
Os Processos Requerem Cada Vez Mais Ajuste Fino
Edição VIII | 06 - Nov . 2004 O avanço tecnológico observado nas últimas
décadas na área de produção e tecnologia de sementes permitiu o incremento
significativo da produtividade dos mais diversos cultivos. Estas novas técnicas
de produção exigem a observância de pequenos detalhes, anteriormente
considerados insignificantes. Vê-se hoje, por exemplo, que não basta utilizar
50 kg de sementes por hectare; estas sementes devem, além de possuir alta qualidade
física, fisiológica e sanitária, ser distribuídas uniformemente no solo. Não
basta disponibilizar fertilizantes; macro e micronutrientes devem estar
presentes em número e em quantidade necessária para uma perfeita nutrição da
planta. Sabe-se agora que as sementes, depois de completar a maturação
fisiológica, entram em declínio e que, se colhidas úmidas e secas
artificialmente, terão melhor qualidade do que aquelas que permanecem no campo até
atingirem a maturidade de colheita.
Assim, também
em laboratórios de análise de sementes surgiram avanços nos procedimentos de
avaliação da qualidade, os quais exigem a observância de princípios mais acurados
para sua execução.
A
qualidade dos lotes de sementes é determinada por um conjunto de fatores determinantes
de seus atributos físicos, genéticos, fisiológicos e sanitários. Existem regras
que devem ser seguidas para avaliação de cada um destes atributos. Estas regras
são bem conhecidas por aqueles que trabalham em laboratórios. A metodologia que
deve ser seguida para a avaliação de uma determinada característica do lote de
sementes se encontra indicada nas Regras para Análise de Sementes.
Nestas
regras estão descritos os princípios básicos para implantação e avaliação de
uma determinada análise. No entanto, informações fundamentais muitas vezes não
são explicitadas, especialmente aquelas relacionadas com a observância de
pequenos detalhes que podem exercer efeito significante na precisão e exatidão
dos resultados. Estes termos, precisão e exatidão, estão assumindo, a cada dia
que passa, maior importância, não particularmente, mas especialmente no setor
agrícola, onde a obtenção de maiores rendimentos, com redução dos custos de
produção e otimização dos recursos aplicados é uma busca constante do agronegócio
moderno. Dentro deste contexto observa-se que a competitividade do setor está fazendo
com que novas técnicas e princípios de produção sejam incorporados ao setor produtivo.
Assim, princípios de rastreabilidade, certificados de qualidade de sistemas de produção
e de produtos, agricultura de precisão, entre outros, estão sendo buscados por
muitas empresas, com o intuito de disponibilizar ao consumidor um produto
diferenciado dos demais, ofertados por seus concorrentes.
Deve-se
considerar como parte integrante de um sistema de qualidade em análise de sementes
o controle das variáveis que podem interferir sobre a precisão e exatidão dos resultados.
Entende-se por exatidão o grau de concordância entre o resultado da análise e o
verdadeiro valor da medida, enquanto que precisão refere-se a obtenção de um
valor que represente inequivocamente o real valor do objeto medido. Assim
sendo, imaginemos que em uma balança pesaremos uma determinada massa de um
quilo. Ao colocarmos na balança a massa de um quilo e esta indicar 1000g, podemos
dizer que a mesma é precisa, mas se esta nos indicar 999,5g todas as vezes que colocarmos
aquela massa de um quilo, a balança será considerada exata.
Tudo o
que fazemos na vida deve estar baseado na precisão, pois caso busquemos a exatidão
estamos fadados a frustrações. Assim também devem ser as análises de lotes de sementes.
Devemos sempre buscar a precisão, embora muitas vezes cheguemos somente a exatidão.
Entre as principais variáveis que concorrem para dificultar a obtenção de
resultados precisos tem-se as ambientais (temperatura, umidade e luz), as
inerentes ao próprio teste (equipamento, tratamentos adicionais, período de
duração da avaliação, interpretação dos resultados), as bióticas (assepsia) e
aquelas inerentes ao avaliador (aptidão, treinamento e responsabilidade).
