Processo de Resfriamento de Sementes

Edição XIII | 03 - Mai . 2009
Francisco Ayala Barreto-ayala@coolseed.com.br

    O resfriamento artificial de sementes a granel surgiu no Brasil como resposta a uma demanda por soluções na armazenagem. Foi preciso uma longa jornada, do desenvolvimento à comprovação da eficiência e dos benefícios da tecnologia.

    Na década dos anos 80 e meados dos anos 90, surgiram em toda a América do Sul esforços para o resfriamento artificial de sementes com equipamentos estáticos e móveis, alguns fabricados no Brasil e outros importados da Europa. No entanto, estes esforços não tiveram os resultados esperados ou tiveram resultados tímidos e, com isto, a técnica de resfriamento artificial não avançou.

    Posteriormente, no início desta década, surgiu uma nova proposta sob o ponto de vista de engenharia eletromecânica, porém fundamentado nos mesmos princípios, no que tange aos benefícios do resfriamento de sementes: manter a germinação e vigor das sementes durante a armazenagem.

    De um modo geral, as principais empresas produtoras de sementes de soja, no Brasil, estavam localizadas em altitudes acima de 600 m.s.n.m.,  motivadas pelo clima mais favorável no campo e temperaturas mais amenas para a armazenagem.

    As empresas produtoras acreditavam que não havia necessidade do resfriamento artificial, pois no seu entender a temperatura da massa de sementes abaixava naturalmente durante a armazenagem.

    Foram necessários vários anos de pesquisa e observação para entender que as sementes de soja, mesmo em grandes altitudes e clima mais ameno, estavam sendo ensacadas a temperaturas não apropriadas para uma boa armazenagem. As variedades mais precoces, ao serem colhidas em pleno verão, apresentavam temperaturas ainda mais elevadas no momento do ensaque.

    O setor vinha experimentando perdas financeiras e problemas de relacionamento com os seus clientes, em virtude de problemas de viabilidade no momento da semeadura, o que não poucas vezes levava ao descumprimento de contratos.


    O sistema passou a se tornar pouco eficiente, para um setor cada vez mais exigente por qualidade, e era necessária maior quantidade de matéria-prima em virtude das perdas durante a armazenagem. As incertezas de poder contar ou não com determinada variedade no final da armazenagem tiravam o sono de muitos produtores.

    Assim sendo, podemos afirmar que, apesar dos enormes esforços técnicos e financeiros em todas as etapas de produção de sementes, parte deste trabalho se perdia durante a armazenagem, pois as sementes preservavam sua alta temperatura por longo tempo, devido a sua baixa condutividade térmica (que as caracteriza como maus condutores de calor). Portanto, a técnica de armazenagem utilizada propiciava condições para a ação de fungos e insetos e a degradação das qualidades físico-químicas e fisiológicas das sementes.
    Superada esta fase, de comprovação das perdas e suas causas, surgiu a questão de como e onde resfriar as sementes, com que custo e por quanto tempo manteriam sua baixa temperatura depois de ensacadas.
    A técnica de resfriamento até então conhecida era o denominado sistema estático, que se fundamentava no resfriamento de sementes em pilhas ou em silos com o produto em repouso. No entanto, de um modo geral, as estruturas das Unidades de Beneficiamento de Sementes (UBS) não possuíam silos para armazenagem a granel e, portanto, não apresentavam condições de aplicação da tecnologia, enquanto na pilha havia problemas de uniformidade da passagem do ar frio pelas sementes. 
    Assim, foi desenvolvido, pelo departamento técnico da Cool Seed, um novo sistema que se adaptou a esta realidade e foi denominado RESFRIAMENTO ARTIFICIAL DINÂMICO DE SEMENTES, com base no Método de Mínimo Tempo de Exposição - MMTE. Acabava de nascer uma nova solução para a armazenagem de sementes.
    Após vários testes e estudos, foi definido o ponto para o resfriamento durante o fluxo de beneficiamento e criadas as metodologias para dimensionamento dos equipamentos frigoríficos e da respectiva estação de resfriamento.
    Testes indicaram grande perda de temperatura nas mesas de gravidade, onde as sementes são submetidas a grandes fluxos de ar à temperatura ambiente, pelo que se descartou a possibilidade de resfriamento antes das referidas mesas. Ficou comprovado que o melhor momento para resfriar as sementes é no ensaque, após o beneficiamento. 
    Finalmente, restava apenas uma última dúvida: por quanto tempo as sementes mantêm sua temperatura após resfriadas? Isto é, como se comporta a Estabilidade Térmica das sementes durante a armazenagem em armazéns convencionais não climatizados? 
    Foram necessários mais alguns anos de pesquisa para a confirmação científica do comportamento da temperatura dentro do bloco de sementes, armazenadas à temperatura ambiente, após resfriadas artificialmente.
    Graças ao trabalho de pesquisa e apoio científico dos melhores especialistas e empresas do setor, hoje o resfriamento artificial se consolidou como importante alternativa para a solução dos problemas de armazenagem de sementes. Fica difícil imaginar, na atualidade, uma nova UBS sem esta tecnologia, em qualquer país de clima tropical ou subtropical.
    Após este breve resumo da história recente do resfriamento artificial, iremos abordar os seus diversos aspectos, de modo a elucidar melhor o seu funcionamento e os procedimentos para assegurar o máximo benefício do sistema.


