Um olhar atento à semente de soja esverdeada

Edição XXV | 04 - Jul . 2021
Maria de Fátima Zorato-fatima@mfzorato.com.br
    “Todo ponto de vista é a vista de um ponto. Para entender como alguém lê, é necessário saber como são seus olhos e qual sua visão de mundo” (L. Boff).

    Podemos alterar no caso da abordagem de sementes esverdeadas, e dizer que é necessário saber qual o conhecimento técnico e visão do mundo da semente quando se trata de assunto que envolve complexidade maior e tem sido tema ressonante na produção de sementes.

    Há boas razões para sermos cautelosos ao nos referirmos às sementes de soja que não degradam completamente os pigmentos verdes. É no mínimo arriscado presumir que o potencial fisiológico de hoje seja o mesmo esperado no momento de semeadura. Porque sementes com cotilédones esverdeados têm implicações profundas em questões essenciais como no pós-colheita, nos diferentes tipos de armazenagens (tanto interno quanto externo), no tratamento químico, nas interpretações de respostas dos distintos testes de verificação da qualidade da semente, no momento de semear devido aos tratos culturais, enfim, não se deve vilipendiar com este fato.

    É inegável, em todas as pesquisas relacionadas, a conclusão de declínio no vigor, na viabilidade/germinação, na emergência de plântulas, na condutividade elétrica, no comprimento de plântulas, na massa seca das sementes, entre outros testes que são realizados.

    Recordando Popinigis, “nenhum fator do metabolismo, de forma isolada, pode ser indicado como responsável pela deterioração da semente”. Assim sendo, cabe com o resíduo de clorofila muitos entendimentos, porque a máxima citada tem sua razão, especialmente conhecedores de que a deterioração é inexorável. Quantas influências que reverberam nas diferentes fases da cultura, sobretudo no final de maturação, que necessita a sincronia perfeita para a degradação ocorrer. O quanto as sementes esverdeadas podem ser diferentes umas das outras! 

    Sempre tem a pergunta por que esverdeou? E relatos, as vezes tendenciosos, afirmam tudo correu bem. Quando? Da implantação da lavoura até a época de colheita? O que é este “bem”? O que pode significar? O que generalizações podem trazer de conclusões? Quais os fatores que regulam a maturação ordenada dos cotilédones?

    O caminho é vasto, até então existe muito para ser esmiuçado. Porém, para simplificar o que diz respeito à qualidade fisiológica, vamos elencar alguns motivos da retenção de pigmentos verdes nas sementes.

    A soja apresenta exigências bioclimática, térmica, hídrica e de fotoperíodo. Em condições climáticas desfavoráveis pode ocorrer a presença de sementes verdes/esverdeadas. 
A temperatura e a umidade relativa do ar são fatores influenciadores no processo de maturação, época em que as clorofilas são degradadas. O estresse hídrico durante a formação da semente acelera a senescência de folhas e encurta o período de maturação em semente de soja. Altas temperaturas do ar podem, indiretamente, induzir um déficit hídrico na planta e, caso isso aconteça durante a fase de deposição de reservas, essa pode paralisar e provocar dessecação antecipada, o início da maturidade, prejudicando o período de degradação da clorofila. Estudos indicaram a degradação da clorofila ser altamente dependente da temperatura do ar de secagem. A intensidade da ocorrência de sementes com retenção de clorofila num lote mostrou ser variável em função do tipo de estresse, que pode ser alterações tanto em temperatura quanto de umidade na fase final de maturação.  
O comportamento das diversas cultivares indica variabilidade genética para a degradação da clorofila sob condições de estresse no campo.
    Também foi postulado que situações de estresse por altas temperaturas e seca (veranico), insetos, doenças, podem ocasionar a formação de grãos de soja pequenos, enrugados, descoloridos e imaturos de coloração esverdeada. São condições tidas como bloqueadoras da degradação natural da clorofila. O desfolhamento e os danos à vagem causados pelos insetos, em especial os percevejos, podem causar problemas na maturação e, como consequência, ocorrer aumento de sementes e grãos verdes numa safra. Além disso, é citada entre os fatores que propiciam sementes esverdeadas, a escolha inadequada do ponto de dessecação em pré-colheita. 

    O resultado na qualidade do lote que apresenta indivíduo com retenção de clorofila, principalmente com tonalidade e saturação maior e de fácil constatação, é desastroso. Em outras palavras, sua longevidade é comprometida. Como existe variação bastante expressiva com este tipo de semente, sugere-se no método visual, para detectar as sementes verdes e esverdeadas, realizar o teste com o maior número de repetições visando diluir erro das amostragens e que podem potencializar os prejuízos na média quantitativa final. É imprescindível observar a semente como um todo para localizar as células verdes externa e/ou internamente. Quanto mais assertivos mais segurança.

    A clorofila pode reagir com compostos intermediários de peroxidação de lipídios e o efeito primário dessa peroxidação em tecidos pode ser a diminuição da competência respiratória, assim como, o declínio geral da integridade de membranas. A deterioração de semente tem como causa primordial a degradação das membranas celulares. 
Portanto, uma vez que em todos os estudos é demonstrada a ligação de células verdes com a qualidade fisiológica da semente, um olhar atento à semente esverdeada é fundamental e, em grande medida, um dilema a ser enfrentado e entendido para minimizar prejuízos ao todo, quer seja para o produtor de sementes, quer seja para o usuário, seu cliente. 
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