Temperatura
e umidade
Entre os
fatores ambientais que concorrem para dificultar a obtenção de resultados
precisos, sem dúvida destacam-se a temperatura e a umidade. Enquanto a umidade
tem função principal em desencadear um determinado processo metabólico, como a
germinação de uma semente, a temperatura atua como fator determinante da
velocidade com que estas reações vão ocorrer. Estes dois fatores têm efeito significativo
sobre a atividade enzimática e utilização de reservas. Por estes motivos, tanto
a temperatura como a umidade devem ser rigorosamente observadas quando da
condução de testes onde se avalia o desenvolvimento de plântulas. A descrição
de uma determinada metodologia de condução do teste de germinação, por exemplo,
tem explicitada a temperatura que deve ser utilizada durante o período de
incubação das sementes e plântulas.
“Deve-se considerar como parte
integrante de um sistema de qualidade em análise de sementes o controle das variáveis
que podem interferir sobre a precisão e exatidão dos resultados.”
Esta
temperatura deverá ser rigorosamente observada, pois temperatura mais baixa que
a indicada provocará o prolongamento do teste, a fim de que todas sementes
tenham oportunidade de germinar e formar plântulas normais. O prolongamento do
teste pode provocar o surgimento de infecções secundárias, sejam elas causadas
por fungos ou bactérias, as quais dificultarão a interpretação do teste, e levar
à obtenção de resultados não precisos.
Não
podemos esquecer que todas as variáveis de uma metodologia padronizada e de uso
internacional foram exaustivamente avaliadas antes de serem indicadas, sendo,
portanto, esta metodologia perfeitamente calibrada para fornecer resultados
compatíveis com o valor real do parâmetro a ser medido, fazendo com que a
precisão dos resultados seja diretamente relacionada à observância de todas as
técnicas e procedimentos indicados para o teste em uso.
Importante
também é a disponibilização de umidade em quantidade adequada para uma rápida,
uniforme e completa germinação das sementes. Substratos muito úmidos permitirão
uma rápida absorção de água pelas sementes. Caso estas se encontrem com baixos
níveis de umidade, ocorrerão danos irreversíveis em suas organelas, danos estes
que ocasionarão o surgimento de sementes
mortas ou de plântulas anormais, levando a obtenção de resultados não
compatíveis com o verdadeiro potencial qualitativo do lote de sementes. Outro
fator decorrente do excesso de umidade do substrato é a restrição à absorção de
oxigênio, quando da formação de uma película de água ao redor da semente. Esta
restrição de oxigênio também pode levar a um atraso na germinação e indução do
surgimento de plântulas anormais. Por outro lado, o déficit hídrico também é um
fator limitante à obtenção de resultados precisos.
Sabemos
que as sementes necessitam absorver uma quantidade determinada de água para que
os processos associados à germinação sejam desencadeados. Em substrato com
baixa umidade, as sementes necessitarão de mais tempo para atingir este nível
crítico. Isto fará com que o teste seja prolongado, para que todas sementes
possam germinar, desde que haja quantidade de água suficiente. Não havendo
umidade suficiente, a semente absorverá uma quantidade de água inferior ao necessário
para germinar. Nesta situação, normalmente, as sementes acabam sendo tomadas
por microrganismos, não germinando ou originando plântulas anormais.
A
umidade das sementes assume importância fundamental na precisão de testes de
vigor, como o envelhecimento acelerado e a condutividade elétrica, onde o conteúdo
de umidade inicial das sementes pode torná-las mais ou menos suscetíveis à altas
temperaturas, ou interferir na lixiviação de eletrólitos. Por isso a ISTA
recomenda, em seu manual de teste de vigor, que o conteúdo de umidade das sementes
seja determinado antes da realização dos testes de condutividade elétrica,
envelhecimento acelerado e deterioração controlada.
Duração
do teste
As
regras para análise de sementes indicam para o teste de germinação duas contagens para avaliação das plântulas normais.
Tomemos como exemplo o teste de germinação de sementes de soja. A avaliação do
teste é feita no quinto e oitavo dias. Se o teste iniciar em uma quarta-feira,
a primeira avaliação será realizada na segunda-feira e a avaliação final na
quinta-feira seguintes. Não há indicação do horário para realização destas
avaliações, sendo as mesmas passíveis de serem realizadas às oito horas da
manhã, como também às cinco horas da tarde do dia indicado.
“A umidade das sementes assume importância
fundamental na precisão de testes de vigor.”
