O agro precisa dialogar com a sociedade

Edição XXV | 01 - Jan . 2021
Marcelo Benevenga Sarmento-marcelobs05@hotmail.com
    Já dizia Abelardo Barbosa (apresentador Chacrinha) “quem não se comunica se trumbica”. A comunicação é inerente a todos os seres vivos, desde a comunicação molecular usada pelas mais simples bactérias até chegarmos às redes sociais e aplicativos usados atualmente por nós, seres humanos. 

    O agronegócio, principal atividade econômica do Brasil, responsável por mais de 40% das exportações, 25% do PIB e geração de 30 milhões de empregos, tem sérios problemas de fala, escuta e escrita. Não possui uma boa comunicação intrasetorial e intersetorial com a sociedade. O problema é grave, pois a imagem que a população brasileira tem do setor é, na maioria das vezes, equivocada. Com raríssimas e louváveis exceções, quem faz esse meio campo entre o agro e a sociedade são profissionais de áreas alheias ao agro que não conhecem a nossa realidade, ou quando a conhecem, a distorcem. Essa é uma das causas do problema. Alguém esperaria, por exemplo, um engenheiro falando sobre medicina ou um médico falando com propriedade sobre um tema do direito? Absurdo não é mesmo? É o que acontece diariamente no agro. 

    Há uma verdadeira avalanche de noticias negativas veiculada pelas mídias, em especial na internet, denegrindo sem chance de defesa o setor mais relevante para o país, e que cumpre papel chave no fornecimento de produtos para o mundo. 

    Uso de agroquímicos, leite adulterado, contaminações com microorganismos, impacto aos recursos naturais, desmatamento, emissão de gases de efeito estufa, trabalho escravo, pirataria, deriva de herbicidas, maus tratos em animais, transgênicos, dentre muitos outros, são apenas alguns dos temas tratados de forma sensacionalista, mais significativamente na última década. Vejam bem, não estou aqui afirmando que não há problemas. Sim, eles existem, mas as coisas devem ser pautadas de forma técnica e não sensacionalista como tem sido corriqueiro.

   Há exemplos de excelentes comunicadores do setor, como o José Luiz Tejon, Xico Graziano e Camila Telles, só pra citar alguns que eu sigo nas redes sociais com certa frequência. O agrônomo e professor Xico Graziano tem se empenhado em divulgar vídeos esclarecendo temas polêmicos do agro. Recomendo o Livro Agricultura fatos e mitos: fundamentos para um debate racional sobre o agro brasileiro, de sua autoria, juntamente com Décio Luiz Gazzoni e Maria Thereza Pedroso. Excelente livro que traz cultura agronômica aos profissionais da área bem como de outras áreas e da sociedade em geral. 

   Xico, nas suas abordagens, costuma elencar alguns fatores que provavelmente originaram a imagem ruim do agronegócio Brasileiro perante a sociedade: 
    Literatura histórica baseada na visão do rural associada ao cangaceiro e coronéis;
    Filmes populares como, por exemplo, o do Mazzaropi, retratando o personagem Jeca Tatu, gravaram uma imagem e estereótipo do caipira maltrapilho, burro e atrasado;
    Promoção de uma dicotomia de agricultura empresarial versus agricultura familiar;
    As lideranças representativas do setor ficaram muito atrasadas, com visões ultrapassadas;
    Livros didáticos de escolas primárias, muitas vezes acabam denegrindo a imagem da agricultura e do agronegócio; 
    Passividade e/ou inabilidade dos próprios atores do agro em reverter a imagem negativa.

    Apesar destes aspectos negativos temos um saldo pra lá de positivo para comemorar. Nas diferentes cadeias produtivas há uma gama enorme de belos exemplos de produtores que produzem bem e conservam o meio ambiente. Cultivos perenes como videira, oliveira, frutas cítricas apresentam-se como boas opções para diversificar a matriz produtiva em várias regiões. As cadeias de hortifrutigranjeiros vêm dando show de qualidade e oferta de produtos saudáveis e nutritivos. Os sistemas integrados lavoura, pecuária e floresta vêm crescendo e também mostrando que aliar produção e rentabilidade com conservação ambiental é plenamente possível. A pauta do bem estar animal vem sendo incluída desde o manejo nas propriedades rurais bem como nos protocolos dos frigoríficos e expo-feiras. Produzimos uma diversidade de produtos, exportamos e ainda preservamos 66.7% do nosso território. Essa proeza, caros leitores, só o Brasil consegue. Como fator adicional possuímos uma matriz energética pautada em 45% de energia renovável. Parece que, apesar da torcida contra, temos motivos de sobra para nos orgulharmos do agronegócio e mostrarmos o que fazemos de positivo para o mundo. Chega de notícias negativas sobre o agronegócio brasileiro.

"Produzimos uma diversidade de produtos, exportamos e ainda preservamos 66.7% do nosso território. Como fator adicional temos uma matriz energética pautada em 45% de energia renovável. Se tudo isso não é motivo para nos orgulharmos e promovermos, é no mínimo para refletirmos."

    No mundo há uma gama de exemplos interessantes de como a população e a sociedade civil encaram o setor de alimentos. Em grandes redes varejistas de países como França, Reino Unido e Espanha, é comum a exibição de cartazes destacando produtos regionais, artesanais, caseiros, oriundos da agricultura familiar, com destaque para os sistemas produtivos locais. E a população literalmente compra a ideia. Nos EUA e Canadá, é grande a informação sobre carne, leite e derivados, hortaliças e frutas oriundas de fazendas locais. As gôndolas desses mercados trazem conteúdo informativo sobre os produtos, desde a origem destacando os atributos que beneficiam o consumidor como qualidade, segurança alimentar, sustentabilidade, bem estar animal e nutrição. Isso valoriza a produção regional, gerando mais emprego e renda, além de incentivar alimentos oriundos de cadeias curtas de produção, com inúmeros benefícios para a economia de cada região.  
    O agronegócio Brasileiro é competente, diversificado e sustentável, mas tem um problema grave de comunicação interna e externa que acaba prejudicando o setor. Não adianta ter excelentes produtos sem que o consumidor perceba e compre a ideia. Ações de marketing estratégico envolvendo produtores, instituições públicas e privadas são necessárias e bem vindas.  
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