Sementes também Morrem

Parte III

Edição VI | 05 - Set . 2002
James Delouche-JCDelouche@aol.com
    O ensaio da edição anterior terminou com uma pergunta desafiadora, realizada em 1965 por J.G. Streeter: “Por que uma semente não danificada, não atacada por microorganismos e armazenada em ambiente favorável, perde sua capacidade de germinar?”. Streeter enquadrou a pergunta com premissas que a focalizaram sobre mecanismos biológicos e bioquímicos fundamentais. Estas premissas - sem danificação mecânica, sem microorganismos e sob boas condições de armazenagem - excluem, como respostas para a questão, a maioria das “causas” geralmente aceitas da morte das sementes. Enquanto esta visão é satisfatória para alguns, ela não o é para analistas e técnicos responsáveis pela garantia e controle da qualidade das sementes para comercialização. A garantia de qualidade na indústria de sementes deve lidar com muitos fatores “externos” que atuam sobre sistemas “internos” essenciais envolvidos no envelhecimento e morte das sementes.

Causas externas da morte das sementes 
    As tarefas fundamentais na garantia e no controle da qualidade das sementes são a preservação da pureza genética da cultivar e a manutenção da germinação e vigor. A última, que é o assunto deste ensaio, é obtida por meio da manutenção da condição da semente e da prevenção ou redução, até níveis economicamente viáveis, da exposição das mesmas a eventos e situações que resultem na perda da germinação e vigor. 
    O teor de umidade da semente e a temperatura são críticos para manutenção de sua germinação e vigor. Eles são reduzidos a níveis “seguros” realizando-se a colheita na hora certa, com uma secagem rápida e adequada, e aeração. Colheita, transporte, manuseio e acondicionamento são eventos que podem resultar em grandes reduções na germinação, vigor e potencial de armazenamento das sementes. Estas operações, na maioria dos cultivos produzidos comercialmente, são mecanizadas, devendo ser realizadas com muito cuidado a fim de evitar danos às sementes devido às forças mecânicas envolvidas. 
    As condições climáticas durante o período em que as sementes permanecem no campo para reduzir seu conteúdo de umidade até um nível adequado para a colheita, estão entre os determinantes da qualidade mais importantes. A produção e colheita devem ser realizadas de forma a minimizar a exposição das sementes a chuva, elevada umidade e alta temperatura. Identificar as condições, eventos e situações que determinam a germinação e vigor das sementes e indicar procedimentos para manter a condição da semente, controlar os eventos e evitar as situações é fácil, porém, a aplicação dos procedimentos indicados é um grande desafio para os responsáveis pela manutenção da qualidade das sementes.

A produção e a colheita devem ser realizadas de forma a minimizar a exposição das sementes à chuva, umidade e temperatura elevadas.



Causas internas do envelhecimento e morte das sementes 
    Agora é hora de voltar à pergunta de Streeter: por que as sementes morrem mesmo sob boas condições? Uma das respostas mais antigas e conhecidas para esta pergunta é aquela que diz que ocorre a exaustão das reservas nutritivas da semente. Esta idéia, provavelmente, foi gerada pelas observações de que sementes mostrando grande perda de peso ou apodrecimento, morriam. O que contradiz esta teoria é que sementes morrem sem perda de peso ou sem apresentar mudanças visíveis na aparência. Uma teoria alternativa, mais plausível apesar de ainda não provada, é a de que as sementes morrem porque acontece uma mudança na disponibilidade das reservas nutritivas, e não sua exaustão. Já foi proposto que em sementes com teores de umidade relativamente altos, a morte é causada por falta de nutrientes em determinadas partes da semente. Nestas partes, a umidade alta resulta em uma elevada taxa de respiração que, se não é alta o suficiente para sustentar a mobilização das reservas nutritivas, consome o substrato disponível, resultando na falta de nutrientes e morte do tecido.
    Estudos recentes comprovaram que proteínas são degradadas e mudam de diversas outras maneiras durante o envelhecimento das sementes. Portanto, o fator importante no envelhecimento das sementes poderia ser a perda da capacidade de preservar, ativar e sintetizar enzimas e proteínas estruturais. 
    As duas teorias para explicar a morte das sementes que apresentam maior fundamentação são a do dano genético e a da disfunção da membrana celular.  A associação de danos genéticos com o envelhecimento e morte das sementes já está bem estabelecida, contudo o dano genético pode ser mais uma conseqüência do que a causa da deterioração.
    A teoria da disfunção das membranas para a morte das sementes baseia-se em que problemas na reorganização das membranas durante a rehidratação ou durante o armazenamento resultam no envelhecimento e morte das sementes. Acredita-se que o principal mecanismo é a peroxidação dos lipídios com liberação de radicais livres que danificam as membranas ou produzem substâncias tóxicas. Um problema aparentemente insolúvel quando pensamos em tentar evitar ou diminuir a velocidade do envelhecimento e morte das sementes é que elas perdem a capacidade de reparo celular e restauração que está operante em sementes com alta umidade. Considerando o que temos na literatura, é óbvio que ainda não existe uma resposta definitiva para a pergunta de Streeter...
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