A convenção da UPOV

Sistema Sui Generis de proteção de variedades de plantas

Edição V | 01 - Jan . 2001
Equipe SEEDnews-seednews@seednews.inf.br
    A POPULAÇÃO MUNDIAL CONTINUA A AUMENTAR A TAXAS DE CERCA DE 3% ANUAIS. APENAS PARA MANTER O ATUAL ESTADO NUTRICIONAL — EM MUITOS CASOS. INSUFICIENTE — SÃO EXIGIDOS TODOS OS ESFORÇOS PARA AUMENTAR A PRODUÇÃO AGRÍCOLA. AO MESMO TEMPO, EXISTE UMA NECESSIDADE DE MELHORAR A PRODUTIVIDADE AGRÍCOLA DE FORMA A RACIONALIZAR OS LIMITADOS RECURSOS NATURAIS E AUMENTAR O LUCRO DOS AGRICULTORES E DE SUAS FAMÍLIAS. NOVAS VARIEDADES DE PLANTAS COM RENDIMENTOS E QUALIDADE SUPERIORES E MAIOR RESISTÊNCIA A PRAGAS E DOENÇAS, EXIGINDO RELATIVAMENTE MENOR QUANTIDADE DE INSUMOS, SÃO UMA FERRAMENTA INDISPENSÁVEL PARA LIDAR COM ESTE DESAFIO. CERCA DE METADE DO CONSTANTE AUMENTO DO RENDIMENTO MÉDIO DO TRIGO DE INVERNO NA EUROPA OCIDENTAL, POR EXEMPLO, É ATRIBUÍDO AO EFEITO DE MELHORES VARIEDADES. A OUTRA META-DE É DEVIDA A OUTROS TIPOS DE PROGRESSO TECNOLÓGICO. 


    O desenvolvimento de novas variedades de plantas é demorado e caro. Os materiais vegetais frequentemente reproduzem a si próprios após a liberação para o mercado, privando o seu criador de uma oportunidade adequada de recuperar seu investimento em pesquisa e/ou manter um fundo para futuras pesquisas e desenvolvimento. Por esta razão, entre os interessados em encorajar a inovação nas plantas de lavoura, tem havido interesse em mecanismos para proteger a posição do obtentor, provendo-o com um alto grau de exclusividade em relação à produção e venda de sua inovação. 

    O Acordo TRIPS 
   A "Rodada Uruguaia" sob o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT), que cobriu numerosos tópicos, levou, em 1994, a um acordo intitulado "Aspectos da Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPS)." O Acordo TRIPS estabelece que os países que se tornam parte do grupo para a Organização Mundial do Comércio (W1-0) são compelidos a fornecer a proteção efetiva das variedades de plantas por patente ou por um sistema especial (sui generis) de proteção para variedades de plantas ou por uma combinação dos dois. 

    Patentes e Proteção de variedades de plantas 
    A Tabela 1 dá uma visão de importantes elementos e diferenças entre patentes e sistemas específicos de proteção de variedades de plantas. Enquanto vários aspectos da tecnologia utilizada no melhoramento das variedades de plantas podem ser protegidos por patentes ou sob leis que protegem a informação confidencial, muitas variedades de plantas são resultantes de programas de melhoramento que se dedicam a objetivos óbvios com tecnologia conhecida. Conseqüentemente, muitas variedades de plantas melhoradas falham em incluir um passo inventivo (ou em ser não-óbvio), de forma a serem qualificadas para proteção por patente. 
    O fato de que uma variedade de planta não inclui um passo inventivo não invalida sua utilidade econômica para a sociedade. É importante encorajar o desenvolvimento de, por exemplo, variedades de milho com melhor rendimento, resistência a doenças e qualidade, embora estes sejam objetivos óbvios de todos os melhoristas de milho. 
    
    O Impacto crescente do Sistema UPOV 
    Em novembro de 2000, existiam mais de 100 países no mundo que tinham adotado ou estavam prestes a adotar a proteção de variedades de plantas em um sistema especial; 46 deles eram membros da UPOV e haviam aderido à Convenção da UPOV, e cerca de 60 países tinham adotado leis sobre a proteção varietal ou estavam preparando tais leis. A Ata 1978 da Convenção da UPOV sob as leis de todos os países membros da UPOV que oferecem proteção especial para as variedades, um alcance mínimo de proteção é garantido com base nos critérios especificados na Convenção da UPOV, que incluem distinção de outras variedades conhecidas, uniformidade e estabilidade. À variedade deve também ser dado um nome de acordo com regras estabelecidas, o qual será sua designação genérica. 

OS BENEFÍCIOS A SEREM OBTIDOS A PARTIR DOS PROCEDIMENTOS DE SELEÇÃO EXISTENTES E AQUELES OBTIDOS A PARTIR DAS NOVAS BIOTECNOLOGIAS SÃO CUMULATIVOS. UM NÃO PODE SUBSTITUIR O OUTRO. 

