Soja - principais doenças ocasionadas por fungos (parte 1)

Edição XXVII | 03 - Mai . 2023
Maria de Fátima Zorato-fatima@mfzorato.com.br
   A adoção de práticas culturais adequadas requer que se conheçam as doenças, seus agentes causais, sua epidemiologia, seu estádio fenológico de maior vulnerabilidade e as reações das cultivares a cada doença. A grande maioria dos patógenos que sobrevivem e se multiplicam nos restos culturais da safra anterior, nos tecidos senescentes ou mortos da própria cultura em desenvolvimento são denominados parasitas facultativos ou necrotróficos. Poucos patógenos que atuam na soja são biotróficos, ou seja, multiplicam-se apenas em hospedeiros ou tecidos vivos, como exemplos, Phakopsora pachyhizi, Peronospora manshurica e Microsphaera diffusa/Erysiphae difusa.

   No Brasil, foram identificadas em torno de 40 doenças na soja, e cada uma tem a importância econômica. Visando objetividade de um assunto extensivo, dividiremos o texto em dois momentos. Neste primeiro, trataremos de fungos significativos que provocam doenças de parte aérea. No próximo texto, serão destacados os fungos causadores de doenças do sistema radicular.

   Um dos fungos de parte aérea é o Phakopsora pachyhizi, agente da Ferrugem Asiática, um parasita que necessita de hospedeiro para sua sobrevivência e multiplicação. Os uredósporos são os esporos responsáveis pelas epidemias e são disseminados por correntes de ventos. Os sintomas são detectados principalmente em folhas, embora possam ser observados em hastes e nos cotilédones da semente, e podem ocorrer em qualquer estádio de desenvolvimento da planta. O manejo envolve integração de medidas culturais, resistência genética e utilização de fungicidas.

   Peronospora manshurica (Míldio) é um patógeno considerado como parasita biotrófico, o qual na ausência de tecido verde do hospedeiro, sobrevive na forma de estrutura de dormência (oósporos). Durante a entressafra, pode manter sua viabilidade pelo parasitismo de plantas voluntárias.

   Erysiphae diffusa (Oídio) é um fungo biotrófico, apresentando apenas um mecanismo de sobrevivência, que é a colonização de plantas de soja voluntárias e nas lavouras de segunda safra (safrinha). A infecção de folhas causa redução considerável na taxa de fotossíntese líquida e na transpiração foliar. O Oídio, de acordo com a literatura, foi a primeira doença foliar que permitiu a recomendação do uso de fungicidas para controle das doenças da soja.

   Corynespora cassiicola é agente causal de mancha alvo. Por ser um patógeno necrotrófico, o fungo sobrevive em restos culturais, plantas voluntárias e hospedeiros alternativos (mais de 400 espécies de plantas) e em sementes. A incidência do patógeno em sementes é incomum, mas em condições climáticas de elevada umidade relativa do ar (precipitações), pode haver altas incidências do fungo em sementes de soja. No entanto, os principais veículos de disseminação de Corynespora cassiicola são o vento e as gotas de chuva.

   Colletotrichum truncatum (sin. C. dematium var. truncata) é o agente causador da antracnose. O fungo infecta qualquer fase de desenvolvimento da cultura, podendo causar morte de plântulas em pré e pós-emergência ou, ainda, causando necrose dos cotilédones durante a emergência e dos pecíolos, da nervura das folhas, das hastes e das vagens. As principais fontes de inóculo são sementes e restos culturais infectados. As sementes infectadas apresentam manchas deprimidas, de coloração castanho-escura a negra.
Cercospora kikuchii é um fungo necrotrófico causador do crestamento foliar (CFC) e da mancha púrpura na semente (MPS). Embora provoque lesões em toda a planta, os sintomas são mais facilmente identificados em folhas e sementes. Nas folhas, as lesões originam rápida clorose e necrose, ocasionando desfolha prematura; enquanto em semente contaminada, os sintomas são visivelmente identificados pela coloração arroxeada e pequenas fissuras no tegumento. A principal fonte de inóculo do agente causal é a semente, que, quando infectada, origina lesões primárias nos cotilédones e hipocótilo.

   Passalora sojina (sin. Cercospora sojina) é um fungo que sobrevive em especial nas sementes e restos culturais. A infecção da semente ocorre via colonização da vagem ainda verde. Na entressafra, colonizam de maneira saprofítica os restos culturais, produzindo inóculo. As frutificações, conidióforos e conídios não são hidrofílicas, portanto, o processo de remoção e transporte pelo vento ocorre quando a superfície dos órgãos ou tecidos esporulantes estiverem secos.

   Septoria glycines é o agente causal da mancha parda. Ocorre em áreas sem rotação de cultura e com chuvas frequentes após a semeadura. Os primeiros sintomas podem ser visíveis nos primeiros folíolos, aos 13 a 15 dias após a emergência. A colonização de semente ocorre quando o fungo ataca a vagem. Quando a semente infectada germina, o fungo também retoma seu crescimento e manifesta-se em lesões cotiledonares. A S. glycines é um fungo necrotrófico e, após a senescência da planta de soja, passa à fase saprofítica. Após a colheita, nos restos culturais sobre o solo, o patógeno continua a colonizar ativamente os tecidos e a produzir esporos hidrofílicos em picnídios e picnidiosporos. Enquanto existir nutrição no substrato, manterá sua viabilidade, produzindo inóculo. O estímulo à liberação do esporo é a água (orvalho, neblina, chuva ou água de irrigação), que, ao fornecer molhamento, aumenta a pressão interna, e os picnidiosporos são expulsos numa massa gelatinosa, através do ostíolo, numa estrutura denominada cirro. Os esporos estão presentes nas gotas de água, como respingos. O vento transporta estas minúsculas gotas à distância, próxima da fonte de inóculo – lesões cotiledonares e restos culturais infectados.

   Como medida de controle, na concepção dos pesquisadores das literaturas consultadas, figuram a estratégia de manejo na semeadura com cultivares resistentes e utilização de sementes certificadas de elevada qualidade, monitoramento constante da lavoura, uso adequado de fungicida ao alvo biológico, rotação de fungicidas e associação à multissítios, visando aumentar a eficácia de controle e reduzir o risco de resistência, a utilização de produtos biológicos, escolha e manejo de solos para evitar compactação e o encharcamento, sistema de rotação e sucessão com culturas não hospedeiras, enfim, manejo integrado de doenças aqui descritas. 
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