Promovendo os benefícios da semente de alta qualidade

Edição XX | 02 - Mar . 2016
Silmar Teichert Peske-silmar@seednews.inf.br
Geri Eduardo Meneghello-gmeneghello@gmail.com
Francisco Amaral Villela-francisco.villela@ufpel.edu.br

    Neste verão, houve centenas de dias de campo promovidos pelos produtores de sementes de soja, no Brasil, nos quais foram mostrados produtos, processos e equipamentos. A novidade foi a presença de parcelas de demonstração evidenciando os benefícios do uso de sementes de alta qualidade. Isto é uma tendência recente, pois levou alguns anos para que os avanços tecnológicos, criados e desenvolvidos na academia, fossem ratificados na fazenda do agricultor. A variedade continua com sua grande importância referente a resistências, adequação ambiental, ciclo, potencial de produtividade, entre outros aspectos hereditários. Entretanto, não havendo a utilização de uma semente de alta qualidade, a produtividade é afetada negativamente, podendo alcançar mais de 30%, cuja magnitude é alta para qualquer análise que se deseje realizar. O agricultor já constatou isso.

    Os dias de campo demonstraram os efeitos positivos do vigor sobre a produtividade onde o agricultor pode visualizar comparativamente as plantas obtidas com sementes de baixo vigor e as plantas obtidas com sementes de alto vigor e, junto das parcelas, os estudos científicos desenvolvidos. Alguns produtores de sementes também instalaram áreas de 50ha ou mais, para melhor ilustrar as implicações da qualidade da semente. Isto foi uma constante no país inteiro. 

    Determinados produtores de sementes estão indo diretamente na fazenda dos agricultores para mostrar os benefícios da semente de alta qualidade, colocando lado a lado as parcelas de campo obtidas com a semente comercial e com o grão que o agricultor guardou para utilizar como semente. Em mais de 80% dos casos, o material do agricultor apresenta menor desempenho. Neste caso, além da qualidade fisiológica, muitas vezes também aparecem misturas varietais no material do agricultor. A instalação de parcelas lado a lado permite demonstrar que o material do produtor de sementes é de elevada qualidade, não querendo dizer que o outro material sempre seja de qualidade inferior, porque pode eventualmente ser qualidade similar. 

    Outra demonstração foi o efeito de falhas no estande da soja, onde era marcada a falta de uma planta com uma bandeira indicativa. Até pouco tempo, o agricultor recebia a informação de que a planta de soja compensava a falta de plantas na linha, emitindo mais ramos. Entretanto, a pesquisa demonstrou que, realmente, as plantas de soja que estão na bordadura de uma falha emitem mais ramos e, potencialmente, produzem mais, embora não ocorra a compensação da produção de uma planta faltante. Conforme aumenta o número de falhas, diminui a produtividade por área e incrementa a produção das plantas que estão na bordadura da falha. A visualização pelos agricultores da consequência das falhas na população de plantas na produtividade da soja teve, sem dúvida, um grande impacto.

Desempenho de sementes de alto e baixo vigor na fazenda do agricultor

    Em relação às plantas duplas, juntamente com as falhas, mostradas nos dias de campo e parcelas demonstrativas, o problema é geralmente devido à operação de semeadura ao utilizar a semeadora com velocidade superior a 6 km/h.  Praticamente 50% do custo total de uma lavoura ocorre no momento da semeadura. Assim, atenção especial deve ser prestada a esta operação, passando pela conscientização do agricultor, que vendo o resultado de uma má distribuição de plantas ficará mais atento. Outra causa para a presença de plantas duplas é o uso de um lote de baixíssima qualidade, porque o agricultor, ao compensar a baixa germinação do lote, pelo aumento da quantidade de sementes utilizada, favorece o aparecimento de duplas e falhas na linha de semeadura.

Dia de campo ilustrando o desempenho de sementes de alto e baixo vigor

    Uma distribuição uniforme de plantas é essencial para maximizar a produtividade, pois isso é essencial para o eficiente aproveitamento da luminosidade (necessária para a fotossíntese), a nutrição das plantas e a umidade. Com má distribuição pode “faltar” luz, água e nutrientes em alguns locais (nas duplas) e “sobrar” em outros (nas falhas).
    Esta ação dos produtores de sementes em promover através de diferentes atributos os benefícios do uso de sementes de alta qualidade, principalmente em dias de campo, aumentará, com certeza, a demanda por este tão importante insumo. Neste sentido, a seguir serão comentados alguns avanços na ciência e tecnologia de sementes, os quais estão possibilitando a adoção destas ferramentas de difusão de tecnologia. Vale destacar que promover um produto e depois não conseguir entregá-lo causa grandes inconvenientes, como todos sabem.  



