Liderar equipes de laboratório de sementes

Sob as perspectivas da pluralidade de gerações, de inovações tecnológicas e das diferentes formas comunicacionais contemporâneas

Edição XXII | 01 - Jan . 2018
Maria de Fátima Zorato-fatima@mfzorato.com.br

    Pode parecer estranho, mas nos dias atuais, com todas as revoluções conduzidas pelas tecnologias ganhando força e se inserindo em todos os aspectos de nossas vidas, é impossível abordarmos os testes e a qualidade de sementes sem dar ênfase ao que está ocorrendo em nossas equipes na dimensão pessoal. A maneira de perceber o nosso entorno deve ser alterada, passando-se a acompanhar todas as mudanças, desenvolver novos modelos mentais na busca de competências para minimizar choques e prejuízos. 

    Conciliar, dinamizar e entregar resultados almejados são tarefas que diferenciam os líderes que estão trabalhando efetivamente com a gestão de pessoas atuantes em atividades técnicas e que devem atender os princípios normativos. As tecnologias se sucedem muito rápido e demandam das mentes humanas a capacidade de acompanhar as modificações e se adaptar. Porém, o desafio de provocar mudanças mentais começa com o nosso modo intrínseco de pensar o mundo e os processos.


A diversidade e a transformação

    Desde há muito tempo, na trajetória profissional, acontece o convívio entre pessoas de idades, condutas e reações distintas.  Todavia, essa diferença não parecia ser tão perceptível no conjunto de ações observáveis do indivíduo enquanto se permaneceu na lógica do pensamento mecanicista, onde atuavam como máquinas e tinham suas atividades rotineiras, repetitivas, comportamentos previsíveis e estáveis, quando comparado aos últimos anos, com a quebra do paradigma administrativo das organizações, sendo vistas agora como organismo vivo, apresentando grande mobilidade e inovações que se sucedem e, também, perfil humano completamente diferenciado, menos conservador e com visão e valores bem distintos das gerações anteriores. 

    No universo dos laboratórios de sementes, ocorre hodiernamente uma interface de gerações, uma das dimensões da diversidade. Esse amálgama de mentes deve ser liderado de maneira a criar espaço que acomode a pluralidade de opiniões e ideias, respeitando as características de cada grupo etário, suas habilidades e seus talentos.

    Estimular as capacidades e entender as idiossincrasias das diferentes gerações tem se constituído uma tarefa bastante árdua de gestores, que precisam influenciar pessoas almejando a transformação do conhecimento em ações e traduzidas em resultados significativos, reivindicados pelas empresas e, especialmente, às que se referem ao agronegócio envolvendo a parte técnica do processo. A semente se transformou num veículo tecnológico e precisa ser analisada por vários ângulos, sobretudo sua qualidade.

    Acredito que se o responsável técnico ou coordenador que é líder e gestor de um laboratório de análise de sementes souber respeitar as individualidades, tenha habilidade necessária para promover a interação entre as diferenças e saiba ser um comunicador aberto, ele edificará um ambiente mais pragmático, acolhedor de ideias e de grande eficácia.


A tecnologia como precursora de mudança e evolução 

    Não podemos mais tratar problemas atuais aplicando soluções do passado. Administrar as mudanças que se apresentam em ciclos intermináveis faz parte das tarefas do líder de qualquer setor. A letra da música “Como uma Onda”, de Lulu Santos e Nelson Mota (1983), retrata bem o que devemos ter em mente sobre os acontecimentos que nos cercam: “Nada do que foi será do jeito que já foi um dia. [...] A vida vem em ondas, como o mar, num indo e vindo infinito [...]”. Portanto, novas estratégias sempre devem estar presentes na gestão de pessoas que enxergam e percebem a vida e suas vicissitudes de maneira diferente.

    Justapor a tradição e construir ambiente que propicie a criatividade e a reflexividade dos indivíduos exige outra competência, outra atitude e outra postura do líder, em tempos nos quais o capital intelectual tornou-se grande diferencial para atender uma nova cultura no mundo dos negócios.  

    E, quando se aborda a pujante agricultura hodierna, que traz em seu bojo a sofisticação tecnológica, devemos procurar entender de forma profunda a “sociedade nefelibata”, um termo da era digital, que não pode mais ser traduzido como viver com a cabeça distraída, nas nuvens, mas sim como pessoas que apresentam interesses e percepções diferentes e que vivem conectadas e informadas.

    O ser humano é um manancial de ideias, de inteligência inata, mas são necessárias lapidações para transbordá-las, de forma correta, para que cada um, no decorrer da vida, haja a mudança que houver, saiba aproveitar as oportunidades surgidas, em qualquer situação. Traduzindo: necessita preparo! Treinamento contínuo, aprendizado sempre!

    Percebemos exatamente isso, a cada dia, a cada ciclo, no mundo agrícola onde fornecedores de bens e serviços estão trabalhando junto às Startups para colocar à disposição dos agricultores recursos inovadores e rápidos. 


"Estimular as capacidades e 
entender as idiossincrasias 
das diferentes gerações 
tem se constituído uma 
tarefa bastante árdua de 
gestores, que precisam 
influenciar pessoas almejando 
a transformação do 
conhecimento em ações..."