    Resfriamento artificial estático
    Consiste na insuflação de ar frio através da massa de sementes, armazenadas em silos. O ar frio é conduzido utilizando o sistema de aeração, por meio da movimentação mecânica do ar proveniente do ventilador centrífugo do equipamento resfriador.
    Ao atingir a temperatura desejada na massa de sementes, suspende-se o processo e, dependendo das condições climáticas e da estrutura, a temperatura do produto se manterá estável por vários meses, até o seu ensaque e expedição.
    Este sistema é normalmente aplicado em unidades com alta capacidade estática de recebimento a granel, para remover as altas temperaturas da colheita (como sistema de pré-resfriamento); posteriormente, no ensaque, deve-se tornar a resfriar.

    Resfriamento artificial dinâmico
    É a técnica amplamente utilizada, em todos os países produtores da América do Sul, para a conservação de sementes.
    A semente é resfriada no seu movimento descendente por ação da gravidade em silos projetados para esta finalidade. O ar frio é conduzido em sentido contracorrente com o fluxo do produto.
    É aplicado em UBS após o beneficiamento e no momento do ensaque.
    O sistema deve ser dimensionado de maneira a não retardar a produção da UBS e deve assegurar bom perfil de temperatura da massa de sementes na pilha.
    Este processo não altera a umidade inicial da semente, não ocasiona choque térmico e não há condensação de vapor de água na superfície das mesmas, pois o ar insuflado é frio e seco.
    A capacidade dos equipamentos para resfriamento dinâmico está na ordem de 3 a 30 t/h de produto resfriado, para uma diferença térmica de 15oC entre a temperatura de entrada e saída do produto. Fluxos maiores são possíveis com a associação em paralelo de um ou mais equipamentos.
    O consumo de energia elétrica é muito baixo, praticamente desprezível, e está na ordem de 0,20 kWh ou R$ 6 centavos por saco de 40 Kg.


