Engenharia metabólica da soja para a melhoria da qualidade do óleo

Edição XXVII | 04 - Jul . 2023
Alexandre Nepomuceno-alexandre.nepomuceno@embrapa.br
    O grão de soja contém cerca de 20% de óleo, o qual é rico em ácidos graxos poli-insaturados, que são menos estáveis e suscetíveis de se tornarem rançosos mais rapidamente. Uma alteração no perfil do óleo de soja traria contribuições importantes para a saúde, quando este é destinado a alimentação humana, bem como para a produção de um biodiesel de melhor qualidade. 

   A atual matriz energética mundial é composta principalmente de fontes não renováveis advindas do petróleo. Entretanto, a iminente escassez desse produto e a preocupação com a emissão de gases de efeito estufa incentivam a busca por fontes renováveis de energia. No Brasil, a mistura de biodiesel no diesel foi instituída com o objetivo de reduzir as emissões de poluentes prejudiciais ao meio ambiente e à saúde da população, sendo a soja a matéria-prima que supre a maior parte da sua produção. O biodiesel é energia renovável, biodegradável, atóxica e limpa; no entanto, é susceptível à oxidação quando exposto ao ar. Esse processo afeta a qualidade do combustível, principalmente após longos períodos de armazenamento. Uma alteração no perfil de ácidos graxos do óleo de soja, que resulte em maior concentração de ácido oleico e redução nos teores dos ácidos linoleico, linolênico e palmítico, melhoraria a estabilidade e a qualidade do óleo, beneficiando a produção de biodiesel.

   Considerando que o óleo de soja é amplamente utilizado na alimentação humana, essas alterações no perfil de ácidos graxos trariam também benefícios para a saúde, fazendo com que o óleo de soja adquira propriedades semelhantes às do azeite de oliva. Um dos fatores que conferiram ao azeite de oliva a fama de “gordura do bem” foi sua alta concentração de ácido oleico, conhecido como ômega-9. Esse ácido graxo monoinsaturado tem propriedades anti-inflamatórias e a capacidade de reduzir o colesterol ruim. Por muitos anos o óleo de soja foi hidrogenado para produzir margarina, gordura e óleo de fritura. Esse processo de hidrogenação resulta na geração de gorduras trans, que aumentam a incidência de doenças cardíacas. Nos Estados Unidos, desde 2015, a agência que regula alimentos e medicamentos (Food and Drug Administration - FDA) baniu a gordura trans no país. No Brasil, a Anvisa adotou essa medida a partir de 2023.  

   A rota metabólica, bem como os genes que controlam o perfil de ácidos graxos na soja, já foram identificados. Na natureza, existem plantas de soja com alto teor de ácido oleico. Entretanto, esses materiais não são adaptados as condições do nosso país e, em geral, apresentam baixas produtividades. Por meio do melhoramento genético, essa característica pode ser introduzida em variedades modernas, altamente produtivas e adaptadas as nossas condições. As ferramentas genéticas para o desenvolvimento de cultivares de soja com essa característica incluem desde o melhoramento genético clássico, a transgenia e, mais recentemente, a edição gênica. Nos Estados Unidos, já existem cultivares de soja disponíveis no mercado com alto teor de ácido oleico e reduzidos teores de linoleico e linolênico, como as tecnologias Plenish da Corteva e Vistive Gold da Bayer, desenvolvidas por meio da transgenia, além da soja Calyno da empresa Calyxt, desenvolvida por edição gênica. A área cultivada com esses materiais vem crescendo gradativamente.

   Acompanhando a tendência do mercado americano, no Brasil, empresas e instituições de pesquisa têm olhado com maior atenção para essa característica e vêm trabalhando no desenvolvimento de cultivares de soja com perfil de óleo diferenciado. Considerando a importância da característica, em um futuro próximo, essas cultivares estarão disponíveis no mercado agregando ainda mais valor a essa cultura. 

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