    O objeto de proteção sob a Convenção é a variedade de planta protegida, e o alcance mínimo da proteção proporcionada pelos estados membros deve autorizar o possuidor do direito a proibir que outros, sem sua prévia autorização, produzam o material propagativo da variedade protegida para fins de comercialização, ofereçam tal material para venda ou comercializem-no, e que utilizem a variedade protegida para a produção comercial de uma outra variedade. 

    A Ata 1991 da Convenção da UPOV 
    A experiência em executar a Convenção por mais de 30 anos e os avanços técnicos e científicos que têm sido vivenciados neste mesmo período levaram à convocação de uma Conferência Diplomática para revisar a Convenção da UPOV em 1991. A nova Ata estabeleceu que esta não deveria entrar em vigor até que cinco países a tivessem ratificado ou viessem a aderir a ela. Isto entrou em vigor em 24 de abril de 1998. A Ata 1991 abriga somente países que tenham escolhido aderir a ela. Os países membros existentes somente se tornarão abrigados pela Ata 1991 quando tiverem modificado suas leis já existentes e depositado um instrumento de ratificação à nova Ata. 
    É princípio geral das discussões sobre propriedade intelectual que, quando uma nova Ata, melhorada, entre em vigor, a versão "antiga" fique encerrada para adesões posteriores. Este é o caso que ocorre com a Ata 1978 da Convenção da UPOV. Após 24 de abril de 1998,  não foi mais possível para um estado tornar-se um novo membro da UPOV com base na Ata 1978. Existe apenas uma exceção para três países, que já haviam iniciado o processo de adesão antes que a Ata 1991 entrasse em vigor.




    Principais Mudanças na Ata 1991 comparadas à Ata 1978 

    I. Espécies protegidas - A Ata 1991 requer que os países membros, após certo período de transição, protejam as variedades de todos gêneros e espécies de plantas. No futuro, se um melhorista inicia um programa com uma espécie totalmente nova, ele vai saber que quando finalmente produzir uma variedade, por cerca de um período de 10 ou 15 anos, esta estará protegida, o que nem sempre acontecia sob a Ata 1978. 
    2. O direito do melhorista em relação à produção do material propagativo - Sob a Ata 1978, o direito mínimo do melhorista em relação à produção do material reprodutivo estende-se somente à produção para propósitos de comercialização do material. Isto apresenta o que alguns podem considerar como sendo a vantagem de que produtores de culturas, tais como trigo e soja, possam guardar suas próprias sementes em uma base tradicional, sem infringir o direito do melhorista. Por outro lado, pode existir a desvantagem de que a pessoa, plantando um pomar, ou outra plantação, possa comprar uma planta que ele propaga para plantar um pomar ou plantação inteira, sem nenhuma obrigação para com o melhorista, quanto ao material propagado. O potencial para este tipo de abuso aumentou consideravelmente com o advento da moderna cultura de tecidos. Plantas de hortaliças híbridas F1 podem agora, por exemplo, ser propagadas dentro de uma unidade de produção hortícola sem pagar ao melhorista por suprimentos posteriores de sementes, e partes da planta podem ser multiplicadas em um fermentador industrial. Parece claro que atividades deste tipo deveriam requerer a autorização do melhorista e não estar relacionadas ao tradicional fato de guardar a semente.
   Portanto, na Ata 1991, o alcance mínimo do direito do melhorista foi redefinido de forma a estender-se a toda produção de material propagativo. Uma vez que isto tem o efeito de eliminar a exceção da semente guardada para uso próprio e desde que alguma isenção deste tipo parece ser uma necessidade política em muitos países, é permitido aos países, "dentro de limites razoáveis e sujeito às salvaguardas dos interesses legítimos do melhorista", excluir a semente guardada pelo produtor do direito do melhorista. Espera-se que a maioria dos países venham a considerar cuidadosamente a aplicação desta provisão, de forma a limitar a aplicação de qualquer exclusão a umas poucas culturas, nas quais guardar as sementes tem sido uma característica importante. 
    3. Extensão do direito do melhorista ao material colhido - Sob a Ata 1978, a proteção mínima ao melhorista normalmente estende-se somente ao material propagativo da variedade. Isto tem a desvantagem de que, no caso, por exemplo, de uma variedade melhorada para produzir flores de corte, o material propagativo da variedade possa ser levado para um país onde não exista proteção disponível e lá utilizado para produzir um produto final, neste caso flores de corte, que são exportadas para países onde a variedade seja protegida. Em muitos casos, o melhorista não pode fazer nada para impedir esta prática. 
    Conseqüentemente, na Ata 1991, o alcance do direito do melhorista estende-se ao material colhido da variedade protegida, incluindo plantas inteiras e partes de plantas, se (a) elas são obtidas por meio de um uso não autorizado do material propagativo da variedade protegida, e (b) a menos que o melhorista tenha tido oportunidade razoável de exercitar seu direito em relação ao dito material propagativo. 
    A primeira condição é autoexplicativa e a segunda resulta da relutância de alguns estados membros da UPOV em deixar o melhorista livre para escolher se ele irá exercer seus direitos em relação. por exemplo (no caso do trigo), à semente ou ao grão.