    Estabilidade térmica
    A condução de calor em uma massa de sementes é um fenômeno físico complexo.
    A semente tem baixa condutividade térmica e as trocas de calor ocorrem por condução, de grão a grão e ar intergranular, lentamente.
    Qualquer volume de sementes pode ser resfriado para 15 - 18oC e armazenado em sacolões ou em sacas por vários meses, com mínima perda da germinação e vigor.
    É importante lembrar que quanto maior a pilha de sementes e quanto menor a abertura ou espaço entre as bolsas, melhor será a estabilidade térmica.
    Com base nestes princípios, podemos afirmar que na armazenagem de sementes pelo sistema convencional (ar ambiente), os produtos mais suscetíveis à perda de germinação e vigor são aqueles que estão mais próximos ao centro, onde as temperaturas elevadas se mantêm por mais tempo. No entanto, no caso do resfriamento não existe esta possibilidade, pois o perfil de temperatura se mantém baixo e uniforme ao longo dos meses de armazenagem e as sementes que menos sofrem a ação da variação da temperatura são aquelas localizadas no centro da pilha.
    As normas para amostragem e certificação das sementes limitam o tamanho das pilhas, mas é possível, respeitando as normas vigentes, incorporar procedimentos simples que assegurem boa estabilidade térmica na pilha. Estas normas futuramente deveriam ser revistas à luz das novas tecnologias.



    Temperatura na colheita
   A temperatura e a umidade do produto na colheita são as principais causas de perda de qualidade das sementes, independentemente da região geográfica. Algumas regiões são menos adversas que as outras, mas, em todas, as temperaturas durante a colheita são inapropriadas para a armazenagem.
    Em especial no centro-oeste brasileiro, é comum encontrar temperaturas na colheita entre 28 e 36oC, o que degrada rapidamente as qualidades físicas e fisiológicas das sementes.
    Assim, a recomendação é eliminar o mais rápido possível as altas temperaturas, seja por meio de pré-resfriamento e armazenagem provisória em sacolões ou silos, ou durante o beneficiamento na colheita.
    O produtor pode comprovar com facilidade estas afirmações, medindo a temperatura da massa de sementes que chega à moega.
    Cada UBS tem suas peculiaridades, em especial no que tange à capacidade de recebimento durante a safra.    



    Ventilação natural em armazém sementeiro
    A manutenção da temperatura dentro do armazém sementeiro é fundamental para a boa estabilidade térmica das sementes resfriadas.
    A radiação solar sobre a cobertura e paredes é o fator mais preponderante para o aumento da temperatura em ambientes armazenadores, sendo possível minimizar o seu efeito nocivo com a adoção de técnicas de construção e materiais adequados.
    Quanto mais clara a cobertura e paredes, maior será a reflexão e menor será a radiação da parte superior para o interior do ambiente. Recomenda-se, também, a aplicação de manta isolante sob a cobertura.
    Para melhorar o perfil da temperatura média dentro do armazém, podemos transferir as baixas temperaturas (noturnas) para o interior do ambiente, por convecção, tornando-o ideal para uma adequada conservação das sementes, pois sabemos que o ar quente (menos denso) sobe e o ar frio (mais denso) desce. 
    A utilização do sistema de exaustão estático é extremante importante, pois promove a extração contínua do ar quente (durante o dia) pela parte superior do telhado e facilita a convecção do ar frio para dentro do armazém durante a noite, pelas aberturas superiores das paredes, proporcionando condições ideais para uma boa armazenagem.
    As portas de acesso ao ambiente armazenador deverão permanecer fechadas para evitar a fuga do ar frio (mais denso) durante o dia.



    O resfriamento artificial de sementes a granel está consolidado e sua implantação requer pessoas proativas, com foco em qualidade e que seguem as recomendações técnicas. 
    Na atualidade, mais de uma centena de empresas de pequeno, médio e grande portes utilizam a tecnologia com sucesso, em toda a América do Sul.
    O produtor deve eliminar rapidamente as altas temperaturas e umidade da colheita e armazenar as sementes em condições adequadas.
    Os benefícios foram comprovados graças a diversos experimentos realizados em parceria com universidades e centros de pesquisa, o que tem proporcionado valiosa informação científica. 
    O desenvolvimento continua. Aos leitores podemos informar que novidades estão surgindo, em especial na área de secagem, e em breve o setor poderá dar mais um salto na busca da qualidade. Ainda bem que esta busca não tem fim. 
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