Ferramentas de gestão, markut e preço da semente

Edição XIII | 04 - Jul . 2009

    Os critérios e fatores formadores do preço final da semente, bem como o markup, nem sempre parecem lógicos, e a impressão que algumas vezes permanece é que ela é uma prática mais especulativa do que racional, prendendo-se visivelmente à capacidade de alocar recursos por parte do cliente ou da oferta potencial de sementes no mercado. Embora tenha um fundo de verdade, a questão é muito mais complexa do que possa parecer.

    Em qualquer atividade tem-se ao menos duas ocupações distintas a serem realizadas com eficácia para que o retorno do investimento tenha efeito. A primeira, diz respeito à qualidade do processo de produção em si, que requer principalmente tecnologia de processo e de produto. A segunda é a comercialização, que tem na formação de preço a sua principal dificuldade, ancorada nos custos realizados, custo-meta da próxima safra, movimentação do mercado e, por fim, o markup.

    É necessário, porém, compreender o significado de markup e o modelo básico de formação de preço. O primeiro é um termo usado para indicar quanto do preço do produto está acima do seu custo de produção e distribuição, e o valor representa a quantia efetivamente cobrada sobre o produto, a fim de obter o preço de venda.

    Assim, tradicionalmente, a formação de preço consiste em calcular o custo total unitário do produto e acrescentar uma margem de lucro, também chamada markup, que deve ser calculada de forma a gerar a taxa de retorno desejada sobre o investimento da empresa. Sobre o preço de venda incidem alguns encargos que precisam ser levados em consideração junto a outros ajustes típicos da produção rural; assim, o cálculo do preço não é a simples aplicação do markup sobre o custo.

    Em se tratando do setor de sementes, muito se tem focado na qualidade sistêmica da produção, envolvendo os aspectos genéticos, físicos, fisiológicos e estruturais, mas de um modo geral temos nos dedicado pouco a compreender e discutir melhor as relações mercadológicas e de juízo de valor existentes entre os produtores de sementes e seus clientes. Soma-se ainda a inconsistência e a compreensível inconstância nos métodos utilizados para a definição do preço de venda a partir dos custos, nem sempre estruturados.

    Neste contexto, algumas perguntas inquietantes revelam a complexidade a ser analisada. Quantos produtores, notadamente, fazem o custo de produção da matéria-prima e da produção da semente de modo confiável, assim como os clientes/produtores? Qual o valor relativo do negócio semente no contexto do negócio como um todo das empresas? Qual a relevância da disposição do produtor/cliente em pagar, na definição do preço final? Quais condicionantes são consideradas pelos sementeiros para estabelecer os preços efetivos? E, por fim, é possível estabelecer um markup adequado para a comercialização?

    Por partes, algumas ponderações podem ser feitas. Considerando o uso das principais ferramentas de gestão, pesquisas realizadas no Brasil com soja, evidenciam que menos de 30% do produtores conseguem  informar de forma coerente os custos totais, fixos e variáveis.


    No conjunto, porém, pode-se afirmar que somente 10% dos produtores de soja  apresentam evidências de que fazem uso das ferramentas e indicadores pesquisados (balanço patrimonial, demonstrativo de resultado do exercício, fluxo de caixa, custo de produção, orçamento e planejamento da comercialização). Ante o cenário, é tendencioso acreditar que também boa parte dos produtores de sementes, assim como seus clientes, não utiliza efetivamente as principais ferramentas de gestão, prejudicando os processos de decisão, entre eles o markup e o preço de mercado.

    De outro lado, salvo raras e honrosas exceções, percebe-se que o marketing não tem sido uma ferramenta constante ou, pelo menos, não da forma como deveria ser. Isso pode explicar em parte o juízo de valor enviesado que o produtor de grãos faz do insumo semente, mantendo-o circunscrito a um custo desembolsado efetivo e não como um investimento de primeira linha. 

    Em outras palavras, o que de fato possui maior peso para ele? Preço, produtividade potencial, resistência a pragas e doenças, segurança na pós-venda, pessoalidade ou manejo? Percebe-se que alguns obtentores e produtores de sementes ainda oferecem como diferencial aquilo que possui pouca relevância de decisão para o produtor. Além de não obter o premium price desejado, precisam empenhar esforço adicional no marketing.

    Não obstante, sabe-se que poucos produtores possuem como especialidade e especificidade a produção de sementes, principalmente no caso da soja. Boa parcela são produtores de grãos e, embora se atenham à atividade sementeira com afinco e tecnicidade, o fazem como atividade econômica secundária. 

    O negócio semente, por outro lado, possui importância indireta relevante, principalmente na manutenção tecnológica e no acesso a novas tecnologias na atividade principal, o que não deixa de ser um diferencial econômico respeitável.

    Para estabelecer o preço de mercado os fatores influenciadores constituem grande número, dificultando essa prática. Como visto, a primeira é a imperícia em estabelecer os custos e, por consequência, as margens; e a segunda reside na dificuldade técnica em fixá-los, motivada pela oscilação da matéria-prima principal associada ao aspecto temporal entre produção, venda e entrega efetiva. Na prática, o produtor vende o produto quando ainda não sabe a qualidade, quanto vai produzir e tampouco o seu custo.

    Neste cenário é saliente a representação do custo da matéria-prima no custo de produção final da semente. A matéria-prima cotada em dólar e pelo mercado internacional pode representar uma banda ampla de flutuação, conforme gráfico, que vai de 44% a 64% do custo final da semente, dependendo exatamente desta oscilação de preço. 

    Em valores absolutos, significa dizer que o custo, sem considerar qualquer markup ou custo de comercialização, pode oscilar entre R$ 37,00/sc até R$ 54,00/sc de 40 kg, mantendo os demais fatores de custo constantes, o que, obviamente, também não deve ocorrer. A comercialização ocorre ex-ante à definição de boa parte dos custos e é normalmente definida a partir dos custos-meta, o que aumenta a dificuldade em estabelecer o markup.

    Para se ter uma idéia dessa dificuldade, basta considerar que no ano passado, a cotação do dólar oscilou entre R$ 1,70 e R$ 2,30, e no mercado interno a soja percorreu uma banda que variou de R$ 30,00 a R$ 50,00, algo próximo a 50%.

     De acordo com observação das estratégias adotadas por diferentes produtores de sementes, de um modo geral, pode-se afirmar que existem três aspectos centrais que definem o preço final.

    Primeiro, o estabelecimento de um markup  que deve levar em consideração o retorno esperado e pode oscilar de acordo com as expectativas de cada empresário.

    Segundo, um percentual da comercialização é dado pela necessidade de fluxo de caixa da empresa, o que significa dizer que embora normalmente leve em consideração o custo e sua margem, este aspecto pode eventualmente ser desconsiderado em função da necessidade iminente, e nesse caso reduzindo o markup. Esta percentagem normalmente não ultrapassa os 40% do volume produzido

    Por fim, as informações do mercado tomam relevância consistente sob dois aspectos. Primeiro, as expectativas de oferta e demanda da matéria-prima (soja-grão) no mercado mundial e sua consequente oscilação de preço, e segundo, a expectativa da oferta potencial de semente no mercado local, dado pelo andamento das atividades produtivas dos outros produtores. Características de um mercado especulativo, mas necessário e compreensível.

    Assim, estabelecer markup e preço de venda não é uma tarefa simples e se associa frequentemente à especulação, quando, na verdade, está mais para dificuldade crônica de estabelecer critérios claros e fixos, capazes de permitir decisões rápidas, seguras e lógicas.

    Até a próxima. 

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