Os desafios da semeadura

Edição XIX | 01 - Jan . 2015

    No processo produtivo de qualquer cultura, a semeadura constitui-se em um dos fatores fundamentais para o sucesso no estabelecimento e, posteriormente, na produtividade da lavoura. Em se tratando de Plantio Direto (PD), acentua-se sobremaneira a importância da semeadura, uma vez que se faz necessário cortar 100% da palhada existente na superfície do solo, caso contrário não será possível realizar a implantação da cultura.

    A semeadura de uma lavoura deve ser muito bem planejada, pois determina o início de um processo de cerca de 100-140 dias, que afetará todas as operações envolvidas, além de determinar as possibilidades de sucesso ou insucesso da lavoura. É importante destacar que é durante a semeadura que se define o potencial produtivo dos cultivos.

    A semeadura deve possibilitar o estabelecimento rápido e uniforme da população de plantas desejada. Para isso, a semeadora deve formar um ambiente propício para que a semente entre em íntimo contato com o solo, possibilitando a absorção de água, essencial para o início do processo de germinação, além de promover a dosagem apropriada de sementes para que se obtenha a população ideal de plantas/ha. 

    A densidade ótima de plantas é determinada pelas exigências da própria espécie considerada e por fatores ambientais que influenciam diretamente no desenvolvimento das plantas e, consequentemente, na produtividade final da lavoura. Sabe-se que culturas apresentam respostas diferentes à variação na população de plantas. Alguns autores afirmam que a cultura da soja, por exemplo, suporta variações de até 15% na densidade de semeadura, sem afetar o rendimento. Por outro lado, estudos mostram que a desuniformidade na distribuição espacial de plantas pode resultar em perdas de até 15% ou mais na cultura do milho; 35% ou mais na cultura do girassol e 10% ou mais na cultura da soja.


    

A importância da operação de semeadura pode ser analisada sob dois aspectos: financeiro e qualitativo. 

    Sob o aspecto financeiro, ressalta-se que é durante a operação de semeadura que são alocados grande parte dos custos de produção utilizados na condução de um cultivo. No caso da soja, 69,6% do total dos insumos utilizados na cultura são aplicados na semeadura; 41,9% da mão-de-obra necessária para conduzir a lavoura e 15,9% do custo operacional da lavoura; sendo assim, pode-se afirmar que 47,7% do custo total da lavoura de soja é alocado durante a operação de semeadura. No caso do milho, os custos alocados durante a semeadura chegam a 49,6% do custo total da lavoura. 

    Sob o aspecto qualitativo, deve-se considerar que a qualidade da semeadura sofre a interferência de vários fatores, dentre os quais, destacam-se:

- sementes: é evidente que a qualidade fisiológica das sementes deve ser considerada, pois essa característica expressa o potencial de produção da cultura, porém de nada adianta uma semente com excelente qualidade fisiológica se fisicamente deixa a desejar quanto às características físicas e morfológicas, apresentando-se com tamanhos e formas irregulares, comprometendo o desempenho da semeadora e impedindo a obtenção do stand desejado. 

- semeadora: as máquinas devem ter condições de realizar a semeadura nas mais variadas condições de solo e palhadas, com capacidade de cortar a palhada, abrir um sulco, distribuir sementes e fertilizantes em quantidades e em profundidades adequadas;

- velocidade de semeadura: a velocidade tem influência direta na qualidade da semeadura. Afeta diretamente a distribuição de sementes, a profundidade de deposição das sementes e o revolvimento do solo;

- cobertura do solo: o tipo, o volume e a distribuição sobre o solo têm influência sobre o desempenho da semeadora;

- condição do solo: o grau de umidade e as características físicas do solo (estrutura, densidade,...) afetam o desempenho da semeadora e o desenvolvimento da cultura.


    As semeadoras representam um importante papel dentro do processo de produção, pois a produtividade de uma cultura é afetada de modo significativo pelo estande de plantas, principalmente, pela variação da uniformidade de distribuição de sementes no sulco de semeadura.

    No caso específico da implantação das diferentes culturas sob o Sistema Plantio Direto (SPD), as semeadoras têm papel fundamental no desenvolvimento do processo, para tanto a máquina tem que efetuar cinco funções básicas:

1- CORTAR A PALHA 

    O corte da palha é realizado através de discos de corte. Os discos cortam a palha e abrem um sulco, sobre o qual os outros componentes trabalharão. Os mais utilizados são os lisos, com diâmetro entre 18” e 20”(polegadas). Quanto maior seu diâmetro, maior é a força necessária para que ele penetre no solo, em razão da sua maior área de contato. No entanto, têm a vantagem de passar sobre a vegetação e apresentar menores problemas de embuchamento. 

