Melhoramento genético da soja, da chegada ao Brasil até a era da engenharia genética

Edição XXVIII | 02 - Mar . 2024
Alexandre Nepomuceno-alexandre.nepomuceno@embrapa.br
   Ao longo das últimas cinco décadas o Brasil passou da condição de importador de alimentos para se tornar um dos principais players no contexto do agronegócio, se destacando entre os maiores líderes mundiais na produção e exportação de alimentos. Entre os fatores que contribuíram para esse salto gigantesco, estão os avanços da ciência, que possibilitaram a geração de tecnologias para aumento de produtividade e adaptação das culturas agrícolas às diferentes regiões do nosso país.

   A tropicalização da soja está entre os cases de maior sucesso. Após uma trajetória de muito trabalho em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias para adaptação da cultura em nosso país, o Brasil hoje ocupa a posição de maior produtor mundial. O registro de sua introdução no país é de 1882, pela Escola de Agronomia da Bahia. Em 1891, a soja foi estudada em São Paulo e, em 1914, cultivada pela primeira vez no Rio Grande do Sul. Porém, somente a partir de 1940 que a cultura passou a apresentar alguma relevância econômica. 

   As cultivares inicialmente utilizadas no Brasil eram materiais introduzidos dos Estados Unidos (EUA). Em função disso, seu cultivo concentrava-se na região Sul, que apresenta condições de luminosidade semelhantes às dos EUA. Nas décadas de 1960 e 1970, a soja passou aumentar a sua importância econômica, sendo vista como uma opção de cultura de verão em sucessão ao trigo, que era a principal cultura do Sul. Ao mesmo tempo, o Brasil concentrava esforços na produção de suínos e aves, gerando demanda pelo farelo de soja.

   Na década de 1970, o aumento dos preços da soja no mercado mundial despertou ainda mais o interesse dos agricultores e do governo brasileiro, que passou a enxergar o aumento da produção de soja como uma necessidade estratégica.

   A partir de então, o Brasil passou a investir fortemente em ciência e tecnologia para adaptação da soja às condições brasileiras. Durante esse período foi criada a Embrapa Soja (1975), que teve um papel de liderança nessa trajetória. Um fato muito importante foi a introdução do gene da juvenilidade longa na soja, que possibilitou o desenvolvimento de cultivares adaptadas as condições de baixa latitude. Isso permitiu que, pela primeira vez na história, o grão fosse plantado com sucesso na região entre o Trópico de Capricórnio e a Linha do Equador, ou seja, no Centro-Oeste do país.

   Até o sancionamento da Lei de Proteção de Cultivares (Lei nº 9.456, de 25 de abril de 1997), o melhoramento genético da soja vinha sendo realizado predominante por instituições públicas de pesquisa. Após a sua publicação, empresas privadas também passaram a investir fortemente no desenvolvimento de novas cultivares, mantendo seu portfólio constantemente renovado por meio do lançamento de novas variedades, o que alavancou ainda mais a pesquisa com a cultura. Hoje o produtor conta com uma ampla gama de variedades, de diferentes grupos de maturidade e adaptadas as diversas regiões do país. 

   Outra tecnologia disruptiva no campo da genética foi o surgimento da transgenia, que chegou ao Brasil em 1998, mas que teve seu uso regulamentado apenas em 2005. A primeira geração de transgênicos consistiu na soja com tolerância ao herbicida glifosato, o que teve um impacto muito grande, por facilitar o manejo de invasoras e também a expansão do sistema de plantio direto em nosso país. A transgenia foi uma das tecnologias que mais rapidamente foi adotada pelo produtor, sendo que em poucos anos a maior parte da área passou a ser cultivada com variedades transgênicas. 

   Com os crescentes avanços em genética e biologia molecular e com o surgimento das ferramentas de edição de genomas (CRISPR/Cas), já temos exemplos de soja com melhor qualidade de óleo, resistência a doenças e mesmo sendo modificada para produção de fármacos e produção de proteína semelhante a carne suína. Em um futuro próximo o que podemos esperar é uma nova revolução no desenvolvimento de variedades, que além de continuarem apresentando melhorias constantes na produtividade e nas características agronômicas, incorporem também características voltadas o aumento da qualidade nutricional, a diversificação do uso da soja, a adaptação as mudanças climáticas, além de muitas outras características.  

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