    4. Derivação essencial - Sob a Ata 1978, qualquer variedade é sujeita à proteção, a qual seja claramente distinguível, na época da aplicação, por uma ou mais importantes características de outras variedades comumente conhecidas, e qualquer variedade protegida pode ser livremente utilizada como uma fonte inicial de variação, com o propósito de criação de outras variedades. Estas duas características, tomadas conjuntamente, criam uma situação na qual uma variedade protegida existente pode ser utilizada como uma fonte de variação inicial, e uma variedade selecionada a partir daí pode ser livremente explorada, porque fez a seleção livre de qualquer obrigação com o melhorista da variedade protegida, estabelecido que a seleção seja claramente distinguível da variedade protegida por uma ou mais importantes características. Uma vez que a palavra "importante" neste contexto foi utilizada para significar "importante para os propósitos de fazer uma distinção" e não "importante no sentido de ter valor", isto significa que uma pessoa, selecionando um mutante ou um variante secundário de uma variedade existente, ou inserindo nela um gene adicional através de retrocruzamento ou algum outro procedimento, pode proteger a variedade resultante sem recompensar o melhorista original por sua contribuição para o resultado final. Exemplos típicos são a seleção de uma cor mutante de uma variedade ornamental, a inserção de um único gene em uma linha de milho, através de retrocruzamento (sob as condições favoráveis dos trópicos, múltiplos retrocruzamentos podem ser realizados em um ano), e mais recentemente, a inserção de um único gene através da engenharia genética. 
    O fato de que a Ata 1978 não permite que o melhorista impeça este tipo de melhoramento tem sido criticado como injusto pelos círculos industriais, e a Ata 1991 procura remediar a situação introduzindo o princípio da "derivação essencial", que estabelece que uma variedade que é essencialmente derivada de uma variedade protegida não pode ser explorada sem a autorização do melhorista desta variedade. Uma variedade é considerada como essencialmente derivada de uma outra ("a variedade inicial"), para este propósito, quando: "(a) é predominantemente derivada da variedade inicial ou de uma variedade que é, ela mesma, predominantemente derivada da variedade inicial enquanto retendo a expressão das características essenciais que resultam do genótipo ou da combinação de genótipos da variedade inicial; (b) é claramente distinguível da variedade inicial; (c) exceto pelas diferenças que resultam do ato de derivação, ela é igual à variedade inicial na expressão das características essenciais que resultam do genótipo ou combinação de genótipos da variedade inicial." 
    A Ata fornece uma lista de exemplos de atos que podem resultar em derivação essencial, incluindo a seleção de um mutante natural ou induzido, ou de um variante somaclonal, a seleção de um variante individual a partir de plantas de uma variedade inicial, retrocruzamento, ou transformação por engenharia genética. 
    Não é considerado que uma determinação respectiva à derivação essencial de uma variedade será feita através de um órgão de exame como parte do procedimento de concessão, mas preferencialmente que a questão será resolvida entre os melhoristas de plantas por meio de acordos ou, em último caso, através de litígio. 
    A existência do novo princípio deveria assegurar, no futuro, que aqueles que trabalham como inovadores no campo vegetal chegarão a um acordo antes de conduzirem um programa de atividades que poderia resultar em variedades essencialmente derivadas das variedades protegidas. Espera-se que; na grande maioria dos casos, sejam feitos acordos amigáveis entre melhoristas de plantas e/ou biotecnologistas. Se um melhorista de plantas insere um gene, recaindo nas reivindicações de uma invenção relativa à informação genética (um "gene patenteado") dentro de sua variedade, a variedade resultante poderia cair dentro do alcance da patente, possibilitando ao proprietário da patente proibir a exploração da variedade. Se, por outro lado, o possuidor da patente insere o gene patenteado dentro da mesma variedade, o melhorista da variedade não tinha, com base na Ata 1978, nenhuma possibilidade de proibir a exploração da variedade modificada. Atualmente, se o possuidor da patente de um gene inserir seu gene patenteado em uma variedade protegida, existe a possibilidade de que a variedade modificada seja essencialmente derivada e caia' dentro do alcance da proteção da variedade protegida. Vários exemplos mostram claramente que o novo balanço estabelecido entre os dois sistemas facilita, desta forma, a troca de tecnologia, entre melhoristas de plantas e biotecnologistas. 
    Os melhoristas de plantas e biotecnologistas são aqui descritos como se desempenhassem atividades fundamentalmente separadas. A UPOV está bem consciente de que suas atividades podem ser desempenhadas em uma única organização ou por uma única pessoa, mas ainda ajuda, ocasionalmente, para os presentes objetivos, falar das duas atividades separadamente. 
    Deve-se observar que não existe sugestão, no texto da provisão de derivação essencial, que o melhorista de uma variedade essencialmente derivada deva ser capaz de obrigar o melhorista da variedade inicial de conceder uma licença através de algum procedimento compulsório de licenças. Esta possibilidade foi considerada e rejeitada no decorrer do processo de revisão. 5. Proteção dupla - Diferentemente da Ata I978, a Ata 1991 silencia sobre a forma do direito do melhorista. Esta pode tomar a forma de um direito especial sui generis do melhorista, ou pode ser chamado de uma "patente", ou dada qualquer outra designação que tenha a mínima substância pela Convenção. A Ata 1991 igualmente não inclui nenhuma provisão correspondente à chamada "proibição da proteção dupla", da Ata 1978, de forma que um participante do contrato é, com relação à Ata 1991, livre para proteger variedades, além de conceder o direito do melhorista, através da concessão de outros títulos, particularmente patentes. Um país membro exercendo esta liberdade para conceder patentes, em adição ao direito do melhorista, é livre para decidir se um candidato deve escolher entre um direito de melhorista e uma patente. Isto é, se ele candidata-se para uma, não pode candidatar-se para a outra, ou se ele pode candidatar-se e ter concedida ambas — o direito de melhorista e a patente. Se, para uma determinada variedade, a proteção cumulativa deste tipo é obtida, a resolução de qualquer conflito entre os dois tipos de proteção é deixada para a legislação e tribunais do país membro, onde os títulos foram obtidos, e não é regulado pela convenção.



