Mais de 70% das calorias dos alimentos vêm de culturas anuais de grãos, que ocupam 60-80% das terras agrícolas globais. Mas a dominância anual de grãos pode estar mudando. Um estudo da revista “Nature Sustainability” relata que um novo arroz perene de alto rendimento e longa vida com impactos significativos em sustentabilidade ambiental, econômica e social está sendo cultivado no Sudeste Asiático e em partes da África.

   Pesquisadores da província chinesa de Yunnan desenvolveram arroz perene em um período relativamente curto de duas décadas, alcançando rendimentos comparáveis ​​às variedades anuais de arroz. Eles foram apoiados com conhecimento científico e financiamento inicial da organização sem fins lucrativos “The Land Institute”, com sede no Kansas, e uma rede global de pesquisadores.

   “Parabenizo os autores por apresentarem um dos relatórios mais importantes da agricultura moderna”, diz Jerry Glover, explorador da “National Geographic Society”, cujo trabalho se concentrou no desenvolvimento e uso de culturas perenes. “Acredito que este relatório catalisará uma geração de novas descobertas de cientistas que ainda não estiveram envolvidos na busca de características perenes em culturas de grãos básicos. Esta pesquisa marca uma nova linha distinta de possibilidades para a produção global de alimentos a partir da dependência de quase 10.000 anos de cultivos anuais de grãos”.

   O arroz alimenta 4 bilhões de pessoas e é o grão mais consumido pelos humanos, e é a terceira maior cultura de grãos de cereais depois do milho e do trigo em todo o mundo em toneladas métricas. Mas a agricultura anual de grãos tem um custo ecológico e econômico, comprometendo os ecossistemas e forçando a entrada cada vez maior de fertilizantes químicos, pesticidas, energia de combustível fóssil e mão de obra para manter os rendimentos. O crescente movimento perene de agricultura de grãos está mudando esse paradigma para enfrentar alguns dos desafios mais prementes do sistema alimentar.

   “Como o arroz perene pode produzir rendimentos em oito colheitas consecutivas semelhantes ao arroz anual, isso é uma evidência direta de que o desenvolvimento de versões perenes de demais culturas de grãos, também é viável”, diz Lee DeHaan, Diretor de Melhoria de Culturas e Cientista Líder do Programa de Domesticação Kernza® no The Instituto Terra. “Esta evidência fornece uma razão clara para aumentar muito o investimento em pesquisa em trabalhos em andamento para desenvolver versões perenes de culturas como trigo e sorgo”.

   O autor sênior Fengyi Hu e Dayun Tao começaram a trabalhar com o coautor Erik Sacks para desenvolver o arroz perene em 1999 em uma colaboração entre a Academia de Ciências Agrícolas de Yunnan (YAAS) e o Instituto Internacional de Pesquisa do Arroz (IRRI). Ao tomar conhecimento do projeto IRRI, o “Land Institute” convidou Sacks para apresentar sua pesquisa em 2005. Essa conexão acabou levando Hu e a equipe do YAAS a fazerem parceria com os perenes especialistas em melhoramento de grãos do “Land Institute” em 2007 para ajudar a impulsionar o desenvolvimento de um amplo e promissor cruzamento híbrido entre arroz cultivado anual e um primo de arroz perene da África. Inspirado pelo potencial da pesquisa de Hu para desenvolver arroz perene de terra firme, dada a erosão catastrófica do solo nas regiões montanhosas do Sudeste Asiático, o “Land Institute” forneceu financiamento crítico, suporte técnico e orientação, ajudando a expandir uma rede global de pesquisadores pares. A Universidade de Illinois, a Universidade de Yunnan e a Universidade de Queensland logo se juntaram ao esforço.

   “O sucesso do grupo do Dr. Hu é um exemplo maravilhoso de como uma rede internacional de pesquisadores pode ajudar a apoiar, aconselhar e promover uma conquista incrível e importante”, diz o coautor Tim Crews, cientista-chefe e diretor do programa internacional do Land Institute. “No The Land Institute, pretendemos trabalhar com mais grupos de pesquisa em todo o mundo para aproveitar os sucessos de Hu e outros na perenização da agricultura de grãos.”

   “Quase anualmente desde 2009, realizamos workshops em Yunnan, China, sobre arroz perene e culturas de grãos perenes, convidando especialistas internacionais, incluindo produtores de arroz africanos e americanos, pesquisadores agrícolas sustentáveis, líderes internacionais de desenvolvimento agrícola e muito mais. Esse compartilhamento de ideias e a construção de uma rede internacional de colaboradores provou ser inestimável para acelerar o progresso e alcançar o sucesso em grãos perenes”, diz Sacks, professor do Departamento de Ciências Agrícolas, parte da Faculdade de Ciências Agrícolas, do Consumidor e Ambientais da Universidade de Illinois.

