A dimensão da sanidade de sementes no brasil

Edição XXVI | 06 - Nov . 2022
Maria de Fátima Zorato-fatima@mfzorato.com.br
    Dentre as inquietações que surgem no nosso setor de produção de sementes, ocorrem situações submersas e que neste e nos próximos números vamos trazer à superfície, embasada em literaturas do assunto pertinente.

    A referência dos integrantes da produção, de maneira geral, quando se relacionam à qualidade de sementes, é o potencial fisiológico, que reúne informações sobre a germinação, a viabilidade e o vigor. É evidente a importância, se tratando do aspecto inicialmente mais visível, sem dúvida alguma, para o estabelecimento da lavoura. Inclusive justificam-se assim os inúmeros treinamentos técnicos realizados para as equipes de laboratórios de análise de sementes. Entretanto, devemos pensar um pouco: os conceitos nos mostram que a qualidade de semente é considerada a interação de um conjunto de atributos de natureza genética, física, fisiológica e sanitária. Teoricamente, esses atributos básicos da qualidade apresentam importância semelhante, mas isolados não são suficientes para identificar o nível de desempenho de um lote de sementes. 

    Por outro lado, num segundo plano, vem a preocupação com as características genéticas e físicas, mais pela percepção do cliente que faz reclamações. Mas e a sanidade? Por que está sendo deixada de lado, mesmo sendo verificadas conjunturas de estabelecimento de doenças nas diferentes fases das culturas?

    Um dos fatores que tende a explicar isso é sua complexidade e particularidade nas análises; para exemplificar o contexto, são os pouquíssimos laboratórios credenciados na área junto ao MAPA, num Brasil com dimensão tropical e subtropical. Por não ser uma tarefa simples, não há analistas treinados em tempo mais curto, como ocorre nos demais atributos; a análise de sanidade requer muito treinamento específico para se ter a devida e necessária segurança. 

    Um segundo fator, ao meu ver, é o volume expressivo de tratamento de sementes realizado, tanto na fazenda (on farm) quanto na indústria (TSI). Sendo assim, a sanidade deixa sua relevância porque é disfarçada. Porém, devem ser trazidas à luz da realidade as diversas formas de associação de patógenos com as sementes e que, às vezes, aquele tratamento utilizado não está sendo eficaz para algum tipo específico de patógeno. 

    Patologia ou sanidade de sementes significa o estudo de doenças das sementes, sob o ponto de vista etimológico ou origem. Num sentido mais amplo, pode ser interpretada como uma ciência que trata das implicações relativas à associação de patógenos com sementes, tendo como objetivo principal o controle de doenças vegetais, cujos agentes biológicos são propagados via sementes.

   A associação de patógenos com sementes é uma preocupação antiga sob o ponto de vista da fitopatologia. As sementes de modo geral podem abrigar e transportar microrganismos de todos os grupos taxonômicos. Esses agentes podem ser agrupados em organismos de campo, com predominância de espécies fitopatogênicas e organismos de armazenamento que deterioram sementes.

   Agentes fitopatogênicos, são capazes de se associar de forma sutil às sementes de seus hospedeiros, podendo, a partir de então, sobreviver por algum período, ser disseminados às diferentes regiões, por vezes, indene ao patógeno, e causar prejuízos significativos. 

   Os fungos englobam o maior número de espécies associadas às sementes. Dentre os fungos fitopatogênicos, a maioria pode ser transmitida pelas sementes de seus hospedeiros. Em sequência, há as bactérias com um número expressivo de representantes, os vírus em menor número e os diferentes tipos de nematóides, atualmente, aumentando nas áreas cultivadas. 

   Neste sentido, faz-se importante, em sanidade de sementes, o conhecimento prévio das formas de interação do inóculo de patógenos com as sementes, para a escolha de métodos de detecção destes agentes. 

   Existem três principais maneiras de patógenos serem transportados: (1) o microrganismo encontra-se misturado com as sementes. Fazem parte desta fração fragmentos vegetais, sementes de plantas invasoras e partículas de solo que podem, todos, ser portadores de micélio dormente, corpos frutíferos e esporos de fungos, cistos ou galhas de nematóides, células bacterianas e partículas de vírus, escleródios ou estromas fúngicos; (2) certos patógenos podem se associar e serem transportados pelas sementes por adesão passiva à superfície destas; (3) a forma de associação de microrganismos com sementes é a presença do inóculo nos tecidos das sementes, seja em estruturas superficiais ou mais interno no embrião. Essa é a forma de interação e transporte mais comum entre os agentes transmitidos por sementes. 

   Os patógenos quando ganham o interior das sementes podem sobreviver por tempo mais prolongado do que em outras partes da planta. Isso pode decorrer pelo fato da existência nas sementes de camadas protetoras e do acúmulo de reservas dos quais muitos microrganismos se beneficiam. Existe grande variação do período de longevidade em sementes, entre os patógenos.

    Em torno de 90% das culturas destinadas à produção de alimentos são sujeitas ao ataque de doenças, cuja maioria de seus agentes causais pode ser transmitida pelas sementes. As doenças nas diferentes culturas se constituem em um fator importante no agroecossistema, atingindo diretamente o homem ao reduzir a qualidade e a quantidade das sementes produzidas. Sendo produto da interação hospedeiro, patógeno e ambiente, as doenças variam na intensidade de acordo com alterações do patógeno, na resistência do hospedeiro ou na modificação do ambiente. 

    Os benefícios do tratamento químico são inúmeros, mas será que a maneira como estão sendo utilizados estão cobrindo todos os agentes biológicos que são transportados pelas sementes nas diferentes espécies de importância econômica do Brasil? Será que a análise de sanidade das sementes não é necessária para aplicar o produto correto e assim obter um controle mais efetivo? Assim sendo, tanto semente quanto tratamento químico poderiam atuar como os suas respectivas dimensões e abrangências.

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