    Patentes para Plantas
    A maioria dos países no mundo concede ou reconhece patentes para invenções que são novidades, industrialmente aplicáveis, não-óbvias e que são sujeitas à possibilidade de divulgação. Nos sistemas de muitos países existem diferenças significativas entre ambas, lei e prática, e particularmente no campo da tecnologia pelo qual as patentes são concedidas. Geralmente em alguns países, não somente pode haver dúvida com respeito à precisa proteção disponível para materiais vivos, mas em muitos casos variedades de plantas são expressamente excluídas da proteção. Isto não implica, contudo, que patentes para materiais vegetais sejam excluídas. 
    Um inovador realizando uma invenção no campo de plantas (digamos uma fonte de resistência a vírus) e obtendo sucesso na incorporação desta resistência em plantas individuais, pode, desde que satisfaça os critérios para patentes, candidatar-se a uma patente que reivindica as plantas resistentes. Desde que o inovador não reivindica uma variedade de planta ou não descreve suas plantas de forma a indicar que ele busca proteger plantas específicas (as quais são talvez distintas, uniformes e estáveis, de forma a constituir uma variedade), parece então provável que a ele será concedida uma patente por sua inovação. 
    Muitas das mais importantes características das plantas cultivadas, tais como rendimento, são o resultado da interação entre um grande número de genes. Melhorias em tais características podem somente ser obtidas por meio de técnicas de melhoramento de plantas, envolvendo seleção dentro de grandes populações. As técnicas da biotecnologia moderna são primariamente dirigidas a genes individuais, ou a muito poucos genes, porém oferecem possibilidades aos melhoristas de plantas que não existiam anteriormente. Tais tecnologias superam as barreiras naturais entre espécies, possibilitando que caracteres de interesse sejam transferidos entre espécies (ou entre ambos os reinos, animal e vegetal) e oferecendo formas sofisticadas de aumentar a precisão da seleção por melhoristas, e de reduzir o período de tempo necessário para desenvolver novas variedades de plantas. Contudo, em um futuro próximo, parece improvável as novas tecnologias serem substituídas pelos procedimentos de seleção utilizados pelos melhoristas de plantas para muitos caracteres de importância econômica. 
    Os benefícios a serem obtidos a partir dos procedimentos de seleção existentes e aqueles obtidos a partir das novas biotecnologias são cumulativos. Um não pode substituir o outro. É desejável que existam sistemas de incentivo para ambos — as novas biotecnologias e os resultados do melhoramento de plantas. Devem ser criados ou mantidos sistemas de proteção especialmente designados para variedades de plantas, os quais são complementares à proteção por patentes para invenções biotecnológicas. 
    
    Resumo da palestra proferida por Rolf Jördens no XVII Seminário Panamericano de Sementes 


Compartilhar