O balanço do carbono e o papel do agro

Edição XXV | 05 - Set . 2021
Marcelo Benevenga Sarmento-marcelobs05@hotmail.com
    As mudanças climáticas estão dentre as principais pautas do agronegócio em nível global. É fato que o clima vem passando por significativas mudanças com reflexos na vida em sociedade.

    Alterações nos padrões globais do clima terrestre podem ocorrer pela maior ou menor atividade solar, mudanças nos padrões das nuvens, alteração no eixo da terra, atividade vulcânica, e ainda devido a fatores antrópicos. O quanto cada um dos fatores acima interfere no clima ainda é motivo de acirrado debate e pesquisas mostram que diferentes partes podem estar com a razão. É nesse contexto desafiador que se insere a agricultura e o polêmico tema carbono.

    Os principais gases de efeito estufa, reconhecidos pelo Protocolo de Kyoto são: metano (CH4), óxido nitroso (N2O), monóxido de carbono (CO) e dióxido de carbono (CO2). Esses gases, em maior ou menor grau, absorvem a radiação infravermelha quando esta retorna da superfície terrestre para o espaço, retendo assim o calor decorrente dessa radiação na atmosfera, daí o nome “efeito estufa” ou “greenhouse”, do inglês. Atividades humanas, assim como processos naturais das plantas, animais, solo, oceanos ou planícies, também emitem gases para a atmosfera. Não há emissão zero. De algum modo a atividade irá emitir gases poluentes. Da produção orgânica de hortaliças aos cultivos anuais de grãos, não há mocinhos neste jogo. No entanto, o ponto chave é a forma de produzir eficientemente, compensando essas emissões. Atualmente há uma gama enorme de pesquisas nessa linha, mostrando diversas tecnologias que auxiliam a uma produção rentável, mas que também possam sequestrar carbono e promover a manutenção ou até, em alguns casos, a recuperação do solo, da água e do ar.
 
    No mundo, a agricultura é responsável por 18,4% das emissões, enquanto no Brasil, 47,92%, conforme dados do “Our World in Data”. Porém, é importante ressaltar que o Brasil foi responsável por apenas 3,2% dos gases emitidos no mundo em 2019, enquanto China, EUA e União Europeia contribuíram com 23,7%, 12,9% e 7,4% do total, respectivamente. Segundo a National Geographic, “na China, nos EUA, na Índia e na Rússia, pelo menos dois terços das emissões vêm da queima de combustíveis fósseis, principalmente para geração de energia, transportes e indústria. No Brasil, é o inverso. Quase metade das nossas emissões vêm do uso da terra.”

    A eficiência na produção agrícola leva a uma baixa emissão de gases estufa e isso pode ser feito em várias etapas do processo produtivo. Do planejamento da lavoura ao pós-colheita há muitas escolhas que podemos fazer para reduzir a emissão de gases.
 
    A opção por uma cultivar e por uma semente de qualidade constituem-se no ponto de partida.

    Uma cultivar adaptada às condições edafoclimáticas de uma região será mais eficiente na alocação de recursos do meio, demandando menos defensivos e produzindo mais. Sementes mais vigorosas têm maior capacidade de enfrentar as condições impostas pelo meio, estabelecendo-se mais rápido e gerando maior cobertura do solo, plantas mais sadias e mais produtivas.  Por sua vez, sementes de baixa qualidade podem carregar patógenos, infestando novas áreas, o que irá demandar mais produtos químicos, gerando maior emissão, tanto na fabricação destes produtos quanto na sua aplicação na lavoura (ex. máquinas, combustível etc.).
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    Dentre os gases estufa, o CO2 é um dos que mais contribui para as mudanças climáticas em nível global. O carbono pode ocorrer nas formas mineral ou orgânica, estando presente no solo, nas rochas, minério, combustíveis fósseis, biomassa vegetal ou no ar. Os solos agrícolas, de um modo geral, podem atuar como fonte ou como sumidouro de gases. O estoque de carbono do solo é composto por matéria orgânica, decomposição e mineralização, respiração de raízes e respiração da fauna do solo. Para nós, profissionais de agrárias, o foco deve ser o carbono no solo e na biomassa vegetal.

    A semeadura direta na palha (plantio direto), uma prática exclusivamente desenvolvida por cientistas brasileiros para nossa própria realidade, é comprovadamente uma tecnologia que pode reduzir as emissões. Notem que eu menciono “pode”, pois nenhuma prática isolada é efetiva. Neste caso, o plantio direto deve vir associado ao uso de sementes de qualidade superior, à rotação/sucessão de culturas, manejo equilibrado da fertilidade do solo, boa cobertura de palhada, pastagens em sistema integrado, uso de leguminosas, dentre muitas outras práticas. Diversos estudos têm apontado o benefício destas práticas na sustentabilidade dos sistemas. 

    A influência dos diferentes sistemas produtivos e respectivas técnicas possuem um papel relevante tanto na emissão como no sequestro dos gases de efeito estufa. Vários trabalhos já demonstraram que o preparo convencional, práticas de irrigação inadequadas, desmatamento, fertilização desbalanceada, áreas degradadas, monocultivos, tratamento inadequado dos dejetos animais, solo descoberto e processos microbianos levam a maiores taxas de emissão de carbono para a atmosfera e a redução gradativa dos níveis de carbono no solo, com o passar do tempo. Felizmente, todos esses problemas podem ser consertados com as práticas de manejo agrícolas atualmente disponíveis. O planeta e a nossa agricultura agradecem.
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