Os pulses, grãos secos de leguminosas como grão-de-bico, lentilha, ervilha e todos os tipos de feijões, são fontes importantes de proteína vegetal, ricos em fibras, minerais e vitaminas e, por isto, vêm ocupando papel de destaque nos debates sobre nutrição humana.
O ano de 2016 foi declarado pela ONU como o Ano Internacional dos Pulses, com implementação de ações de expansão do cultivo e incentivo de consumo. Neste grupo, vêm se destacando a lentilha e, principalmente, o grão-de-bico, considerado o carro-chefe dos pulses, com grande potencial para o cultivo de safrinha (ou segunda safra), nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul do país.
Pesquisas coordenadas pela Embrapa Hortaliças, juntamente com uma rede de parceiros, vêm colaborando para a expansão destas culturas e aumento da produção nacional, reduzindo as importações. Neste contexto, merecem destaque as cultivares adaptadas às nossas condições, altamente produtivas e com boa tolerância a doenças.
Com a expansão dos cultivos, a demanda por sementes também cresce. Portanto, pesquisas relacionadas à tecnologia de produção de sementes são importantes para que sementes de alta qualidade sejam disponibilizadas aos agricultores. Embora ainda existam muitos temas relevantes para o avanço do conhecimento, desenvolvimento tecnológico e fomento à produção comercial de sementes destas espécies, as principais pesquisas já realizadas serão destacadas a seguir.
As leguminosas pulses são plantas de crescimento indeterminado, com maturação desuniforme das sementes. Assim, estudos relacionados ao processo de desenvolvimento e maturação das sementes são importantes para caracterizar a maturidade fisiológica e o ponto em que a germinação e o vigor são máximos.
Neste sentido, foram avaliadas as principais alterações anatômicas, histoquímicas, fisiológicas e bioquímicas nas sementes de grão-de-bico e lentilha durante a maturação. Foram colhidas vagens em diferentes estádios de maturação, conforme a sua coloração externa, definindo-se que sementes de grão-de-bico atingem o conteúdo máximo de matéria seca (maturidade fisiológica) quando as vagens estão amarelas. Já a máxima qualidade fisiológica foi constatada em sementes obtidas de vagens com coloração amarela, amarelo-dourado e marrom, sendo mantidas até três meses de armazenamento sob condições não controladas de ambiente. Aos seis meses de armazenamento já ocorre redução na germinação e no vigor.
Em lentilha, estudo semelhante permitiu constatar maior vigor e potencial de armazenamento para sementes obtidas de vagens amarelas, quando comparadas às de vagens verdes e marrons.
O momento em que a colheita das sementes é realizada tem efeito significativo no seu desempenho e potencial de conservação. Colheita precoce pode acarretar grande proporção de sementes imaturas. Por outro lado, a permanência das sementes no campo por tempo além do necessário poderá causar sérios prejuízos à sua qualidade fisiológica e sanitária, além de risco de abertura das vagens.
Sementes de grão-de-bico foram colhidas em diferentes estádios fenológicos da cultura: R11 (50% das vagens na coloração amarelo-dourado), R11.5 (75% das vagens na coloração amarelo-dourado), R12 (90% das vagens maduras e com coloração amarelo-dourado) e R12 + 7 (7 dias após o estádio R12, já com desfolha da planta). As sementes estão prontas para a colheita quando 90% das hastes e vagens perdem a cor verde e apresentam coloração amarelo dourado.
Vale destacar que o crescimento indeterminado das plantas gera uma sobreposição das fases vegetativa e reprodutiva, sendo encontradas, em uma mesma planta, vagens em diferentes estádios de maturação. Assim, a aplicação de herbicidas dessecantes em pré-colheita pode se constituir em alternativa interessante para promover rápida secagem das vagens e sementes, uniformizando a maturação e contribuindo para maior eficiência da colheita mecanizada.
Todavia, o conhecimento do tipo de produto a ser utilizado e a época mais adequada para a sua aplicação são de suma importância, pois os dessecantes apresentam diferentes modos de ação, podendo afetar a qualidade das sementes após a colheita ou após determinado período de armazenamento.
No Brasil, não existem registros de produtos no MAPA para a dessecação em pré-colheita de sementes e/ou grãos de grão-de-bico. Trata-se, portanto, de tema relevante para a cultura no país e que foi avaliado em experimento conduzido na UFV em 2019.