Colheita
    Em relação à produção de sementes, a grande constatação foi que o processo de maturação não é uniforme, visto que algumas sementes podem estar secas com umidade de 12%, enquanto outras, numa mesma planta, não tenham alcançado ainda o ponto de maturidade fisiológica, que no caso da soja é 50%. Este fato indica que se a colheita for realizada pretendendo que todas as sementes estejam com umidade de 12%, muitas estarão deterioradas de tanto esperar que as outras, com mais 50% de umidade, sequem até 12%. 
    Neste sentido, os estudos indicam que a adequada umidade de colheita ocorre no estádio que sementes de soja estão com a umidade de 18% (umidade média das sementes), momento que há poucas sementes deterioradas e não há muitas sementes verdes. Se as sementes apresentam esta umidade, é essencial a realização da secagem artificial.
    Em função da desigualdade da umidade das sementes e assim da necessidade da utilização de secagem artificial, os produtores de sementes investem em secadores de grande porte com capacidade de secagem de várias toneladas por dia, pois o período de colheita é relativamente curto e as sementes úmidas não podem esperar mais de 24 horas para o início da operação de secagem. Os secadores constituem-se num dos equipamentos mais dispendiosos de uma unidade de beneficiamento de sementes (UBS), entretanto são fundamentais para a obtenção de sementes de alta qualidade, em quantidade necessária para atender o planejado, com menor dependência das condições climáticas verificadas na época de colheita. É evidente que a tecnologia incrementa o custo da semente, mas é compensado pelo menor descarte de material e pela obtenção de maior quantidade de lotes de qualidade superior.

Desempenho na fazenda do agricultor

    Há regiões onde não chove durante o período da colheita, o que minimiza a deterioração de campo das sementes. Todavia, sendo o ambiente muito seco, as sementes de soja tendem a entrar em equilíbrio higroscópico com a umidade relativa do ar, alcançando muitas vezes umidade inferior a 10%. Com essa umidade, tornam-se altamente suscetíveis à danificação mecânica.
    Além do momento certo da colheita, para minimizar a deterioração de campo e colheita com umidade muito baixa, há o risco de danificação mecânica à semente, que em soja é alto.  Felizmente, a indústria colocou à disposição dos produtores de sementes colhedoras com mecanismo de debulha por fluxo axial, que praticamente não causam danos significativos à semente. Estudos recentes indicam que de cada duas sementes de soja danificadas mecanicamente, uma morre num prazo de até cinco meses. Até poucos anos atrás, era frequente a ocorrência de lotes de sementes com a incidência de danificação mecânica superior a 10%. Todavia, atualmente, com os avanços tecnológicos e de equipamentos, este percentual normalmente não excede a 5-6%.  

Resfriamento 
    Entre os fatores que afetam a conservação das sementes está o frio, que se conhece de longa data e é utilizado em bancos de germoplasma para armazenar as sementes por décadas. Em milho, o frio é utilizado em câmaras especiais para o armazenamento de sementes de um ano para outro. Entretanto, para soja, a utilização do resfriamento é recente, mesmo sendo a semente dessa leguminosa considerada de tempo de vida menor que a de milho.
    No Brasil, altas temperaturas são comuns em várias regiões durante o ano inteiro, e naquelas regiões em que faz “frio”, verifica-se que em 70% do ano a temperatura é superior a 20ºC. O Brasil é um país de clima essencialmente tropical, cuja temperatura afeta, no armazenamento convencional, a qualidade das sementes, e em especial a de soja. Esta constatação levou bastante tempo para ser aceita pelos produtores de sementes, pois inicialmente as tecnologias utilizadas para a produção de sementes de soja vieram de um país de clima temperado, cujas temperaturas podem alcançar índices negativos durante muitos dias por ano, particularmente no período de armazenamento.


