Metodologias, resultados e tabelas de tolerância estão interligados?

Edição XXVI | 01 - Jan . 2022
Maria de Fátima Zorato-fatima@mfzorato.com.br
     A construção do pensamento que faz parte da trajetória da ciência nos remete a compreender o conhecimento atingido a partir de processos científicos. Trata-se de conhecimento sistemático e organizado, produzido desde procedimentos específicos, objetivos e impessoais.

     Mas então, por que ainda nos deparamos com alguns preferindo optar ao senso comum, dependente mais de juízo de valores e disposições pessoais? Por desconhecimento ou imaginar que se aplica apenas aos trabalhos acadêmicos científicos? Mas, temos que lembrar que exatamente esses trabalhos originaram os métodos aplicados no dia a dia em laboratórios. Foram exaustivamente testados, observados e referenciados. Ou seja, garantidores de maior segurança em suas aplicabilidades. Porque é tão importante este conhecimento dentro de laboratório de sementes, seja credenciado junto ao Ministério da Agricultura Pecuária e do Abastecimento (MAPA) ou não?

     Todas as análises realizadas são embasadas em conjunto de passos que devem ser seguidos para atingir os objetivos de cada teste, que tem princípio e objetivo distinto. 

     As literaturas de cunho científico e as regras são claras. Trazem em seus bojos todos os procedimentos metodológicos específicos inerentes às diferentes espécies e reforçam esta natureza.

     Atualmente, na produção de sementes brasileira, num dos testes de vigor mais utilizado, o envelhecimento acelerado, em seu procedimento constam determinadas situações que precisam ser respeitadas para atingir resultados factíveis e reproduzíveis. Por que se desconsideram algumas recomendações? Alguns exemplos dentro de muitos desprezados: variação de temperatura acima das prescrições; abertura de câmaras durante a condução do teste; câmaras nada padronizadas; problemas com o tempo de instalação do teste após estresse das sementes e também com o tempo para efetuar a leitura do teste; diferentes maneiras para os que executam o tratamento das sementes (alguns usam antes, outros após o estresse ou, ainda, outros optam por tratamento do papel), enfim, circunstâncias favorecedoras de dados desconexos. 
No Brasil, quando se trata de vigor de sementes, nenhum teste é oficial. No caso do teste de envelhecimento acelerado, nem ao menos está descrito nas Regras para Análise de Sementes (RAS), uma referência de laboratórios, residindo, talvez neste fato, o perigo. 

     Ainda existem outros testes que envolvem subjetividades. Nesses casos, quem ajuda a minimizar as diferenças são os treinamentos constantes e a maturidade das equipes. Embora, se houver falhas em procedimentos metodológicos também não se chega ao posicionamento ideal.

     “Bem, se dentro daquilo que realizamos não seguimos rigorosamente as determinações de amostragens e de testes, temos que refletir que a representatividade de sementes que operamos, sobretudo em alguns testes, é muito baixa. O risco se torna eminente. O prejuízo pode ser forte em vários sentidos, seja financeiro, volume, marca, etc.”

    Estamos abordando, neste caso, sobre os resultados. Quando não obedecidas as amostragens corretas e aplicações de procedimentos laboratoriais dentro do estabelecido, podem não representar a realidade, sejam eles maiores ou menores. As desavenças são enormes dentro do próprio laboratório ou entre laboratórios. São muitas variáveis trabalhadas, isto é, possui conteúdos inconstantes, em outras palavras elas variam. Neste contexto, algumas limitações de quem está coletando os dados têm potencial de induzir a interpretações errôneas ou mesmo corre o risco de não possuir a habilidade de transformar a informação em conhecimento através da interpretação correta. Deixa por conta de um sistema informatizado que apenas geram dados. Ou ainda, na pior das hipóteses, pode nem haver interpretações, apenas repetições e repetições. Sendo assim, ficam com um bando de dados dificílimos de ser resumidos e não um banco de dados possível de observações e análises interpretativas.  

     Por outro lado, para que existem as tabelas de tolerâncias? O nome por si só já diz algo interessante e que jamais devemos menosprezar. Tolerância é a variação do resultado máximo e o resultado mínimo. Sua obtenção é calculando a diferença entre um e outro resultado. Tudo bem explicado com exemplos nas RAS. Por que não utilizar uma ferramenta a nosso favor? Por que aceitar repetir os testes quando a própria qualidade e os dados são autoexplicativos? Deve sim repetir, em determinadas condições, após ter explorados todas as alternativas admissíveis do universo das análises e esclarecimento de seus resultados. Porém, quando se aceita a repetição sem estas premissas, está se admitindo a insegurança, geradora de desconfiança no processo como um todo. Além disso, é um fator totalmente desmotivador. 

     Precisamos cuidar de cristalização de soluções que foram úteis ou geraram sucesso em uma determinada época, mas são inadequadas ao momento atual em que as sementes estão mais tecnológicas, exigindo realmente as aplicações de metodologias da ciência para a conquista de sucesso na atividade. 
Devemos lembrar de Poincaré: “assim como casas são feitas de pedras, a ciência é feita de fatos. Mas, uma pilha de pedras não é uma casa e uma coleção de fatos não é, necessariamente, ciência”. 
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