    No setor sementeiro, soluções em análises avançadas por imagens que eliminam as subjetividades dos testes se traduz numa nova realidade. O mercado já conta com empresa de base tecnológica que busca, através de seus produtos, revolucionar a performance de seus clientes, seja para recepção de produtos e/ou análises laboratoriais. Diante disso, observamos que para as sementes parece que tudo vai dar certo. A questão que fica: e para os colaboradores que trabalham no dia a dia, como vai ser? Serão eliminados do sistema ou estão sendo preparados para tal? E, quanto às reações do produto tecnológico, a magnânima semente? A máquina estará de prontidão para capturar algo de diferente que acontecer, safra à safra, como sabemos que ocorre dependendo de genótipos desconhecidos e clima incerto? É um fungo mais agressivo, uma semente com um defeito diferente, um produto químico novo sendo aplicado e gerando reações diferenciadas, entre outros, que são muito reais no sistema de produção de sementes – organismos vivos. Como será? Retornaremos à época mecanicista? Ou necessitamos estar cada vez mais preparados e especializados para auxiliar as máquinas a serem mais assertivas?

    As respostas vão sendo elaboradas via tentativas. Para isso, pessoas podem fazer a diferença, como sempre o fizeram. 

    Enquanto isso, retornemos ao mundo prevalente em maior escala ainda, até que sejamos completamente substituídos pela Artificial Intelligence (AI).


A equipe: pilar substancial do trabalho

    A equipe que desenvolve trabalhos em locais que obedecem qualidade padronizada, indiferente ao que tange ao novo – seja tecnologia de automação ou de informação –  deve seguir metodologias descritas e comprovadas, a exemplo de um laboratório de análise de sementes. Os analistas e os auxiliares de análises precisam ser treinados e ter o esclarecimento suficiente de quais os envolvimentos e prejuízos que podem ocasionar, caso não haja respeitabilidade dos procedimentos técnicos. O responsável técnico (gestor e líder) deve planejar o engajamento da equipe, realizar treinamentos constantes, traduzir as técnicas mais complicadas, explicar a importância do trabalho, conhecer o perfil de cada membro da equipe e colocar as pessoas certas nos lugares certos para obter o melhor desempenho individual, acompanhar a execução dos planejamentos, assim como adaptar-se e flexibilizar-se às ideias das diferentes gerações e prepará-las para desempenhos assertivos. 

    Deve figurar ainda no portfólio desse gestor, para que exerça influência na realização de excelência no trabalho técnico, ser coerente com o que diz e executa, oferecer a perspectiva adequada, disseminar a confiança, propiciar o desenvolvimento individual e de competência interpessoal através de feedbacks, indicar rumos, manter o foco, pensar e comunicar com clareza, estabelecer metas desafiadoras, esclarecer propósitos, fazer boas escolhas e decidir de forma correta, criar parceria com a equipe e manter a objetividade.

    Esta é a receita, a fórmula mágica de quem quer comprometer o ‘Homo sapiens tecnológico’ com um trabalho extraordinário que envolve a qualidade. Extrair o melhor de cada integrante da equipe, indiferente à idade e à tarefa que executa, exige no contemporâneo, um entendimento profundo do ser humano, de sua dimensão maior.

    No mundo aplainado, veloz e transparente, a equipe e a forma de liderança se estabelecem como cerne de sucesso no cenário do mundo das sementes. O laboratório de análise de sementes dever ser pensado como uma empresa. 


"E, retornando à letra da música “Como uma Onda”,
de Lulu Santos e Nelson Mota (1983): [...]
Tudo que se vê não é igual ao que a gente viu
há um segundo, tudo muda o tempo todo no mundo [...]"


Habilidades para convergir as diversas formas de pensar

    Se entrarmos no túnel do tempo, num review bem rápido, vamos visualizar o cenário quotidiano do homem do campo, nosso agricultor, o qual, há mais de 10.000 anos, participa da construção, transformação e evolução da nossa base agrária. E, no decorrer do tempo, também passou a fazer parte a produção de sementes. E, como não poderia deixar de ser, existe o histórico das análises de sementes, que na literatura remonta ao ano de 1860, com iniciativas do cientista Friedrich Nobbe, fundando o primeiro laboratório de análises de sementes e publicando o primeiro livro sobre análise e comportamento fisiológico de sementes, em 1876. Iniciativas que foram precursoras das Regras para Análise de Sementes (RAS), as quais normatizam a produção e comercialização de sementes. 

    E daqueles tempos para o atual, quantas evoluções! As sementes não são mais as mesmas. Quando pensamos em organismo vivo, pensamos em ciência, que pode mudar, ser alterada.  As sementes do século XXI são verdadeiros chips tecnológicos e estão agregando muito valor! 

    Enfrenta-se, nos dias atuais, em análises rotineiras, várias situações carreadas por genótipos e respostas climáticas nos diferentes nichos de produção de sementes. Os mesmos testes, ontem aplicados com sucesso, hoje não mais respondem, principalmente no que se refere ao vigor, termo tão bem cunhado pelos produtores. Ora, se a metodologia é a mesma, se os equipamentos são os mesmos, o que então está transformado? É claro que vem carregado pelo veículo principal que é a semente, mostrando responsividade distinta. Pode ser genética, produtos químicos, problema de clima, ou influência de outros fatores? Não se sabe. A única certeza é que não responde mais. E que precisamos correr atrás para entrega de bons resultados para produtores cada vez mais conectados e que sabem o que querem.

    Contextualizando, temos que convergir as formas de pensar e agir no sistema, com atualizações nos aspectos que envolvem o todo e não apenas parcialmente. 

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