A evolução dos transgênicos no mercado mundial

Edição XXII | 05 - Set . 2018
Fabricio Becker Peske-fabricio@seednews.inf.br

    A população mundial cresce a passos largos desde o início do século XIX, acarretando em uma demanda significativamente maior por alimentos e, por consequência, uso eficiente dos recursos disponíveis para a agricultura, como terra, o qual é limitado.

    Segundo dados da FAO, em 1961 a média de área agriculturável disponível por habitante era de 1,5 hectare, enquanto que hoje é de apenas 0,7 hectare, uma redução de 50%. Felizmente, as tecnologias implementadas na atividade agrícola, como proteção de cultivos, maquinários, fertilizantes, melhoramento genético e biotecnologia aprimoraram a eficiência de uso de cada hectare plantado em 68% no mesmo período. 

    Os benefícios específicos obtidos a partir da biotecnologia e o uso de materiais transgênicos já somam US$ 169 bilhões em ganho de produtividade dentre todas as culturas geneticamente modificadas. Com isto, pode-se considerar uma economia de 174 milhões de hectares, além dos benefícios diretos ao meio ambiente através da redução do uso de inseticidas e herbicidas em 19% desde 1996, trazendo redução da fome e pobreza para mais de 65 milhões de pessoas ao redor do mundo.

    Os países que mais contribuem no total de área plantada com materiais geneticamente modificados (OGMs) são: EUA, Brasil, Argentina, Canadá e Índia, cuja soma representa 91,3% da área com OGMs no mundo em 2017. 

    A área cultivada globalmente com OGMs segue crescendo ano a ano. Há pouco mais de 10 anos (2006) a área com OGM ultrapassava 100 milhões de hectares, sendo principalmente devido aos cultivos de soja e milho. Hoje, a área total atinge a marca de 189,8 milhões de hectares, já incluindo culturas como algodão, canola, cana-de-açúcar, arroz, trigo, alfafa e diversas outras espécies.

    Dentre as quatro culturas mais plantadas (soja, milho, algodão e canola), o milho e a canola despontam como os cultivos com menor taxa de adoção de cultivares transgênicos no mundo, sendo 32% e 30% de adoção, respectivamente. Por outro lado, o algodão e a soja são as culturas com maior taxa, apresentando aproximadamente 80% e 77%, respectivamente. Ainda assim, o milho destaca-se como a cultura com maior número de eventos transgênicos aprovados, possuindo quatro vezes mais do que qualquer cultura, com mais de 210 eventos em 2017.

    Devido à limitação de área, os países desenvolvidos dependem hoje do constante aumento de produtividade para, da mesma forma, aumentar a produção de alimentos. No entanto, em países em desenvolvimento, principalmente da África, ainda há uma capacidade significativa de aumento de área de plantio. Esta tem sido uma tendência observada já há alguns anos, sendo que desde 2011 a soma de área plantada em países em desenvolvimento já ultrapassa a soma de países desenvolvidos, cujo crescimento se deve principalmente à evolução da área com soja no Brasil, a qual cresceu aproximadamente 40% nos últimos 10 anos.

    Em comparação com 2016, a área cultivada com soja e algodão transgênico no Brasil aumentou significativamente em 1,1 milhão de hectares, devido principalmente à melhor rentabilidade, preços mais altos, alta demanda nacional e internacional, e tecnologias de sementes disponíveis. A ligeira redução no milho biotecnológico deveu-se à baixa dos preços atuais e à expansão da área de soja no país.  


Mais de uma centena de cientistas ganhadores do prêmio “Nobel” no passado assinaram uma carta aberta contra a organização ambientalista “Greenpeace”, pedindo que reconheça as conclusões das instituições científicas competentes e abandone sua campanha contra os OGM.


    Em relação aos EUA, a área plantada com soja evoluiu 20% nos últimos 10 anos, havendo poucas oportunidades para maior expansão. Além disto, já plantam 97,5% de sua área com cultivares transgênicos. Porém, no Brasil há ainda um moderado percentual de área com variedades convencionais (~9%), além de ainda haver significativa capacidade de expansão da área de cultivo de soja através da recuperação de área com pastagens degradadas e abertura de novas áreas (principalmente na região norte). 

    A introdução de culturas transgênicas em um país é motivada pelos benefícios financeiros dos produtores rurais e pelo desejo constante e eterno de tornar as atividades agrícolas menos complexas, livres de plantas daninhas, doenças e insetos, além de obter produtos com excelente qualidade e desempenho no campo. 

    Assim como no Brasil, muitos países sofreram com o ingresso de materiais geneticamente modificados pela porta dos fundos, antes que qualquer norma regulatória tenha sido estabelecida. Ainda, frequentemente, assim que os agricultores passam a conhecer os benefícios das tecnologias, há pressões diversas sobre o governo para que sejam formulados padrões e normas regulatórias para que tais culturas e produtos “GM” possam ser cultivados e comercializados.

    Caso esta demanda não seja atendida pelo governo, a falta ou insuficiente regulamentação resulta em sementes de espécies transgênicas abaixo dos padrões de qualidade genética, física e fisiológica, havendo ainda misturas frequentes de variedades “OGMs” e “não OGMs” (ou dentre outros eventos), os quais são comercializados e obtidos pelos agricultores por menores custos. Estas sementes, definitivamente, apresentam menor eficiência, desempenho e produtividade, causando perdas financeiras ao produtor e ao mercado em geral.

