O aumento na produção de grãos ao longo dos últimos anos, entre outros fatores, é resultado de um conjunto de ações voltadas ao desenvolvimento de técnicas de manejo de plantas e de lavouras, assim como de cultivares mais adaptadas e produtivas, do uso mais apropriado, racional e eficiente de fertilizantes, das técnicas e dos produtos voltados ao manejo fitossanitário e do emprego de insumos de alta qualidade. No contexto dos insumos, especialmente em plantas de lavouras produtoras de grãos, a qualidade da semente assume papel principal no estabelecimento de lavouras de alto teto produtivo.
A qualidade da semente é composta por atributos físicos, fisiológicos, genéticos e sanitários. Entre os atributos fisiológicos, o vigor merece destaque por se tratar da “força propulsora” que envolve aspectos celulares relacionados à eficiência de reorganização do sistema de membranas celulares, à metabolização, translocação e a utilização de reservas armazenadas com vistas à formação da nova planta. De modo geral, quanto maior a capacidade na realização destes processos, maior é o vigor e assim o desempenho da nova planta.
O vigor se relaciona a uma série de eventos fisiológicos celulares, envolvidos em respostas diferenciais da semente sob distintas condições ocorrentes nos campos de produção, os quais refletem na performance fisiológica e produtiva da lavoura. Sem sombra de dúvida, este atributo da qualidade mantém estreita relação ao desenvolvimento da planta matriz e ao processo de maturação das sementes, assim como é influenciado de forma muito relevante por procedimentos e condições adotados na pós-colheita.
Durante o desenvolvimento das plantas no campo de produção, fatores bióticos e abióticos podem exercer ação marcante de forma direta ou indireta sobre a qualidade das sementes. As ações indiretas são aquelas que afetam a planta matriz e, por consequência, modificam a qualidade da semente, a exemplo da pequena ou da excessiva área de folhas voltada à captação de radiação solar que é utilizada para a manutenção estrutural da própria planta, o crescimento e a síntese de reservas em sementes, ou ainda, devido à queda prematura e/ou a própria sanidade das folhas e a inadequada nutrição mineral.
Em contraste, ações diretas são aquelas em que o ambiente de produção não afeta necessariamente a planta matriz, mas atua sobre a semente, a exemplo do ataque de sementes por percevejos, ocorrência de chuva e/ou flutuação de temperatura e umidade relativa do ar em associação ao retardamento da colheita das sementes. Ações diretas também podem ser verificadas em pós-colheita devido a ocorrência de modificações deletérias sobre atributos físicos e/ou fisiológicos, a exemplo do dano térmico durante a secagem, dano mecânico durante o beneficiamento ou mesmo da condição desfavorável de armazenamento das sementes, o qual pode ser muito quente, seco, demasiadamente úmido ou apresentar oscilações de temperatura e umidade.
Tanto as ações diretas quanto as indiretas modificam a qualidade da semente em termos de vigor conforme a intensidade de ocorrência, número de exposições ao estresse ou mesmo de acordo com o período de duração. Condições de exposição mais severas ao estresse refletem no aumento do nível de deterioração das sementes, atuando negativamente sobre sua performance fisiológica e na capacidade de formação de uma nova planta, com desempenho produtivo superior.
Uma vez que alguns dos atributos físicos e/ou fisiológicos podem ser modificados antes da maturidade fisiológica e que o adequado desenvolvimento da planta matriz possui influência na qualidade das suas sementes, pode-se evidenciar que a deterioração e sua ação deletéria sobre o vigor podem ser verificados antes mesmo do ponto de maturidade fisiológica. Obviamente, lotes compostos por sementes com menores padrões de qualidade tendem a apresentar superior variabilidade no vigor individual entre sementes que compõe o conjunto, resultando, em campo, na maior quantidade de plantas “dominadas” em relação àquelas “dominantes”, distanciando-se então dos altos tetos produtivos potenciais.
Entre outros fatores, a obtenção de menores tetos produtivos se deve a menor eficiência fisiológica destas plantas dominadas em se estabelecer e aproveitar os recursos do campo de produção comparativamente às demais, atuando negativamente sobre a produção. Por outro lado, em lotes mais uniformes e de alta qualidade, ocorre a formação de maior número de plantas de alta performance com superior capacidade de aproveitamento dos recursos da lavoura, a qual mantém mais alta a média produtiva por unidade de área.
As sementes com vigor superior evidenciam maior capacidade de disponibilização, mobilização e utilização de reservas, resultando na formação de plantas de alta performance e na “construção” de lavouras altamente produtivas. A ação do vigor é notória em algumas culturas, como a soja, que, por exemplo, pode incrementar seu rendimento em até 25% ao se empregar sementes de alta qualidade.
É importante salientar que a capacidade de ramificação pode influenciar na produção da soja, assim como o perfilhamento pode exercer ação sobre o desempenho produtivo das lavouras de trigo. Contudo, a capacidade de perfilhamento ou de ramificação é dependente da cultivar, tornando-se interessante, em alguns casos, sua associação com emprego de sementes de alto vigor. Em culturas que não ramificam ou perfilham, como é o caso do milho, o vigor se torna ainda mais importante, visando a uniformidade de crescimento e desenvolvimento das diferentes plantas, cada qual uma unidade produtiva que colabora para a média produtiva da lavoura.
Embora os benefícios da utilização de sementes de alto vigor tenham sido testados e comprovados para soja, no cultivo de algumas gramíneas a exemplo do trigo, acreditava-se que o vigor da semente exercesse menor influência positiva sobre a produtividade, isso devido a sua capacidade de perfilhamento. Contudo, trabalhos recentes demonstram que sementes de alto vigor resultam, conforme a cultivar, em incremento superior a 10% na produtividade.