Em
testes de vigor, onde as sementes são submetidas a um estresse prévio, ou no
qual se avalia a velocidade de crescimento das plântulas, esta variação de
horas é inaceitável, pois as reações metabólicas ocorrem em um curto espaço de
tempo, tendo reflexos na expressão do vigor das plântulas. Para o teste de
envelhecimento acelerado, no qual as sementes são expostas à alta temperatura
por 72 horas, a observância deste tempo é de fundamental importância para
obtenção de resultados precisos, pois a redução ou o aumento no tempo de
exposição terá reflexos em uma maior ou menor germinação das sementes, levando
à obtenção de resultados não representativos. A observância rigorosa do tempo
de exposição também é exigida para outros testes, como o de condutividade
elétrica.
Sementes
deterioradas lixiviam mais e em menor tempo que sementes vigorosas. Normalmente,
16 horas de embebição são suficientes para que a lixiviação se complete. No
entanto, sementes vigorosas terão completado a lixiviação somente após 24 horas
de embebição. Assim sendo, cuidados especiais devem ser tomados quando da
realização da condutividade elétrica para comparação da qualidade de lotes de
sementes. O tempo
indicado para a realização do teste de condutividade é de 24 horas. Ao se fazer
a medição da condutividade às 23 ou às 25 horas, os resultados obtidos não serão
precisos, pois as sementes terão lixiviado menos ou mais do que a quantidade de
eletrólitos detectada nas 24 horas. Com respeito a este teste, duas outras
observações são importantes. Uma está relacionada com a temperatura e a outra
com o número de amostras a serem testadas. A lixiviação de eletrólitos é maior
em temperatura de 25ºC do que em 20ºC. Por isso, este teste deve ser realizado
em ambiente com temperatura controlada. Não devemos testar um número excessivo
de amostras, pois o tempo necessário para a medição pode levar à obtenção de
resultados irreais, face ao prolongado período de embebição.
Luz
Existem
diferenças entre espécies quanto a sensibilidade à luz para a germinação das sementes,
as quais podem ser classificadas como fotoblásticas positivas (germinação estimulada
pela luz) e fotoblásticas negativas (germinação inibida pela luz). As respostas
fotoblásticas são dependentes do fitocromo, que ocorre basicamenete em duas
formas interconvenientes: uma fisiologicamente inativa (Fv), com pico de
absorção na faixa do vermelho extremo (660nm) e a outra forma ativa do
fitocromo (Fve), com pico de absorção da faixa do vermelho extremo (±730nm). O balanço
entre os comprimentos de onda vermelho e vermelho extremo no ambiente irá condicionar
o fotoequilíbrio entre os fitocromos e, conseqüentemente, a germinação. Assim, podemos
perceber que não basta oferecer ou não luz para as sementes durante o teste de germinação
ou vigor.
A
qualidade da luz também é de extrema importância. Este fato também é observado
na avaliação da qualidade sanitária de sementes, onde os fungos são detectados
e identificados através das características de suas estruturas reprodutivas, as
quais se formam na presença de luz ou no escuro. A maioria dos fungos
deuteromicetos esporula na faixa de 320 a 400nm. Portanto, a identificação dos
mesmos está condicionada ao oferecimento de luz. Não há um rigor muito grande
quanto à observância do tempo de luminosidade, podendo haver variações de minutos
para mais ou para menos. O importante é que seja observada a exigência da
espécie em exame, quanto a sensibilidade ou não à luz e que, quando indicada,
seja disponibilizada com a qualidade e quantidade necessárias para à obtenção
de resultados representativos.
Dosagens
de Produtos
Para a
avaliação da qualidade das sementes, normalmente são empregados diferentes
tipos de produtos químicos, como sais e ácidos, especialmente para à superar a dormência
e obter uma germinação mais rápida e uniforme. A concentração destes produtos
deve ser rigorosamente observada, pois qualquer erro na formulação da concentração
indicada poderá causar a morte das sementes ou a não superação de sua
dormência, comprometendo a avaliação do teste.
A
escarificação ácida, empregada para a superação da dormência de algumas
espécies de gramíneas, como também para a remoção do linter de sementes de
algodão, é um exemplo de uma prática que deve ser realizada com muito cuidado.
A exposição das sementes à concentrações muito altas ou à imersão por um
período de tempo excessivo, invariavelmente, causará a morte das mesmas ou o surgimento
de plântulas anormais, comprometendo a precisão do teste de germinação.