    
    Desta maneira, em soja, o frio começou a ser empregado com o esfriamento a granel das sementes no armazenamento regulador de fluxo (nos silos), evoluindo para o esfriamento dinâmico no ensaque das sementes, pois as sementes sofrem aquecimento na passagem do armazenamento regulador de fluxo até o ensaque, passando por várias máquinas, como a de ar e peneiras, espiral, classificador e mesa de gravidade. Este esfriamento no ensaque é muito importante, pois o próximo local onde as sementes permanecerão é o armazenamento para a distribuição (venda), que, em geral, é em sacos. Mantidas em pilhas, as sementes oferecem resistência à passagem do ar entre elas, sendo assim necessário o esfriamento a granel antes, para que o ar passe entre todas as sementes, promovendo um esfriamento uniforme e rápido. Entretanto, mesmo assim, é essencial que as sementes sejam mantidas em armazém climatizado, provido de sistema de isolamento nas paredes e teto, para manter a temperatura baixa das sementes inferior a 16-180C ou 12-140C, dependendo das condições climáticas observadas no local, durante o período de armazenamento.
    Atualmente, os produtores de sementes estão atuando junto às revendas para que estas também coloquem as sementes em ambiente climatizado, pois o agricultor tende a retirá-las poucos dias antes da semeadura. Assim sendo, a semente pode permanecer na revenda algum tempo, podendo, inclusive, alcançar um mês, tempo este suficientemente grande para ocasionar sérios prejuízos à sua qualidade. 
    Uma preocupação do agricultor é o fato de não receber, eventualmente, a semente da variedade pretendida, na quantidade necessária e no momento oportuno. Em decorrência, muitas vezes, a semente é retirada da revenda antecipadamente ao momento de semeadura e armazenada na propriedade, em condições, não raras vezes, desfavoráveis, por período de tempo que pode atingir até três a quatro semanas. Esta ocorrência é preocupante porque a semente pode sofrer aceleração da redução de qualidade, especialmente se o vigor do lote não for elevado e a semente for mantida em ambiente com temperatura frequentemente superior a 350C. 
    A qualidade da semente não custa, ela vale. Neste sentido, os produtores de sementes investem em equipamentos, instalações e em energia elétrica, podendo oferecer de forma garantida sementes de alta qualidade, em quantidade.



Tratamento Industrial
    No momento em que for utilizada pelo agricultor, a semente deve ser de alta qualidade e ter elevado desempenho. Para isso, o tratamento das sementes com fungicidas, inseticidas, nematicidas, micro e macronutrientes, promotores de crescimento e polímeros é utilizado em larga escala no país. A aplicação destes produtos pode ser realizada na própria fazenda ou em centros de tratamento de sementes, cujo processo denomina-se de Tratamento Industrial de Sementes (TIS).
    O TIS apresenta uma série de vantagens no que se refere à cobertura da semente, uniformidade de dosagem, padronização de calda, segurança para os operadores e segurança ambiental. Por outro lado, a semente tratada, caso não seja vendida, deve ser descartada de forma especial, não podendo ser vendida como grão. Desta maneira, a semente colocada à venda apresenta alta qualidade e deve ser exaltada como tal, junto com o seu elevado desempenho proporcionado pelo TIS.
    Para que o TIS alcance resultados plenamente satisfatórios são necessárias três condições: uso de sementes de alta qualidade, emprego de produtos eficientes para o tratamento, e disponibilidade de tratadoras sofisticadas. Todas estas condições são atendidas pelos produtores de sementes, possibilitando ofertar aos agricultores lotes de sementes com baixíssimo risco de fracassos no estabelecimento de uma lavoura. Em termos de adoção do TIS, o país possui mais de 160 centros de tratamento de sementes, que, no ano de 2015, trataram praticamente 40% das sementes comerciais utilizadas pelos agricultores. Considerando uma taxa de utilização de sementes de soja de 60%, com uma densidade de semeadura de 0,06t.ha-1 em 32 milhões de hectares, isto significa que foram tratadas 460 mil toneladas de sementes ou 11,5 milhões de sacos de sementes de soja de 40kg. Isto já pode ser considerado alto e está apresentando crescimento em razão dos benefícios que o TIS proporciona.

Avaliação da Qualidade
    A qualidade das sementes deve ser obtida, mantida e avaliada. Para tanto, devem ser realizadas avaliações periódicas. Neste sentido, a grande evolução foi o desenvolvimento de testes de vigor para avaliação da qualidade fisiológica das sementes.