Observa-se em trigo o rendimento na casa de 5.842 kg/ha quando as plantas são originadas de sementes de alto vigor, em contraste a 5.160 kg ha-1 quando as plantas são originadas de sementes de baixo vigor. Contudo, o que torna uma planta formada por sementes de alto vigor mais eficiente comparativamente a uma planta originada de sementes de baixo vigor?
Entre as diferentes explicações cabíveis para explicar a maior produtividade de plantas originadas de sementes de alto vigor está a sua maior taxa de crescimento da cultura, também conhecida como taxa de produção de matéria seca. Esta determinação de cunho ecofisiológico indica que sementes de alto vigor produzem plantas com maior capacidade de produção de matéria seca por unidade de área e de tempo, ou seja, resultam em plantas “mais velozes” e que demandam menor tempo para atingirem o máximo crescimento.
Neste contexto, considerando o ponto de vista de que a expressão do vigor da semente é observada principalmente em “condições adversas” de ambiente de cultivo e que este importante atributo da qualidade pode exercer influência positiva sobre o rendimento das culturas, algumas questões precisam de resposta. Será que a utilização de sementes de alto vigor, tanto em condições adequadas quanto inadequadas de estabelecimento inicial e de manejo da lavoura, resulta em maior produtividade? Será que o alto nível de vigor consegue manter a maior produtividade estável em qualquer situação de semeadura?
O desempenho da planta em campo mantém relação à qualidade da semente utilizada na semeadura, à genética e também ao ambiente disponível na lavoura, podendo assim expressar seu máximo desempenho de crescimento e de potencial produtivo. Um exemplo interessante da influência do vigor em sementes ocorre na cultura da soja, que em condições adequadas de cultivo, na densidade correta de semeadura e com o emprego de sementes de alta performance, pode atingir cerca de 5.520 kg/ha, contrastando a 4.105 kg/ha quando se faz uso de sementes de baixo vigor. Esta ocorrência demonstra o aumento de produtividade na casa de 25,6% ao empregar sementes de alta performance.
É importante destacar que as boas práticas de semeadura são primordiais no cultivo de plantas de lavoura e que devem ser utilizadas em conjunto às sementes de alto vigor. Tanto é verdade que, na ocorrência de apenas uma falha na linha de semeadura, a diferença de produtividade entre o cultivo de soja formado por sementes de alto vigor comparativamente àquelas de baixo vigor é de 13,8%, ou seja, há uma perda produtiva de 46% em relação ao cultivo que adota o uso associado de sementes de alto vigor e o número adequado de sementes/plantas por metro linear.
Além disso, ao elevar o nível para duas falhas na linha de semeadura, as plantas formadas por sementes de alto vigor, embora ainda consigam atingir a produção 9,4% maior, comparativamente àquelas de sementes de baixo vigor, ocorre comparativamente à situação adequada de semeadura, a redução produtiva acentuada na ordem de 63%.
Tanto sob semeadura adequada e sem falhas na linha quanto em condição de presença de falhas na linha de semeadura, o alto vigor resulta em plantas mais produtivas. Contudo, para estas plantas, a ocorrência de três falhas na linha de semeadura em comparação a sua ausência, resulta na redução absoluta de 24% na produtividade.
É interessante salientar que o aumento do número de falhas na linha de semeadura resulta em menor quantidade de plantas por metro linear e que sua ação negativa se torna mais marcante à medida que a situação de distribuição de sementes se distancia do recomendado pelas boas práticas de produção agrícola. Frente a isso, a planta de soja não é tão plástica quanto se acredita, não ramifica e também não ocupa o espaço disponível de forma eficiente, a ponto de compensar problemas de qualidade da semente e de semeadura.
As sementes com vigor superior evidenciam maior capacidade de disponibilização, mobilização e utilização de reservas, resultando na formação de plantas de alta performance e na “construção” de lavouras altamente produtivas. A ação do vigor é notória em algumas culturas, como a soja, que, por exemplo, pode incrementar seu rendimento em até 25% ao se empregar sementes de alta qualidade
O emprego de sementes de alto vigor assume maior visibilidade quando as práticas de semeadura e de condução do campo de produção são as mais adequadas. A adequada estrutura e preparo do solo, a disposição das sementes na profundidade adequada e a adoção de velocidades de semeadura menores, proporciona a melhor distribuição das sementes na linha de semeadura. Em associação ao uso de sementes de alto vigor, evita-se o problema de falhas na linha de semeadura e/ou a ocorrência de sementes em posições muito próximas (“sementes duplas ou triplas”), refletindo no melhor arranjo espacial entre plantas, na maior capacidade competitiva por água, minerais e luminosidade, e na redução do efeito planta dominante-dominada. Plantas que competem menos entre si economizam energia e exploram melhor os recursos disponíveis na lavoura.
E, sim, a obtenção de lavouras de alto teto produtivo é possível pelo uso associado do vigor das sementes às boas práticas de semeadura e condução da lavoura! Contudo, não espere que o “uso isolado” de sementes de alto vigor proporcione a formação, nada é construído isoladamente. Como o alicerce que sustenta a casa é constituído por diferentes materiais e sua qualidade influencia na durabilidade da moradia, a construção da lavoura é reflexo do uso de sementes de alta performance em associação ao conjunto composto por boas práticas de manejo e de produção, uso racional das tecnologias, olhar crítico sobre o ambiente de produção e a planta, mas, sobretudo, é resultado do capricho e dedicação ao cultivo.