A magia da colheita

Edição XXIV | 02 - Mar . 2020
Maria de Fátima Zorato-fatima@mfzorato.com.br
   Ah! quantas ações foram empreendidas para chegar na fase ansiosamente aguardada. A hora da verdade, ou seja, da genética expressar sua produtividade na colheita.
   Não podemos desconsiderar que existe dependência no processo como um todo. Desde o início, englobando planejamento, estratégias, infraestrutura geral, pessoas treinadas e comprometidas, entre outros que podem contribuir na obtenção de resultados. Como fica evidente o processo de produção agrícola movimentando a cadeia com todos os seus elos.
   Aos poucos e detalhadamente, vai se construindo uma lavoura, da implantação à sua condução até o fim, observando toda a escala fenológica, acompanhando o desempenho de plantas, utilizando boas práticas agrícolas e fazendo intervenções pontuais, estimulando a melhor responsividade.
   Tudo para receber a premiação final. O peso na balança indicado pelo largo sorriso é indicativo de que a missão foi atingida, apesar das intempéries que fazem parte do processo, porém bem maiores em determinados anos, castigando a indústria de céu aberto. Em alguns casos, o semblante do produtor não exprime muitas alegrias. Hora de rever e buscar a causa-raiz do problema. E, neste momento, muitos “e se...” surgem.
    Na entrega do produto, o caminho passa a ser dicotômico para o produtor de grãos e o produtor de sementes. Para o primeiro, encerra-se na indústria moageira.  Já para o segundo, a jornada é longa, perigosa e de elevado custo. Neste caso, existem regulamentações no MAPA, onde os campos são inscritos e acompanhados. Tudo segue Normas específicas.
Seguiremos daqui para frente pelas sequências na produção de sementes. Devemos considerar a semente representando ao mesmo tempo o ponto culminante das atividades de uma geração de plantas e o começo de uma nova. Sendo assim, todas as operações efetuadas, devem preservar a matéria prima, que trouxe do campo sua qualidade intrínseca.
   Por tratar-se de período relativamente curto, o emocional se abala, as pressões e os desgastes são muitos. Por que? Oras, as condições ambientais no Brasil tropical, nem sempre são as almejadas durante o período que estende, principalmente na colheita. O portfólio de cultivares das empresas sementeiras está a cada ano maior, visando atender melhor seu cliente. No entanto, mesmo sendo muito estruturado, existe uma dificuldade de receber vários materiais ao mesmo tempo, até porque é possível haver uma antecipação ou atraso de ciclo, em função climática.
   Neste contexto, o diferencial, além de infraestrutura, passa ser a equipe treinada e tocando afinada como uma orquestra, onde cada um executa bem seu papel porque sabe que aqui a orquestra toca com o organismo vivo. Porém, vamos aos fatos geradores de estresses. Clima incerto, genética reativa, fluxos sobrepostos, armazenamentos transitórios são situações habituais no setor sementeiro, desde que começa a colheita.
   Somos conhecedores que os atributos da qualidade, seja genético, físico, fisiológico e sanitário, vem do campo. Entretanto, nas operações subsequentes, da colheita até o lote beneficiado, muito pode se perder. E, muitos não se dão conta disso, de que existem perdas substanciais no pós-colheita e, no pior dos mundos, o dano ocasionado é difícil sua detecção nos testes executados no momento e, sim, bastante tempo após o ocorrido.
   Na pré-colheita, muitos pagam caro para ter analistas trabalhando desde a madrugada para gerar um resultado indicativo de positivo ou negativo do talhão analisado. Como foram feitas as amostragens? Os testes aplicados estão sendo eficientes e eficazes? Eles são indicadores de futuro na armazenagem? Estão sendo interpretados de maneira correta ou apenas um bando de dados soltos?
   Os pontos críticos da pós-colheita, muitas vezes, são desprezados, talvez até por desconhecimento ou camuflagem e, via de regra, a “culpa de perdas de potencial fisiológico” após determinado tempo, recai sobre laboratórios de análise de sementes. Muitos de fato, reconhecidamente, precisam revisitar seus conceitos e se adequar de melhor maneira.
   Lembrando que mercado é excludente e os meios de comunicação hodiernos facilitam as trocas de informações de forma rápida. Uma outra vertente, as empresas sementeiras que prezam seus trabalhos realizados durante todo o tempo, não aceitam mais o “empurra” sobre a qualidade, de maneira indevida, isso passo a passo, vai mudando. Quem não estiver percebendo ou focado no que está fazendo, o tempo vai alterar sua contribuição significativamente, porque afinal, em produto tecnológico com valor cada vez maior, busca-se o profissionalismo mesmo, em todos os aspectos.
   Só lembrando, ocorre interação genética e ambiente, ou seja, ação e reação. Como fica a qualidade da semente?
Existe o produto, mas existem os processos e os serviços que o envolve. A genética está mais exigente. No campo não tem facilidades. Como foi o período que antecedeu a colheita? Por outro lado, no processo de pós-colheita, misturam-se os diferentes, seja em grau de umidade ou mesmo de danos fisiológicos distintos, por determinado tempo e depois beneficia e armazena como se tudo estivesse perfeito.
   Passado algum período, a semente que é verdadeira e não mente jamais, começa demonstrar alteração do potencial fisiológico, e, sempre o primeiro a manifestar redução é o vigor e depois a germinação. Nesta hora, meus amigos, salve-se quem puder! Já passaram alguns meses, tudo foi comercializado, boa parte foi tratado com produtos químicos, etc. Jamais algum ator deste processo pensa no que aconteceu antes e, sim, geralmente, de que este fato cruel de perda de qualidade não foi devidamente identificada.

   " Na pré-colheita, muitos pagam caro para ter analistas trabalhando desde a madrugada para gerar um resultado indicativo de positivo ou negativo do talhão analisado."

   Com o “empoderamento genético” da atualidade, vamos continuar a procurar culpados ou está na hora de rever processos? 
   O melhoramento genético está cumprindo seu papel e a indústria sementeira que tem a responsabilidade de entregar quantitativa e qualitativamente as sementes estão conseguindo a mesma coisa?
   Lendo recentemente um spoiler de livro do co-fundador do Linkedin, R. Hoffman, ele chamou para uma reflexão: “a velocidade e a incerteza são a nova estabilidade... e de que as maiores vantagens competitivas, de agora em diante, serão de quem aceita aprender constantemente, é sempre a responder a novas mudanças e consegue ver ordem, enquanto todos só enxergam o caos”.
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