TRIGO uma cadeia deliciosa

Edição II | 01 - Jan . 1998
Equipe SEEDnews-seednews@seednews.inf.br

    Em 1534, juntamente com Martin Afonso de Souza, o trigo chegou ao Brasil. Desde lá, muitas mudanças ocorreram. Locomotivas, carros, aviões, televisão. Com trigo não foi diferente. Ele passou por diversos estágios de cultivo, desde a pouca importância, restrito à pequenas áreas, até desbancar finalmente o milho como principal cereal na produção de pães, bolos e biscoitos. Em 4 menor escala, 4 até na ração animal ele participa. 
    Hoje, ele é o segundo cereal mais cultivado no mundo, superado apenaspelo arroz. Isso provavelmente seja devido ao alto teor de glúten, proteína que fornece a elasticidade necessária a uma boa panificação. Existem muitos tipos de grãos de trigo, todavia os mais conhecido se utilizados são o tenro, utilizado em pães, pizzas e biscoitos e o “durum”, preferido para fazer nassas especiais, do tipo italiano. 
    Num grão de trigo, encontramos de 80 a 85% de endosperma, 13 a 17% de casca ou farelo e 2 a 3% de germe. O endosperma é moído para a produção de farinha. Já o farelo, aproximadamente 25% do total do trigo moído, é usado na composição de ração para animais. 
    Estado- Entre 1944 e 1990 todo o setor detrigo foi controlado pelo Estado. Tal controle atingia praticamente todas as partes da cadeia, chegando ao cúmulo de criar, em 1967, um sistema de distribuição semelhante ao da antiga União Soviética, onde tudo era planejado pelo Estado. Assim, semanalmente o Banco do Brasil fazia um levantamento das necessidades do país, abrangendo grão se farinha, e distribuía quotas aos moinhos e  indústrias. Ninguém poderia sair desse ciclo. 
    Na década de 70, uma quebra na safra da União Soviética fez com que o preço do cereal no mercado mundial aumentasse. O governo brasileiro, possivelmente preocupado com um aumento na inflação, implantou também no trigo a cultura do subsídio. Dessa forma,até 1987, época do chamado Plano Bresser, o Tesouro pagava parte da conta da produção e distribuição de trigo. Uma vez que o subsídio acabou, houve uma elevação de 500% no preço da farinha. Não preparado para enfrentar reveses, o produtor de trigo diminuiu a área cultivada. 
    Em 1990, sob o comando do então presidente Fernando Collor, começou a abertura econômica brasileira. Os produtores e distribuidores de trigo, antes protegidos e sufocados pelo governo, tiveram de enfrentar a concorrência externa, com seus produtos por vezes superiores e preço mais baixo. 
    Aliás, como informa Paulo Furquim de Azevedo, “com o fim da regulamentação, a substituição do trigo nacional pelo importado  foi acelerada, atingindo uma média nos últimos anos de dois terços do consumo nacional. Como consequência, ao se analisar a à competividade revelada, há sinais evidentes de deficiência competitiva do trigo nacional frente ao importado”. 
 

    "A eliminação do subsídio fez multiplicar o preço do trigo" 
 