    O corte da palha está relacionado com as condições do solo, da palha e da semeadora. Para o adequado corte, o solo deve ser um anteparo à ação do disco de corte e as coberturas devem estar verdes ou secas, já que aquelas que se encontram murchas apresentam maior resistência ao corte. 

2- ABRIR UM SULCO

    A abertura de sulcos é realizada através dos sulcadores, que podem ser discos duplos ou hastes (facão).

    A utilização de hastes é recomendada para condições de solos mais pesados, argilosos e que apresentam camada superficial compactada, como é o caso de áreas de pastagens.

    A maior profundidade de trabalho das hastes em relação aos discos duplos causa mobilização mais intensa de solo e exige maior esforço de tração e potência dos tratores. 

    Na semeadura com hastes, em função da maior profundidade de trabalho, os efeitos da deficiência de água para germinação e emergência de plantas são menores durante veranicos. Assim, a implantação de uma lavoura com semeadora com discos duplos apresenta muitos riscos nos solos com textura muito argilosa, pois, devido à grande resistência destes solos, os discos não conseguem aprofundar e as sementes são depositadas à baixa profundidade e muito próximas do fertilizante. 



3- DISTRIBUIR SEMENTES 

    Os distribuidores de sementes das máquinas de precisão têm como função individualizar as sementes para distribuí-las uma a uma.

    Os mecanismos distribuidores de sementes mais frequentes são os discos alveolados e os pneumáticos. O tipo de dosador utilizado, além de afetar a distribuição de sementes, pode interferir na qualidade de semeadura.

    Na maioria das semeadoras de precisão brasileiras, a dosagem de sementes é realizada por discos horizontais alveolados, que têm a função de capturar, individualizar, dosar e liberar as sementes.


    A utilização dos sistemas pneumáticos para a distribuição de sementes grandes tem aumentado consideravelmente em todas as regiões produtivas do país.  Esse fato pode ser creditado às vantagens que o sistema oferece, que mesmo apresentando um custo maior no momento da aquisição da máquina, a relação custo/benefício é favorável ao agricultor, considerando os ganhos obtidos. Dentre as principais vantagens desse sistema, pode-se destacar:

- grande capacidade de individualizar as sementes;

- capacidade de distribuir sementes de formatos irregulares com maior precisão;
- melhor adaptação aos mais variados tipos e formatos de sementes;
- redução na ocorrência de falhas e duplos;
- melhor uniformização no espaçamento entre sementes;
- redução de danos mecânicos nas sementes.

    O funcionamento do sistema pneumático é bastante simples onde uma turbina gera o fluxo de ar – sucção – que sustenta as sementes nos furos do disco. Em determinado momento, o fluxo de ar é interrompido e a semente é então direcionada ao tubo condutor de sementes seguindo até o solo. 
    A população de plantas é um dos fatores mais importantes para a obtenção de melhores resultados na produtividade das culturas. Alguns pesquisadores afirmam que, no caso do milho, a população de plantas é responsável por 85% da produção de grãos. Pequenas variações na população têm grande influência no rendimento final da lavoura. O stand de plantas inadequado é a principal causa pela baixa produtividade de milho no Brasil. 
    O rendimento de uma lavoura se eleva com o aumento da densidade de semeadura, até atingir uma densidade ótima, que é determinada pela cultivar e por condições externas resultantes das condições edafoclimáticas do local e do manejo da lavoura. A partir da densidade ótima, quando o rendimento é máximo, o aumento da densidade resultará em decréscimo progressivo na produtividade da lavoura. A densidade ótima é, portanto, variável para cada situação, sendo basicamente dependente de três fatores:

- cultivar, 
- disponibilidade de água, e
- nutrientes. 

    A importância da população de plantas pode ser medida através do efeito causado pela falta de uma única planta em 5 metros, em uma lavoura de milho estabelecida com 5 sementes/metro:
    Mesmo atingindo o número desejado de sementes por metro, se a semente não for distribuída de maneira uniforme tanto em profundidade (uniformidade de germinação) quanto na linha de semeadura, o potencial de rendimento desta lavoura já estará comprometido.
    A qualidade da distribuição das sementes no solo pode ser medida através dos espaçamentos entre sementes. Os percentuais de espaçamentos aceitáveis, duplos e falhas determinam o índice de plantabilidade da semente que está sendo utilizada, para tanto deve-se seguir a seguinte regra:

    Ao medir a distância entre as sementes, obtém-se o percentual de falhas e de duplas. Porém, não é possível mensurar as sementes que simplesmente foram deslocadas durante o processo de semeadura. Por este motivo, existe uma maneira mais adequada de determinar a uniformidade, que é através da utilização do coeficiente de variação (CV). Quanto maior for este coeficiente, maior é a variação da distância entre plantas.

