Boas práticas agrícolas geram lucro adicional

Edição XXVI | 01 - Jan . 2022
Marcelo Benevenga Sarmento-marcelobs05@hotmail.com
     A agricultura brasileira é produtiva e sustentável, mas isso nós já sabemos. E que essa agricultura utiliza diversas práticas amigáveis com o ambiente também é conhecido por quem vive e trabalha no agro. A novidade, nem tão recente assim, é que essas boas práticas agrícolas, além de aumentar a produtividade e a renda, podem ainda gerar um ganho adicional ao produtor.

     O polêmico tema da monetização dos créditos ambientais tem sido debatido e regulamentado no país. A questão é complexa, pois o agronegócio compreende uma gama enorme de sistemas produtivos, criações, culturas e tipos de manejo, incluindo a agroindústria. Adicionalmente, a dificuldade em mensurar processos agrícolas sustentáveis e obter indicadores reproduzíveis em escala tem promovido calorosas discussões tanto em âmbito acadêmico como político-empresarial. Outro tema polêmico é se o “direito” ao pagamento seria somente por manejos realizados em áreas da propriedade além da obrigação legal constante no novo código florestal ou também nestas áreas? Ambientalistas defendem que a exigência legal se refere à proteção mínima da vegetação nativa e constitui-se numa obrigação do produtor, não estando, portanto, sujeita ao pagamento. Por sua vez, grupos de produtores alegam que a manutenção da reserva legal e das APPs (áreas de proteção permanente) tem custos elevados, devendo ser incluída nos créditos.

     A divergência de objetivos entre instituições, agências e empresas é outro entrave que atrasa a implementação de políticas públicas de incentivos ambientais via pagamentos.
Dentre os mecanismos financeiros de incentivos para conservação e restauração de áreas destacam-se o pagamento por serviços ambientais, títulos verdes (Green Bonds), créditos de carbono, Redd (Infográfico em anexo). Nesta coluna abordaremos o pagamento por serviços ambientais.

     Em 2019, o projeto de Lei nº 5.028, de 2019, instituiu a Política Nacional Brasileira do Pagamento por Serviços Ambientais. Serviços ambientais são benefícios como bens, produtos e serviços obtidos pelas populações humanas a partir dos ecossistemas. Os serviços podem ser classificados em: suporte, provisão, regulação e culturais. Dentre os principais exemplos estão a ciclagem de nutrientes, manutenção das águas superficiais e subterrâneas, qualidade do solo e do ar, polinização, conservação da vegetação nativa. Além desses, os serviços culturais estão ainda relacionados à beleza da paisagem, turismo, gastronomia, manutenção das populações tradicionais, arte, música e indumentárias típicas regionais, dentre muitos outros (Millennium Ecosystem Assessment-MEA, 2005). 

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     As alterações decorrentes das atividades humanas tendem a reduzir a oferta destes benefícios. Felizmente, as boas práticas agropecuárias podem atuar fortemente na manutenção ou até na recuperação destes serviços e o produtor ser recompensado financeiramente pelo manejo sustentável de suas propriedades. Assim, o projeto prevê distintas modalidades de pagamento pelos serviços prestados por pessoas físicas ou jurídicas como resultado de práticas que conservem o meio ambiente em todos os Biomas Brasileiros.


     "Nas últimas décadas tem aumentado o interesse e o número de programas de PSA. Os serviços ambientais com foco no agronegócio têm sido pauta destacada nos projetos das principais universidades e institutos de pesquisa pelo mundo. Estima-se mais de 550 programas ativos em nível global envolvendo US$ 36-42 bilhões em transações anuais"


     A verba destinada aos pagamentos pode ter origem em pessoas físicas ou jurídicas, empresas de cooperação internacional, bancos nacionais e internacionais, ONGs, fundos e investidores internacionais. 

     Nas últimas décadas tem aumentado o interesse e o número de programas de PSA. Os serviços ambientais com foco no agronegócio têm sido pauta destacada nos projetos das principais universidades e institutos de pesquisa pelo mundo. Estima-se mais de 550 programas ativos em nível global envolvendo US$ 36-42 bilhões em transações anuais (Salzman et al., 2018). A maior parte destes programas e transações ocorrem nos Estados Unidos e na União Europeia. No Brasil, os Biomas Mata Atlântica e Amazônia têm sido pioneiros na aprovação de projetos de pagamento pelos serviços ambientais, principalmente voltados à conservação das florestas e dos recursos hídricos. Na região de influência da serra da Mantiqueira, em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, há diversos municípios envolvidos na conservação de nascentes e mananciais e no plantio de árvores. O governo do Amazonas, por exemplo, tem canalizado mais de 29 milhões de reais do Fundo Amazônia para remunerar famílias moradoras e usuárias da floresta. Outros projetos estão sendo conduzidos nos demais Biomas. Embora o foco inicial do PSA sejam as áreas protegidas e degradadas, os ecossistemas agro, desde que bem manejados, também podem ser contemplados pelo programa. 


     Muito além da questão financeira, a obtenção de créditos ambientais é o reflexo de uma agricultura brasileira cada vez mais sustentável, com inúmeros exemplos de sucesso. Produtos aqui produzidos chegam a todos os continentes com qualidade cada vez melhor. Tecnologias de manejo e processos de gestão têm contribuído para melhorias nas propriedades rurais em todos os biomas, com reflexos na produção, renda e geração de emprego. Com o novo arcabouço legal para comercialização dos créditos ambientais sendo debatido e regulamentado, descortinam-se novas oportunidades para o setor. 
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