Reflexões durante a jardinagem II

Edição V | 04 - Jul . 2001
James Delouche-JCDelouche@aol.com
Propagação das plantas
    Uma das minhas reflexões, enquanto cuido do jardim, é o porque de algumas espécies se propagarem por sementes e outras por meio de órgãos vegetativos. Na natureza, as sementes apresentam diversas vantagens para sobrevivência e dispersão das espécies. As sementes são o produto de um processo sexual que garante a variação genética da população para produzir variações que podem resultar em indivíduos melhor adaptados às condições existentes. 
    As vantagens mais significativas que as sementes apresentam sobre os propágulos são o seu pequeno tamanho e a longevidade, que facilitam seu transporte através de grandes distâncias e o armazenamento por períodos longos, sua relativa isenção de doenças, sua resistência à dessecação e a parcela relativamente pequena do produto colhido que é necessária para a propagação do próximo cultivo. A principal vantagem da propagação vegetativa é a estabilidade genética. 
Influência do clima 
    O clima tem sido determinante do método de propagação. Muitas espécies propagadas por sementes originaram-se em regiões que apresentam estações específicas de crescimento durante o ciclo anual, como um resultado das mudanças da estação de temperaturas altas para a de temperaturas baixas, ou de períodos úmidos para secos. Sementes que sofrem dessecação após a maturação, isto é, as chamadas sementes ortodoxas, armazenam bem durante o intervalo entre as condições mais frias e/ou mais secas entre o final de um período de crescimento e o início do próximo. Elas não são prejudicadas por temperaturas extremamente baixas ou por intensa seca. Muitos tipos de propágulos, contudo, não sobrevivem a tais condições extremas. Por outro lado, muitas das culturas propagadas vegetativamente originaram-se, ou são utilizadas extensivamente, nos trópicos úmidos. As sementes da maioria dos cultivos de grãos são de vida curta em climas quentes e úmidos, perdendo a viabilidade durante o período de pós-maturação. Em Java, por exemplo, onde a soja pode ser cultivada em qualquer época do ano, existe um sistema para o suprimento de sementes, no qual cada vez que um agricultor deseja realizar a semeadura, ele apenas procura por um campo que tenha sido recém colhido e obtém as sementes novas de que necessita. Este método elimina praticamente a armazenagem das sementes. O arroz é a exceção mais óbvia a estas generalizações que relacionam o método de propagação ao clima. O arroz é o principal cultivo nos trópicos quentes e úmidos porque a semente mantém satisfatoriamente a viabilidade sob tais condições.

As sementes são o produto de um processo 
sexual que garante a variação genética da 
população para produzir variações que podem 
resultar em indivíduos melhor adaptados às 
condições existentes.




Qual método de propagação evoluiu primeiro? 

    Considerando a importância do processo sexual na manutenção da variação genética da população para a evolução das espécies, é razoável presumir-se que a propagação por sementes foi o primeiro e mais conveniente método de propagação na evolução das plantas superiores. Na ausência do processo sexual, a evolução poderia ter sido severamente limitada pela baixa freqüência de mutações que pudessem produzir variantes melhor adaptados. Uma especulação mais interessante é se as “primeiras” sementes foram do tipo e fisiologia daquelas que mais conhecemos, ou de tipo e fisiologia diferentes, talvez sementes recalcitrantes
    As sementes da maioria das espécies cultivadas são chamadas de sementes ortodoxas, não somente tolerando a dessecação, como também aumentando sua longevidade e resistência a condições extremas à medida que seu grau de umidade diminui. Sementes recalcitrantes, por outro lado, são de vida curta e perdem sua viabilidade quando seu grau de umidade é reduzido abaixo de um nível crítico, sendo igualmente muito mais sensíveis às condições ambientais, especialmente à temperatura. São características de várias espécies tropicais, como seringueira, cacaueiro e mangueira, entre outras. Sementes recalcitrantes desligam-se da planta-mãe e são dispersas após sua maturação. Uma vez que as condições nos trópicos são quase sempre adequadas à germinação e crescimento das plântulas, não existe a necessidade de dessecação para que a viabilidade seja prolongada em períodos desfavoráveis. 
    Se a evolução das plantas superiores tivesse iniciado nos climas mais quentes e úmidos, as sementes recalcitrantes poderiam ter sido as progenitoras de ambos – sementes ortodoxas e propágulos vegetativos. Os mecanismos de tolerância à dessecação poderiam ter evoluído em espécies com sementes recalcitrantes como uma adaptação para sobrevivência, em resposta a uma mudança climática de tropical-úmido para quentes e úmidos com um período seco distinto durante o ano, ou como uma adaptação para expansão das espécies para ambientes com climas úmido-seco e quente-frio. A propagação vegetativa poderia ter se desenvolvido como um tipo de substituto para o caráter recalcitrante em resposta a condições climáticas uniformes, livres dos estresses ambientais que parecem ter sido tão importantes para a evolução de plantas e animais.
    Refleti durante toda esta temporada de jardinagem no Mississippi, até próximo à exaustão. Assim, esperem mais informações e menos reflexões em ensaios futuros!
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