Herbicidas dessecantes foram aplicados em diferentes estádios fenológicos da cultura, permitindo concluir que a aplicação do Diquat resultou em maior qualidade fisiológica das sementes e, dependendo da época de aplicação, permitiu antecipar a colheita em até 14 dias. Os herbicidas Flumioxazin e Saflufenacil não afetaram a qualidade das sementes, enquanto Glyphosate e Amonio-glufosinate foram prejudiciais, tanto para as sementes recém-colhidas como armazenadas por três meses, com maior ocorrência de plântulas anormais, principalmente com o uso do Glyphosate.
Pesquisas relacionadas com a época de semeadura e colheita de grão-de-bico no norte de Minas Gerais indicaram que a região tem potencial para o cultivo e produção de sementes em sistema irrigado, com destaque para a semeadura realizada em maio. Com o atraso no plantio, a ocorrência de chuvas por ocasião da colheita compromete a qualidade das sementes.
Em experimentos realizados em diferentes localidades da região, maior produtividade e melhor qualidade fisiológica de sementes foram obtidas em locais de maior altitude. O efeito de diferentes densidades de plantio sobre características agronômicas e qualidade fisiológica das sementes de grão-de-bico foi avaliado em estudo conduzido em Brasília, observando-se resposta diferenciada dos genótipos à população de plantas.
Informações sobre o armazenamento das sementes visando conhecer o seu comportamento até a semeadura em campo na próxima safra também são primordiais. Assim, monitorar as alterações fisiológicas, bioquímicas e sanitárias durante o armazenamento de sementes de grão-de-bico acondicionadas em embalagem de papel e plástico, sob diferentes condições foi fundamental para definir estratégias adequadas para a sua conservação.
Por se tratar de uma espécie ortodoxa, constatou-se o esperado, ou seja, a câmara fria a 10º C é mais eficiente para a conservação das sementes, independente da embalagem utilizada. Contudo, o armazenamento em ambiente refrigerado a 20 ºC também é benéfico, principalmente para períodos acima de seis meses, uma vez que em ambiente não controlado e embalagem porosa, que é a condição mais utilizada pelos produtores, há redução da qualidade fisiológica e sanitária a partir do sexto mês.
Tais informações são úteis para que o setor produtivo possa adotar estratégias mais adequadas, dependendo do período planejado para a armazenagem das sementes.
A classificação e o beneficiamento das sementes também são temas relevantes. Em grão-de-bico, sementes de menor tamanho (peneira 7 mm) têm menor germinação e vigor em relação às de peneiras 8, 9 e 10 mm. Para o beneficiamento, recomenda-se a máquina de ar e peneiras, seguida pela mesa de gravidade.
Todos estes estudos só foram possíveis porque metodologias adequadas para a avaliação do potencial fisiológico das sementes foram definidas pela pesquisa realizada em diferentes instituições do país. Destacam-se os testes de tetrazólio, envelhecimento acelerado, condutividade elétrica e análise computadorizada de plântulas em sementes de grão-de-bico e de lentilha. Há estudos iniciais também com o teste de raios-X e espectroscopia no infravermelho próximo.
As pesquisas relatadas são relativamente recentes e foram desenvolvidas principalmente na Universidade Federal de Viçosa, Universidade Federal de Brasília, Instituto Federal Goiano (campus Urutaí) e Universidade Federal de Minas Gerais (campus Montes Claros) em parceria com a Embrapa Hortaliças.
Espera-se que os resultados obtidos, além de serem relevantes para o setor produtivo, sejam referência para outros estudos na área de tecnologia de sementes, trazendo contribuição significativa para a consolidação dos pulses, especialmente o grão-de-bico, como alternativas interessantes para a diversificação de cultivos no Brasil.
Espera-se também maior aprimoramento da tecnologia de produção destas sementes no país, principalmente quanto à organização do sistema formal de produção de sementes junto ao MAPA, pois é importante aumentar o número de produtores de sementes credenciados para incrementar a produção e atender o mercado interno.
Vale ressaltar que a maioria das pesquisas com grão-de-bico aqui citadas foram conduzidas com cutivares do tipo kabuli, mais aceito no país, cujas sementes são de coloração bege e formato de “cabeça de carneiro”, com tegumento fino e liso. Há também o tipo desi, que possui sementes coloridas e tegumento mais espesso, mais consumido no mundo na forma de farinhas e grãos partidos.
A Embrapa Hortaliças vem trabalhando para colocar no mercado cultivares deste tipo, para cultivos visando o mercado externo. Vislumbra-se, portanto, não apenas oportunidades de negócios e exportação, como também de pesquisas com estes novos materiais.