A pesquisa mostra que as culturas perenes de arroz têm vantagens sobre as culturas anuais de arroz:

- Produção de Vida Longa: O arroz perene produziu grãos por oito safras consecutivas ao longo de quatro anos a partir de um único plantio;

- Altos rendimentos comparáveis: Os rendimentos médios de arroz perene foram equivalentes ao arroz anual, com 6,8 Ton/ha de arroz perene versus 6,7 Ton/ha de arroz anual replantado para cada ciclo de rebrota de arroz perene;

- Sequestro significativo de carbono: Ao mudar de arroz anual para perene, os solos acumularam quase uma tonelada de carbono orgânico por hectare por ano;

- Economia de mão de obra e insumos: os agricultores usaram quase 60% menos mão de obra e gastaram quase 50% menos em sementes, fertilizantes e outros insumos para o arroz perene do que o arroz anual;

- Melhoria dos meios de subsistência dos agricultores: os lucros dos agricultores com o arroz perene variaram de 17% a 161% acima do arroz anual;

   “O interesse em desenvolver e testar cultivares de grãos perenes cresceu exponencialmente nos últimos dez anos”, diz Rachel Stroer, presidente do The Land Institute. “Além do arroz perene, nosso trabalho em amplos cruzamentos híbridos de trigo anual e sorgo com seus parentes perenes é promissor. Com o investimento intensificado em pesquisa perene de agricultura de grãos de financiadores e parceiros globais, estamos confiantes de que esses grãos e muito mais alcançarão altos rendimentos com benefícios ecológicos e sociais robustos e se moverão para a paisagem nas próximas décadas”.

   Um novo relatório da Nature Sustainability já destaca indicadores agronômicos, econômicos e ambientais do cultivo perene de arroz na província de Yunnan, na China. Este relatório também foi citado na revista Science, merecendo a distinção de ser publicado simultaneamente nestas revistas científicas.

   “Nossas descobertas mostram que o arroz perene oferece economia significativa de mão de obra e custos para os agricultores. Mas isso precisa ser feito corretamente – é por isso que enfatizamos a promoção da tecnologia perene do arroz – não apenas passando as sementes aos agricultores. Os agricultores precisam dominar novas técnicas de cultivo para manter altos rendimentos nas colheitas subsequentes”, diz o Dr. Shilai Zhang, professor da Escola de Agricultura da Universidade de Yunnan e primeiro autor deste relatório.

   Dr. Zhang compartilha que após cada colheita, é essencial regar e fertilizar o arroz perene. Isso ajuda a manter suas raízes, o que é vital, pois esta cultura depende de rizomas para se reproduzir. A equipe ensina aos agricultores técnicas de cultivo acumuladas ao longo de 13 anos de pesquisa.

   A equipe hibridizou o arroz anual com seu parente perene africano Oryza longistaminata por meio de sua pesquisa e iniciou experimentos de campo em larga escala em 2016 e lançou a primeira variedade comercial de arroz perene, PR23, em 2018. Do sequenciamento de próxima geração, 16% do PR23 genoma consiste em Oryza longistaminata.

   Os agricultores que cultivam arroz perene empregam quase 60% menos mão de obra e gastam quase metade em sementes, fertilizantes e outros insumos, enquanto desfrutam de rendimentos semelhantes ao arroz anual. É por isso que o cultivo perene de arroz atingiu 15.533 hectares em 2021, incluindo 44.752 pequenos agricultores.

   Dr. Zhang comenta que há muito a fazer, observando que as cepas de arroz perenes são sensíveis às condições climáticas locais - uma cepa pode crescer bem em Guangxi e Guizhou, que ficam perto de Yunnan, mas não crescem tão bem em outras províncias chinesas.

   Em abril deste ano, a Universidade de Yunnan e a BGI estabeleceram uma joint venture de arroz perene. “A localização em larga escala é o próximo passo para o arroz perene. Ao fazer parceria com a BGI, nossa equipe pode aproveitar o sequenciamento de alto rendimento para identificar linhas de arroz perenes mais rapidamente com as características agronômicas desejadas que se adaptem às condições climáticas locais. Além disso, a rede da BGI ajudará o arroz perene a se tornar global com o suporte certo”, disse o Dr. Zhang.

   O arroz perene foi promovido para muitos países, incluindo Uganda, Costa do Marfim, Laos, Mianmar e Bangladesh. Uganda é pioneira, iniciando testes de arroz perene há cinco anos. Trabalhando com parceiros locais, variedades específicas de arroz perene podem ser desenvolvidas pela Universidade de Yunnan e BGI para aumentar ainda mais a renda dos agricultores.

   O Dr. Zhang observa: “O gosto e a adaptabilidade ao clima local são os principais pedidos. Por exemplo, os consumidores de Mianmar preferem uma variedade mais macia de arroz. Em áreas onde a temperatura média é alta, eles procuram uma variedade resistente ao calor.”

   O Dr. Zhang observa que o Dr. Fengyi Hu, líder da equipe de pesquisa da universidade, previu corretamente que o PR107 se sairá muito bem na África devido às suas propriedades de resistência ao calor e à ferrugem. Estamos ansiosos para trabalhar com novos parceiros para promover o arroz perene em todo o mundo para aumentar a segurança alimentar global e a renda dos agricultores.”

*Esta matéria contém informações do Instituto LAND e da Universidade de Yunnan.