devem ser feitos desde a inscrição dos campos de multiplicação até a venda das sementes. A Lei de Sementes, seu decreto regulamentador, portarias e instruções normativas que formam o arcabouço legal da atividade sementeira possuem uma enormidade de conceitos, orientações e informações.

   Este conjunto de informações vai desde as mais amplas e gerais até aquelas específicas, muitas vezes por cultura que deseja multiplicar. Para a produção de sementes certificadas, como básica, C1 e C2, este processo de entendimento e orientação a ser seguida fica mais fácil. Quer seja pela prestação do importantíssimo apoio a entidade certificadora ou mesmo pelo regramento imposto a ser seguido pelos certificadores de produção própria.

   Mas o mercado consumidor de sementes, é igualmente abastecido por sementes produzidas fora do sistema de certificação, como S1 e S2. Via de regra, os reembaladores, que produzem as misturas de sementes, também as fazem fora do sistema de certificação. Isso se dá principalmente por questão de custos operacionais e devido aos muitos dos materiais que são componentes das misturas não possuírem origem genética comprovada, lhes condicionando compulsoriamente a serem produzidos nas categorias S1 e S2.
Assim, para o mercado consumidor, interessa a qualidade como um todo. Ao comprar sementes legais de qualquer cultura, um agricultor espera que estas cumpram o seu propósito, que nada mais é do que rápida e uniforme emergência, com fechamento de estande e todos os demais atributos de qualidade esperados. Classe e categoria de sementes nem sempre são fatores de decisão ao comprar sementes. Por ocasião da precificação das sementes, é duvidoso se a maioria dos agricultores tem de fato, a percepção de valor que uma semente de categorias C1 e C2 possam ter um preço de compra mais alto. O mercado costuma não absorver isto de maneira geral.

   No prisma das misturas de sementes, que safra após safra vêm ganhando mercado, o consumidor começa a notar que em campo, o estabelecimento das plantas nem sempre condiz com os valores de proporção dos componentes determinados pelo teste de pureza impresso na etiqueta. 

   Fica patente que mesmo na produção e reembalagem de sementes S1 e S2 é necessário fazer a gestão dos processos e da qualidade durante todas as etapas. Mas como fazer isto de forma prática? O produtor de sementes ou reembalador necessita redigir os seus manuais de qualidade e de procedimentos operacionais.

  O manual de qualidade tem como objetivo caracterizar, implementar e documentar o sistema de gestão de qualidade em todos os processos, assegurando boas práticas para as etapas de produção, armazenamento, reembalagem e comercialização das sementes. Este manual, além de caracterizar a política de gestão da qualidade adotada pela empresa, define seus objetivos, o fluxo de documentos internos e externos, faz a atribuição da matriz de responsabilidades dos gestores, os registros e monitoramento de processos, ações corretivas e relacionamento com os clientes, dentre outros. Resumindo, é ferramenta imprescindível para o produtor ou reembalador de sementes garantir que a qualidade descrita no arcabouço legal seja colocada na prática.

   No seu turno, o manual de procedimentos operacionais traz como objetivos caracterizar, implementar e documentar todos os procedimentos que devem ser operacionalizados de forma padronizada. Desta maneira, pode-se dizer que mostra o caminho de como fazer para que a qualidade seja obtida. Com base na legislação, apresenta, para cada cultura a ser multiplicada ou reembalada, o fluxo dos processos, fazendo uma correlação com a exigência legal e atividade a ser de fato realizada no setor operacional. 

   Dentro deste manual, são descritos os POPs (procedimentos operacionais padronizados), que são amplos e visam a gestão do processo como um todo, afirmando o que é preciso fazer. Cada POP pode ter a necessidade de uma ou mais IT (instrução de trabalho), as quais são definições menos gerenciais e mais específicas, focando na aplicação das orientações. Essas instruções, por vezes, podem até estar previstas no POP, a fim de estabelecer um padrão técnico superior. A IT afirma como e quando fazer POPs e ITs; ambos têm a finalidade de gestão de processos para garantia da execução das tarefas com elevada qualidade e melhores resultados. Além disto, no manual de procedimentos operacionais, devem estar apresentados todos os formulários documentais com os quais o multiplicador ou reembalador deve se se comunicar ou atender às informações que devem ser enviadas ao MAPA.

   Estas duas importantíssimas ferramentas irão ajudar sobremaneira o responsável técnico e o gerente de qualidade para que não conformidades corriqueiramente apontadas por ocasião de visita de auditores fiscais sejam encontradas no processo produtivo ou de reembalagem.

   No mesmo sentido, irá garantir a fidelização do cliente, exigente consumidor de sementes. Toda vez que se reclama do crescente uso de sementes salvas, deve-se de forma interna na empresa haver o questionamento, de o que se está fazendo de diferente para conquistar esta importante fatia de mercado. Algo a ser pensado.
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