Semeadora foi eficiente no corte da palhada

    A prática tem demonstrado que o percentual de CV aceitável seria de até 25% (Milho) e que, a cada 10% de CV, mesmo obtendo a população de plantas desejada, há uma redução no rendimento de aproximadamente 128 kg/ha. Levantamentos a campo realizados por algumas instituições de ensino e pesquisa mostram que, em média, o percentual de CV das lavouras está acima dos 30% e podendo, em alguns casos, ser maior que 60%. 
    A uniformidade de espaçamento entre as plantas distribuídas tem influência na produtividade das culturas. Plantas distribuídas de forma desuniforme implicam em aproveitamento ineficiente dos recursos disponíveis, como luz, água e nutrientes. No caso da soja, o acúmulo de plantas em alguns pontos pode provocar o desenvolvimento de plantas mais altas, menos ramificadas, com menor produção individual, diâmetro de haste reduzido, e, portanto, mais propensas ao acamamento. Por outro lado, espaços vazios deixados na linha, além de facilitar o desenvolvimento de plantas daninhas, levam ao estabelecimento de plantas de soja com porte reduzido. 
    Na operação de semeadura, o estande adequado e a uniformidade de distribuição de sementes podem ser afetados por inúmeras variáveis, sendo a velocidade de semeadura uma das mais importantes.


    Pode-se afirmar que em todos os sistemas de semeadura conhecidos, a qualidade da semeadura diminui quando se aumenta a velocidade de trabalho. Independente de a máquina estar equipada com dosador do tipo disco alveolado ou pneumático, ambas as semeadoras são sensíveis ao aumento da velocidade de trabalho, a ponto de afetar consideravelmente, não somente a população final de plantas, bem como os espaçamentos entre as sementes, aumentando consideravelmente o CV.
    Observa-se que, independentemente do tipo de semeadora, a velocidade de semeadura influencia diretamente na uniformidade de plantio, com efeito maior na semeadora a disco a partir da velocidade de 6 km/h.
    Os fabricantes têm estabelecido limites de velocidades, os quais devem ser respeitados, pois esses limites são aqueles em que a máquina irá apresentar melhor desempenho de todas as suas funções. Os limites estabelecidos são:

- milho: 4-6 km/h;
- soja/feijão: 6-8 km/h;
- trigo, aveia, cevada...: 6-8 km/h.

    A velocidade de trabalho interfere na capacidade de individualização das sementes, conforme segue: em uma semeadura de milho com 5 sem/metro, a uma velocidade de 6 km/h, a máquina tem que distribuir 8,3 sementes/segundo. Já em uma semeadura de soja com 15 sem/metro, na velocidade de 6 km/h, a máquina tem que distribuir 25 sementes/segundo. Alguns agricultores, em função de critérios particulares, realizam a semeadura a velocidades que podem chegar a até 12 km/h. Nesse caso, a máquina terá que distribuir 50 sementes/segundo, portanto é praticamente inconcebível ‘exigir’ que a máquina distribua uniformemente todas as sementes. 
    Além de diminuir a capacidade de individualização das sementes, as mesmas quando são liberadas do mecanismo dosador, adquirem, em queda livre, um componente vertical de velocidade por causa da aceleração da gravidade, e um componente horizontal decorrente da velocidade de avanço da semeadora. O componente horizontal faz com que as sementes sofram vibrações – repiques – dentro do tubo condutor, alterando o tempo de queda livre das sementes até o solo e, como consequência, altera o espaçamento entre as mesmas. Além disso, alta velocidade de trabalho faz com que as sementes rolem e/ou saltem para fora do sulco no momento do impacto com o solo. É sempre desejável que o componente horizontal seja minimizado para que as sementes sejam depositadas regularmente no sulco.

