Terras agrícolas de alto quilate

Edição XXVI | 04 - Jul . 2022
Marcelo Benevenga Sarmento-marcelobs05@hotmail.com
    O Brasil é, atualmente, um dos maiores players do agronegócio global, destacando-se na produção e exportação de grãos, carnes e fibras. Esse crescimento na relevância do papel do país ocorreu a partir dos anos 2000 devido à expressiva elevação no valor das commodities agrícolas.
Esse aumento na demanda por alimentos, bioenergia e matérias-primas de origem agropecuária tem acarretado em maior interesse de investidores no setor, o que eleva o preço das poucas terras agriculturáveis atualmente disponíveis.

    Estudos realizados nos últimos anos por instituições como Banco Mundial, FAO e OMC, têm demonstrado que essa incessante busca por agroprodutos aumentou o interesse por terras agrícolas no mundo todo. Ora, demanda aquecida somada à escassez de terras e recursos hídricos disponíveis para uma necessária agricultura mais sustentável são a receita perfeita para uma sobrevalorização dos preços das terras, o que também tem ocorrido no Brasil.

    Nos últimos anos tem havido um forte interesse global por terras da América Latina, especialmente do Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, e da África subsaariana, o que tem contribuído fortemente para a inflação dos preços.

    No Brasil, pesquisa desenvolvida pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostrou uma valorização média de 308% no país, entre os anos de 2002 e de 2013, superior à taxa de inflação de 121,9% no mesmo período.

    Pesquisa conduzida pela Economics FNP registrou aumento de 55% no valor das terras rurais nos últimos anos em decorrência da alta de projetos irrigados e commodities. Essa valorização ocorreu principalmente em municípios dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo. O estudo listou a maior alta de valorização das terras rurais (361%) no estado de Minas Gerais, a mais expressiva da região Sudeste.

    Nunca é fácil estimar o valor da terra, pois esta depende de muitas variáveis, além de aspectos pontuais regionais, da demanda por áreas ou do momento econômico de um país. Mais recentemente, a pandemia de Covid-19 e a alta do dólar contribuíram para essa alta.

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    A área conhecida como MATOPIBA, que representa os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, recente fronteira agrícola nacional, foi uma das que mais teve valorização dos preços. Variáveis como a melhoria na infraestrutura de cidades, infraestrutura logística e a intensificação dos cultivos tem refletido em uma significativa valorização das terras nestas regiões. 
 
    Além dos fatores já mencionados, cada secretaria estadual adota sua própria metodologia para identificar as alterações dos preços. Por exemplo, enquanto em Minas Gerais é baseada na especificação da terra, no Paraná é baseada no tipo de solo. Estas diferenças dificultam a comparação de valores entre distintas regiões do país.
Economia regional aquecida como mostram diversos municípios do interior de São Paulo, Goiás e Mato Grosso também favorecem a instabilidade dos preços.

    Regiões agrícolas tradicionais com solos férteis, relevo suave e boa infraestrutura logística geralmente tem preços mais elevados. Por outro lado, outras como o do Vale dos Vinhedos em Bento Gonçalves no Rio Grande do Sul, devido ao forte fomento do enoturismo tem uma das terras mais caras do país. Ainda, solos de terras roxas no Paraná, anteriormente cultivados com café, hoje com soja, possuem um dos maiores valores registrados nos últimos anos. Nos últimos 20 anos o vale do São Francisco, sobretudo os munícipios vizinhos de Petrolina e Juazeiro, com o incremento das culturas anuais e perenes irrigadas também fazem parte das terras mais valorizadas da região.

    Fatores adicionais como a demarcação das terras indígenas, as leis ambientais, compra de imóveis rurais por estrangeiros, podem pressionar os preços, promovendo a sua elevação. 

    Em estudo recente realizado pelo Banco Mundial, os atuais demandantes de terras no mundo são: a) governos preocupados com o consumo interno e sua incapacidade de produzir alimentos suficientes para a população, especialmente a partir da crise alimentar de 2008; b) empresas financeiras que, na conjuntura atual, encontram vantagens comparativas na aquisição de terras; e c) empresas do setor agroindustrial que, devido ao alto nível de concentração do comércio e processamento, procuram expandir seus negócios.

    A sobrevalorização das terras agrícolas é uma tendência mundial e reflete em grande parte a escassez de áreas aptas bem como a demanda aquecida por commodities além do crescente investimento por parte de estrangeiros. Há uma tendência dos valores manterem-se aquecidos para os próximos anos. O Brasil tem um papel essencial no fornecimento de agroprodutos para o mundo e os preços das terras tupiniquins apenas espelham os olhos do mundo para o país. 
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