    Um processo regulatório abordando questões de biotecnologia com eficiência é essencial e deveria ser prioridade em iniciativas governamentais junto a cientistas, conselhos de biossegurança, companhias e representantes do setor legislativo.




    É possível afirmar que custos por oportunidades não exploradas podem ser altos aos governos, sociedade e agricultores, os quais devem ser sempre levados em consideração ao avaliarmos os riscos em biossegurança e suas consequentes tomadas de decisão. Principalmente hoje, com o culminante uso de tecnologia de “edição de genes”, cada vez mais aplicado pelas empresas de biotecnologia, o qual acelera o desenvolvimento de novos eventos e cultivares.

    No passado, a comercialização de algumas culturas biotecnológicas do setor público foi afetada por regulamentações rigorosas em seus respectivos países ou regiões, incluindo arroz dourado (GR), berinjela BT, feijão resistente ao mosaico dourado do feijão (BMGV), milho resistente a insetos e tolerante à seca na África. 

    O atraso na aprovação do arroz dourado na Índia pode resultar em um custo percebido de US$ 199 milhões por ano para compensar em demasia os benefícios da tecnologia. Isso poderia ser semelhante em outros países em desenvolvimento da Ásia, América Latina e África, com alta incidência de deficiência de vitamina A. Cerca de 1,4 milhão de produtores de berinjela de IR (BT) na Índia estão sendo privados dos mais de US$ 500 milhões em benefícios econômicos anuais devido ao longo impasse na comercialização de berinjela BT. É irônico que o mesmo produto esteja sendo comercializado em Bangladesh por três anos consecutivos e os agricultores já estejam se beneficiando de 70-90% de redução no uso de pesticidas e benefícios econômicos de US$1.868 por hectare. 

    A aprovação do feijão biotecnológico resistente a BGMV no Brasil, em 2011, deu esperança aos 25.000 proprietários de pequenos fazendas no país para usar uma tecnologia que efetivamente controlaria a devastadora doença viral e se recuperaria de suas grandes perdas anteriores. Infelizmente, até o momento desta publicação, não há indicações claras de que a tecnologia estará nas mãos dos agricultores em um futuro muito próximo, o que pode sufocar seus benefícios econômicos e agrícolas. 

    O projeto Milho com Eficiência Hídrica para África (WEMA), iniciado em 2008, está focado no desenvolvimento de milho tolerante a secas e resistente a insetos (Bt) para países da África Subsaariana: África do Sul, Quênia, Uganda, Tanzânia e Moçambique. Esta colaboração entre setor público e privado espera resolver o mais rápido possível os dois problemas mais devastadores da região – a seca e a praga de insetos no milho –, para evitar mais fome e desnutrição na África. Esses quatro produtos do setor público visam as pessoas pobres, desnutridas e famintas nos países em desenvolvimento. Críticos que de alguma forma influenciam órgãos reguladores do governo não têm o direito de parar a tecnologia devido ao idealismo e ao fanatismo, afinal milhões de vidas estão em jogo. 


O total de aprovações de culturas biotecnológicas de 1992 a 2017 foi de 4.133, compreendendo 1.995 aprovações para alimentação humana, 1.338 para alimentação animal e 800 para cultivo.


    Finalmente, o imenso crescimento contínuo de adoção de culturas GM para cultivo e importação global é uma manifestação do agricultor e satisfação do consumidor final, além de benefícios socioeconômicos e ambientais, bem como segurança alimentar e melhoria nutricional trazida pelas culturas biotecnológicas. A garantia que esses benefícios continuem agora e no futuro depende da diligência e visão de futuro, implementando passos regulamentares baseados na ciência, olhando criticamente os benefícios em vez de riscos, a produtividade agrícola com um sentido de conservação ambiental e sustentabilidade, e, mais importante, levando em consideração os milhões de famintos e empobrecidos que necessitam de melhora em suas vidas.   

(Trecho do artigo “Global Status of Commercialized Biotech/GM Crops in 2017” de ISAAA Briefs 53).

    Na carta aberta, os cientistas escreveram que “o Greenpeace tem encabeçado a oposição ao arroz dourado, que tem o potencial de reduzir ou eliminar grande parte das mortes e doenças causadas pela deficiência de vitamina A, que ceifam as pessoas mais pobres da África e do Sudeste Asiático; quantas pessoas pobres precisam morrer no mundo antes de consideramos isso um crime contra a humanidade”?

    Além dos 24 países que plantam materiais transgênicos, 43 países que não plantam (17 + 26 países da UE) aprovaram a importação de culturas biotecnológicas para alimentação humana, animal e processamento em geral, totalizando 67 países que adotam culturas biotecnológicas globalmente. 

    Por fim, em 2017, o Brasil aprovou quatro eventos de soja transgênica para cultivo, incluindo uma soja contendo a piramidação dos eventos IR / HT e três características de tolerância a herbicida piramidados com a resistência a inseto. Havia 14 eventos de soja transgênica aprovados para alimentação humana e animal em 2017.




Compartilhar