O papel das mutações no melhoramento de plantas

Edição XXV | 04 - Jul . 2021
Alexandre Nepomuceno-alexandre.nepomuceno@embrapa.br
    Após a pandemia de COVID-19, alguns conceitos que antes eram pouco conhecidos pela população em geral passaram a ser frequentemente mencionados na imprensa. É o caso das mutações, termo que vem se repetindo nas notícias sobre as novas variantes do coronavírus. Até recentemente, as mutações eram associadas aos filmes de ficção científica e as histórias em quadrinho. 

    Mas o que é uma mutação? Sabemos que o DNA é a molécula responsável pelas características herdadas geneticamente. Constituído pelas bases nitrogenadas, representadas pelas letras A, T, G e C, o DNA contém a “receita” para coordenar todas as características dos seres vivos. Qualquer alteração nessas bases nitrogenadas pode levar a uma mudança no produto dessa receita. A mutação nada mais é do que uma alteração no DNA, podendo assim, promover mudanças em uma característica.

    As mutações ocorrem de forma natural e em todas as espécies. Estão presentes inclusive em humanos, sendo responsáveis por mudanças físicas, como cabelos ruivos e olhos azuis, ou até mesmo pela resistência a doenças, como o caso dos indivíduos resistentes ao vírus do HIV. Em algumas situações as mutações podem levar a uma característica indesejável, mas o fato é que esse fenômeno tem papel essencial na evolução dos organismos vivos e traz muitas contribuições importantes. O melhoramento genético de plantas se beneficia das mutações para gerar plantas com características de interesse. Assim, não é raro nos depararmos com uma planta mutante.

    Na natureza, o surgimento de novas mutações ocorre de maneira lenta, podendo levar várias gerações para o seu aparecimento. Na medida em que os conhecimentos na área da genética e biologia molecular evoluíram, novas ferramentas se tornaram disponíveis para acelerar esse processo, facilitando o desenvolvimento de novas variedades. Há décadas os melhoristas têm utilizado técnicas para gerar mutações através da exposição de sementes à agentes mutagênicos (radiação ou agentes químicos). Essas alterações no DNA podem ser repassadas para os descendentes, gerando plantas com novas características. São exemplos de mutantes a melancia sem sementes, o tomate longa-vida e o arroz resistente aos herbicidas do grupo das imidazolinonas, tecnologia que auxilia no controle do arroz vermelho.

" a legislação de biossegurança no Brasil considera que variedades mutantes, sejam elas geradas através de agentes mutagênicos ou por meio de edição gênica, não devem ser consideradas como organismos geneticamente modificados (OGMs), uma vez que não envolvem a introdução de sequências de DNA de outras espécies"

    Apesar de ser uma ferramenta útil, a indução de mutações por radiação ou agentes químicos é uma tarefa árdua, pois origina modificações aleatórias no genoma, tornando necessárias várias etapas de seleção e fenotipagem até se obter o fenótipo esperado. Nas últimas décadas muitos avanços na ciência contribuíram para que a geração de mutações pudesse ser realizada de forma mais precisa e com maior eficiência. As tecnologias para sequenciar genomas são fundamentais para identificar as regiões que serão alvo das mutações. Associado a isso, o surgimento das ferramentas de edição gênica, como CRISPR por exemplo, permitem gerar alterações no genoma de maneira muito específica, superando as limitações das técnicas anteriormente utilizadas e acelerando o desenvolvimento de novas variedades. 

    Uma vez que as mutações podem ocorrer de forma espontânea na natureza, a legislação de biossegurança no Brasil considera que variedades mutantes, sejam elas geradas através de agentes mutagênicos ou por meio de edição gênica, não devem ser consideradas como organismos geneticamente modificados (OGMs), uma vez que não envolvem a introdução de sequências de DNA de outras espécies. Isso reduz consideravelmente o custo e o tempo para geração dessas tecnologias em comparação aos transgênicos. 
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