Ano novo, assuntos requentados

Edição XX | 01 - Jan . 2016

    No momento em que escrevo esse texto, estamos em meados de dezembro, 2016 está próximo, mas ainda não chegou. Procuro por assuntos interessantes, algo novo, que possa ser motivo de discussão. Até porque, sem isso um articulista não tem função. Lembro de muitos que poderiam gerar controvérsias, divergências opinativas, motivos para cutucar a turba, ensaiar uma prosa, mas incrivelmente não me ocorre nada original. Parece que tudo no ambiente do agronegócio tem cheiro de mofo e gosto de requente. Acho que estou perdendo o jeito de provocar.

    De qualquer sorte, início de ano sempre é momento de planejar o futuro, ter novas ideias, propor mudanças e metas novas. Mas até nisso está difícil. Primeiro, porque o agronegócio em si já é diferente. Na prática, boa parte das atividades impõem um ano diferente do civil. Logo, o planejamento tende a ocorrer mais para a frente, lá pela metade do ano, considerando o ano agrícola. De outro, o horizonte está nublado, fazendo com que os gestores carreguem muitas dúvidas consigo e apenas algumas certezas. E essas, por sua vez, não são muito animadoras neste momento, para a maioria.

    Dentre os assuntos que já abordei aqui em outros ensaios, dois estão de volta, agora rotineiramente no noticiário, ambos típicos de momentos de inflexão e de crise ou depressão econômica. O primeiro diz respeito ao aumento nos pedidos de recuperações judiciais (antiga concordata) de empresas, muitas delas antes tidas como sólidas e intocáveis pela crise que se avizinhava. O segundo, por seu turno, refere-se às fusões e aquisições entre empresas. Uma estratégia sempre utilizada para ganhar musculatura competitiva, mas que, com raras e honrosas exceções, é prática comum apenas nos elos a jusante ou a montante da atividade primária.

Recuperações Judiciais

    Como dito, este é um assunto farto e de crescente relevância no agronegócio, que há pouco tempo estava à margem dos mecanismos modernos de recuperação gerencial, dada a franca ocupação por produtores rurais, que, mesmo exercendo atividade empresarial, não possuíam registros nos órgãos competentes e desse modo eram relegados a pessoas físicas, sendo excluídos dessas opções.

    Percebe-se que a recuperação judicial num momento atinge determinado setor com maior intensidade, ora outro. Se falarmos do setor de biocombustíveis, por exemplo, veremos que está uma verdadeira terra arrasada, considerando o recente fechamento de 80 usinas e a recuperação judicial de outras 68 unidades. Dessas, poucas são capazes realmente de se recomporem, mesmo e principalmente com o cenário atual.

    Nesse campo, o centro-oeste sempre foi sinônimo de crescimento, pujança e liquidez. Mas em 2015 tivemos alguns momentos importantes e indeléveis para o agronegócio de grãos e fibras, principalmente, cujos reflexos negativos foram notáveis e sua extensão ainda não foi completamente contabilizada. 

    Dois em especial representam esse momento. Em final de agosto, o Grupo JPupin surpreendeu os mais incautos do mercado ao ingressar seu pedido de recuperação judicial, com dívidas declaradas de aproximadamente R$ 1 bilhão, motivado por um arrazoado de estratégias equivocadas de expansão e falta de austeridade gerencial. Um sem número de players foram direta ou indiretamente atingidos pela ação inevitável.

    Antes disso, outro grupo de notória e ilibada reputação, granjeada pelo crescimento horizontal e vertical recentes, sucumbiu e necessitou recorrer ao recurso jurídico-econômico para tentar recompor seu patrimônio e negócios. Desta feita, no início de julho, o Grupo Pinesso, um dos mais importantes produtores de grãos e fibras do país, também necessitou pedir recuperação judicial, com dívidas aproximadas de R$ 600 milhões.

    Foi nesse momento que acendeu o sinal amarelo em boa parte dos players do agronegócio e muitos outros grupos começaram a ser observados de soslaio, enviesado, de modo desconfiado. Particularmente, pelo fato de que estes dois grupos eram capitaneados por produtores que exerciam papel de líderes em seus segmentos, e mesmo assim não foram capazes de suportar o peso da competividade.

    Outros grupos e empresas individuais começaram a dar sinais de que o ambiente não estava bem. O nível de confiança despencou nas bancas de apostas e as negociações tomaram, em muitos casos, rumo beligerante. Em outros, foram tomadas medidas preventivas mais severas nas negociações de médio e longo prazos, algo que deveria ser parte rotineira num setor cujas empresas facilmente movimentam milhões e que possui dificuldades evidentes de controle do ambiente de negócio, motivado por variáveis de difícil equalização, como clima e câmbio, por exemplo.

Fusões e Aquisições

    As fusões e aquisições empresariais têm sido uma tendência mundial, patrocinada pela necessidade estratégica de ganhar mercado e melhorar a competitividade das empresas. Em tempos nebulosos como os que estamos vivenciando no nosso país ela se torna um recurso ainda mais relevante. Nessa esteira o movimento ora se inclina para o lado da integração vertical e ora para a horizontal, embora ambas estejam intimamente ligadas.

    Para finalizar o ano, tivemos uma mostra inconteste dessa tendência ao recebermos, em meados de dezembro, o anúncio de que a DuPont e a Dow Chemical Company estabeleceram uma fusão igualitária, criando uma nova companhia (DowDuPont) avaliada em US$ 130 bilhões. Pelo comunicado oficial, posteriormente ela será desmembrada em três grandes empresas independentes, com distintas e claras áreas de atuação, estrutura de capital e plano de investimento.

    Monsanto e Syngenta, por exemplo, estão em namoro faz um bom tempo. Mas as núpcias parecem demorar a acontecer. Há um conjunto de interesses que ainda não foram harmonizados, equalizados, e outros inclusive precificados. Mas há players no setor que dão o casamento como certo, mais cedo ou mais tarde. Assim, um novo (des)arranjo competitivo (algo em torno de US$ 45 bilhões) pode estar à vista no front.

    Temo apenas que nessa área o setor produtivo avançe muito lentamente. Em alguns momentos, parece, inclusive, que há retrocessos, permitindo que os demais setores avancem sobre os recursos sempre escassos das cadeias, utilizando essa estratégia e reduzindo rotineiramente a parcela do setor produtivo. Por isso, para finalizar, retomo aqui uma frase célebre sobre o elo mais fraco das cadeias no agronegócio, notadamente o dos produtores: na fartura não se juntam e na crise se separam. 

    Por fim, espero que possamos ter alento no ambiente político e econômico em 2016 e assim nossas esperanças sejam também renovadas e revigoradas no ano novo que se inicia. Tenhamos fé, energia e inteligência para enfrentar o que se apresentará.


Até a próxima.

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