4 - CONTROLAR A PROFUNDIDADE DE SEMEADURA
    A profundidade de semeadura é um dos fatores que mais influencia na uniformidade de emergência das plântulas. Sementes depositadas mais profundamente possuem, geralmente, emergência mais lenta do que aquelas colocadas mais próximas da superfície, sob condições favoráveis de umidade no solo.
    Na semeadora, o controle da profundidade é realizado através das rodas limitadoras de profundidade. Estas rodas são acopladas próximas ao sulcador de semente, permitindo ajustes para diferentes profundidades de operação de acordo com a condição de semeadura. 
    A correta profundidade das sementes deverá ser verificada no campo, com a máquina em operação. A profundidade de semeadura deverá variar com as condições de clima e de solo. Em condições que dificultem a emergência das plantas, a profundidade de semeadura deverá ser menor. Por outro lado, quando as condições forem favoráveis à germinação e à emergência, a semeadura poderá ser mais profunda, se beneficiando de melhores condições de umidade do solo. 


    Plantas com emergência tardia são dominadas e produzem poucos grãos ou nem chegam a produzir. Há uma compensação por parte das plantas que emergiram primeiro, porém essa não é suficiente para proporcionar rendimento de grãos semelhante ao de uma comunidade com emergência uniforme. No caso de altas densidades, essa tendência se acentua devido ao aumento da competição intra-específica, que causa mais dificuldades às plantas com emergência tardia. O fato é que plantas atrasadas não conseguem ‘competir’ com as plantas mais ‘velhas’ resultando em perdas de produtividade.
    Desta forma, no caso do milho, a emergência desuniforme pode ocasionar quatro tipos de prejuízos aos produtores: 

- redução no rendimento de grãos;
- variação no grau de umidade dos grãos na colheita (plantas com emergência tardia são de desenvolvimento mais lento, o que se reflete em grãos com maior umidade na colheita, aumentando os danos mecânicos aos mesmos na colheita e os custos de secagem); 
- aumento de perdas na colheita (plantas com emergência tardia produzem espigas menores, o que dificulta o ajuste das colhedoras e aumenta as perdas de colheita); e 
- maior acamamento (plantas com emergência tardia produzem colmos mais finos, com menos raízes adventícias aéreas, o que aumenta o acamamento).

    Além da profundidade de semeadura, é importante considerar a posição relativa sementes/fertilizante. O aumento da produtividade de algumas culturas não depende somente da quantidade e do método de aplicação, mas também da localização do fertilizante. O fertilizante deve ser depositado no solo abaixo e/ou ao lado da semente. Sementes nunca devem estar em contato com fertilizante. 


5 - FECHAR O SULCO / COBRIR A SEMENTE
    Na abertura e fechamento do sulco de semeadura pode haver a formação de bolsões de ar. A redução desses bolsões favorece os ambientes térmico e hídrico e o acondicionamento físico do solo ao redor das sementes. O aumento do contato solo/semente diminui o tempo para a germinação.
    As sementes devem estar em íntimo contato com as partículas do solo para que absorvam água. 
    Em geral, as rodas compactadoras mais utilizadas e que apresentam melhores resultados são aquelas em formato de “V”. Estas pressionam o solo lateralmente, sem ocasionar selamento superficial quando se trabalha com solos com maior teor de água ou quando ocorrem precipitações logo após a semeadura. A compactação não é realizada diretamente sobre as sementes, porém lateralmente, deixando o solo sobre as sementes solto, facilitando a emergência das plântulas.
    O sucesso no desenvolvimento de uma cultura, bem como sua produtividade, depende, em parte, do ambiente do solo em torno da semente, na ocasião da semeadura. Os principais fatores físicos desse ambiente, temperatura, umidade e aeração, são diretamente influenciados pelas condições encontradas, pelo tipo de solo e pela profundidade de semeadura.

Comentário Final
    Atualmente, as sementes carregam uma “carga” tecnológica muito grande, portanto de nada adianta adquirir a ‘melhor’ semente se no momento de distribuí-las no solo, as mesmas forem “maltratadas”. 
    A semeadora é o equipamento mais importante para o sucesso do plantio direto. Além da distribuição uniforme das sementes e sua colocação adequada no sulco para garantir a germinação, a semeadora sob plantio direto desempenha as funções de cortar a palha e romper o solo na linha de semeadura.


    A utilização de máquinas e equipamentos agrícolas, quando feita de maneira correta, melhora a eficiência operacional e aumenta a capacidade efetiva de trabalho, facilitando assim as tarefas dos agricultores. Além do mais, possibilita a expansão das áreas de semeadura, proporciona melhores produtividades e permite atender ao cronograma de atividades em um tempo hábil. 



    Existem duas grandes maneiras de aperfeiçoar o estabelecimento de culturas. Em primeiro lugar, produtores e comerciantes de sementes têm a responsabilidade de fornecer sementes de qualidade; em segundo, selecionar e monitorar a maquinaria agrícola, especialmente as semeadoras, para que atendam as necessidades agronômicas das culturas.
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