 
    Ainda se luta contra a atrofia provocada por décadas. A produção nacional, notoriamente insuficiente, espera por melhores técnicas, sementes e menos impostos para entrar na ferrovia da competitividade. 
    Moinhos - Antes de chegar ao consumidor final, o trigo passa por moinhos. Estes, transformam o grão em farelo para os animais e farinha, a ser utilizada para produzir outros produtos, em escala comercial, ou pelas donas de casa. Como informa Benami Bacaltchuk, da Embrapa, existem aproximadamente 213 moinhos no pais, distribuídos da seguinte forma: 47 no Paraná; 72 no Rio Grande do Sul; 35 em Santa Catarina; 20 em São Paulo; seis em Minas Gerais; seis no Rio de Janeiro; quatro no Mato Grosso do Sul; três no Ceará; três na Bahia; dois em Alagoas; dois no Pará e um no Amazonas. 
    Pode-se distinguir os moinhos em dois tipos. O primeiro, composto pelos que usam equipamento antigo, que devido ao custo de remodelagem, tem capacidade limitada de processamento. O segundo, o dos grandes, procura cada vez mais a segmentação do mercado, através de composições especiais de farinha, com diferentes blends. 
    Com o aumento da competição e decorrente possibilidade do mercado escolher seus fornecedores dentre um número cada vez maior, criaram-se novas exigências para essas empresas. Dentre estas, recebem especial destaque a capacidade de distribuição e a sofisticação da farinha. Atualmente o consumidor prefere receber a farinha já misturada e, pelo menos, três tipos são considerados essenciais em todos os pontos: a farinha comum, a especial e a farinha para macarrão. Com alguns moinhos, a concorrência internacional tem sido implacável. Muitas são as indústrias de panificação que costumam dar preferência ao produto argentino, em detrimento do brasileiro. Alegam esses consumidores ser a farinha brasileira melhor para biscoitos, enquanto a argentina, mais forte, produz pães melhores. 
    Mercado - o mercado de produtos derivados de trigo, de uma forma geral, aumentou. Uma das explicações é a
 praticidade desses alimentos. Ao contrário de outros que obrigatoriamente precisam de preparo especial, pães, massas e biscoitos já estão prontos, ou requerem muito pouco tempo para tal. Por estranho que pareça, o Brasil é um dos países onde menos se consome pão per capita. São apenas 27 kg/ano, contra 160 kg/ano na França. Informa Paulo Azevedo, em trabalho realizado para o Programa de Estudos dos Negócios do Sistema Agroindustrial- PENSA. Difícil todavia explicar o porquê disso. Talvez seja cultural. 
    As empresas que trabalham com panificação podem ser divididas em dois grupos: o dos grandes fabricantes e o das padarias convencionais. Juntas, elas respondem por 60% do consumo de farinha de trigo. Os primeiros normalmente atingem grandes fatias do mercado, com produtos de marcas conceituadas e maior prazo de validade. Para tal, direcionam parte do orçamento na pesquisa e aprimoramento de produtos, onde se destacam as mudanças de blends. Já as padarias convencionais dificilmente apresentam tais preocupações. 


    "Até 1990 o trigo era controlado pelo Estado" 
 
 
    Normalmente fabricam um número limitado de produtos, com larga saída, considerando a limitação do seu mercado. Por isso, pouco se nota uma preocupação com a fixação de marcas e mudança nos produtos. 
    Outra parte importante do mercado de farinha de trigo é o setor de biscoitos. Nos últimos anos, o consumo brasileiro de biscoito cresceu muito, e apresenta-se como uma grande alternativa. De acordo com a Associação Nacional de Indústrias de Biscoito, desde o Plano Real o consumo desse produto aumentou de 3,5kg para 6kg per capita. Entretanto, boa parte desse crescimento favoreceu empresas de outros países, que muito exportaram para cá. Estima-se que nessa situação, a indústria nacional alcançou um crescimento de 35% no setor. 
    Cada vez com menos tempo e mais dinheiro, o consumidor acaba optando por alimentos fáceis e gostosos. Daí a procura por biscoitos. Também é importante salientar que o biscoito admite muitas combinações de sabores, sendo um produto no qual a novidade conta bastante. Os novos sabores, formas e até cores, atraem a atenção desse público. 
    Por semelhante modo influenciado pela procura de praticidade por parte do consumidor, o mercado de massas está se remodelando. O avanço básico nesse sentido é o aumento da produção de massas com ovos, macarrão instantâneo ou macarrão de grão duro. Esse fato concorda com a tendência mundial de aumento na qualidade e praticidade. 
    Para o Produtor - O trigo é uma das principais alternativas para o plantio de inverno, como lembra Benami Bacaltchuk. Este também destaca queo trigo propicia cobertura de solo durante o inverno, com reflexos no controle à erosão
 superficial. Também o sistema de Plantio Direto é favorecido. Ainda segundo Benami, além do efeito direto na renda dosetor agrícola que a lavoura de trigo confere. Estima-se em 20% a redução dos custos nas lavouras de verão precedidas pelo trigo. Assim, mesmo quandoo trigo não traz lucro direto, beneficia significativamente a sustentabilidade do processo produtivo nas regiões onde está inserido. 

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