    O teste de germinação foi desenvolvido no século XIX e baseia-se no princípio de proporcionar as melhores condições para uma semente germinar, como substrato, temperatura e umidade, entre outras, sendo padronizado globalmente e servindo como referencial para o comércio de sementes. Por outro lado, os testes de vigor são bem mais recentes e servem principalmente para estimar o desempenho das sementes numa ampla faixa de condições ambientais. Apesar de as regras internacionais para análise de sementes já apresentarem a metodologia de alguns testes de vigor padronizados, estes ainda não foram internalizados nos países. Entretanto, os produtores de sementes já estão utilizando em larga escala os testes de vigor em seus programas internos de controle de qualidade, sendo o de envelhecimento acelerado e o de tetrazólio os mais utilizados.
    No Brasil, esta larga utilização dos testes de vigor resulta da pesquisa, tendo sido difundidos por meio de cursos de curta duração, organizados principalmente pela ABRATES, publicações e demonstrações em eventos. Merece registro a publicação de livros sobre fisiologia de sementes, como os de Popinigis, em 1985, e de Marcos Filho, em 2015; e de vigor de sementes, de Krzyzanowski, Vieira e França Neto, em 1999, que muito contribuíram para que o produtor de sementes se sentisse confiante na utilização desta excelente ferramenta para avaliar a qualidade de seus lotes de sementes.

Um bom estabelecimento inicial com sementes de alta qualidade


Rastreabilidade
    As ferramentas da informática disponíveis atualmente, a preços acessíveis, permitem que uma grande quantidade de dados possam ser facilmente analisados e interpretados.  O histórico completo de um lote de sementes pode ser obtido e acessado a longas distâncias. O agricultor pode obter informações de um determinado lote de sementes em sua fazenda momentos antes da semeadura. Estas informações podem ser sobre o local da produção, as características do solo em que a semente foi produzida, os testes aplicados na avaliação da qualidade da semente, condições de armazenamento, período de tempo que semente permaneceu após a saída da empresa produtora de sementes e a chegada na sua fazenda, entre outros.
    A rastreabilidade possibilitou que o agricultor soubesse mais sobre a sua semente. Desta forma, a difusão dos atributos da qualidade das sementes em dias de campo ratifica o que o produtor de sementes está adotando em seus processos para obtenção e manutenção da qualidade da semente. Os tempos mudaram para melhor e o agricultor agradece.

Outras considerações
    A produção de sementes de alta qualidade envolve vários outros aspectos, entretanto mais difíceis de demonstrar ao agricultor, como é o caso do isolamento dos campos de produção, para evitar a contaminação genética e as misturas varietais, o controle de doenças e insetos, a nutrição das plantas, entre outros.
    Também merece registro a iniciativa de alguns produtores em ofertar sementes com um padrão mínimo de germinação de 10 pontos percentuais acima do mínimo exigido para comercialização, que no caso de soja no Brasil é de 80%. Nesta mesma linha, também há produtores de sementes que garantem o estande adequado de plantas conforme a variedade, baseado no peso de mil sementes, germinação e vigor.
    Os produtores de sementes estão, há muito tempo, buscando atributos e processos para melhor atender o agricultor, como foi o caso da classificação das sementes de soja, que facilitou a semeadura ao informar na embalagem o número de sementes (200.000 sementes por saco, por exemplo) e o tamanho da embalagem, que atualmente, para soja, tem-se desde 25kg (sacos)  até uma tonelada (bigbags). Isto facilita a operação de semeadura, pois o tempo disponível é curto e esta deve ser realizada sem pressa, ou seja, a velocidade da semeadora tem um limite adequado.

Resumo
    Os avanços técnico-científicos na área de sementes, desenvolvidos na academia, foram ratificados em larga escala na fazenda do agricultor. Estes avanços, que podem interferir na produtividade da lavoura de soja, estão sendo promovidos com sucesso pelos produtores de sementes, principalmente, em dias de campo e na própria fazenda do agricultor.
    Os efeitos de alguns atributos ou processos são fáceis de serem demonstrados, outros nem tanto. Assim, os mais utilizados foram os efeitos de sementes de alto e baixo vigor, falhas, plantas duplas e o tratamento industrial de sementes. A base para estas três demonstrações são o domínio dos processos para obtenção e manutenção da qualidade das sementes. Os principais processos são a colheita das sementes no momento oportuno, o resfriamento das sementes em silos, em bigbags e em sacos, a conservação em armazém climatizado, a rastreabilidade, o tratamento industrial de sementes e a avaliação do vigor das sementes. Há outros procedimentos que também são importantes e utilizados pelos produtores de sementes, como o controle interno de qualidade, a certificação, controle de doenças e pragas, isolamento, entre outros. 
    O produtor de sementes sente-se seguro para ofertar sementes de alta qualidade em quantidade, levando a promover massivamente os benefícios do uso desta semente.
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