Equipamentos
Testes
de germinação e de estresse de sementes são acentuadamente influenciados pela
temperatura. Consequentemente, o equipamento que será utilizado para a condução
do teste deve ser dotado de sistema de aquecimento e controle de temperatura
que permita a obtenção e a manutenção da temperatura desejada, de modo que a
oscilação da temperatura mantenha-se dentro de níveis aceitáveis. Se a metodologia
de um determinado teste indica a exposição das sementes a uma temperatura de 30ºC,
o equipamento deve ser capaz de atingir e manter esta temperatura constante
durante todo o período de condução do teste. Esta temperatura não poderá ser
29ºC e nem 31ºC.
Variações
de temperatura durante a execução de um teste podem ser minimizadas com o
controle da temperatura ambiente ou com o emprego de termostatos eletrônicos dotados
de maior sensibilidade à variações térmicas. Também é importante que o
laboratório confirme se a temperatura programada de um equipamento está correta.
Para isso, devem ser realizadas aferições frequentes, com a utilização de
termômetros calibrados.
Assepsia
Os
resultados de um teste no qual se avalia a capacidade de germinação de sementes
é muito influenciado pela presença de microrganismos contaminantes,
especialmente de fungos, sejam estes testes realizados em substrato de papel,
solo ou areia. Dentre os fungos contaminantes, destaca-se a presença de
Rhizopus spp. e Mucor spp., os quais podem estar localizados na sementes, especialmente
em sementes velhas, como no próprio substrato. Em certos casos, o crescimento
destes contaminantes é tão grande a
ponto de impedir o desenvolvimento normal das plântulas. Numa situação como
esta, deve-se identificar a fonte de contaminação e buscar alternativas. Caso o
problema seja no substrato, deve-se repetir o teste, realizando previamente a
esterilização do mesmo. A esterilização com o uso de temperatura elevada,
associada a um alto grau de umidade, representa um dos métodos
mais eficientes para a destruição de microrganismos. Igualmente, é importante a
assepsia do ambiente de trabalho. Paredes, teto, mesas de trabalho, são
adequadamente assépticas com solução de hipoclorito de sódio a 1%. Também não
deve ser negligenciada a assepsia dos germinadores e câmaras empregadas na incubação
das sementes. Esta operação pode ser realizada com o emprego de uma solução de
fenol ou creosol, em concentrações de 2 a 5%. A ação microbiocida destes
produtos está associada à temperatura e ao pH. De um modo geral em pH alcalino
e em baixas temperaturas a ação destes produtos é menor. Para a assepsia de um
germinador também podem ser utilizados produtos químicos gasosos, como o
formol, sendo este o agente de esterilização mais empregado para esta
finalidade. As paredes internas do germinador devem ser lavadas com uma solução
de formalina a 4%, fechando-se em seguida a porta e ajustando a temperatura do germinador
para 25ºC, deixando-se assim por uma noite.
“A esterilização com o uso de temperatura elevada, associada a um alto grau de umidade, representa um dos métodos mais eficientes para a destruição de microrganismos.”
No dia
seguinte, abre-se a porta do germinador e deixa-se o gás sair, para depois colocar
o material a ser incubado. Detergentes, como o sabão, agem por remoção
mecânica, reduzindo a tensão superficial e aumentando o poder umectante da
água. Os microrganismos e partículas contaminantes aderem-se à espuma, sendo
removidos com a água da lavagem. Por esta razão, os sabões, especialmente os
sintéticos, são eficientes para a limpeza superficial de utensílios e equipamentos
de uso laboratorial. Estes cuidados são importantes para evitar o desenvolvimento
de fungos contaminantes e facilitar a avaliação das plântulas.
Experiência
A
precisão dos resultados de uma análise depende também da habilidade do analista
em conduzir e avaliar o teste. A capacidade de realização de uma análise está
diretamente relacionada com o grau de treinamento do analista. O treinamento em
serviço é importante para a obtenção de experiência. No entanto, a precisão
necessária para a realização de análises laboratoriais é conseguida por meio de
treinamentos específicos, realizados em instituições de reconhecida capacidade
nacional e internacional. A participação em testes de referência e comparativos
entre laboratórios é outro mecanismo que contribui para a formação dos laboratoristas e para a
manutenção da excelência dos serviços prestados.
“Sendo a qualidade um requisito
essencialmente associado à competitividade de uma empresa e à excelência dos
produtos por ela ofertados, esta não pode negligenciar etapas e processos
fundamentais que devem ser conduzidos de forma precisa para ofertar aos seus
clientes um produto ou serviço diferenciado dos demais. Assim, um laboratório
de análise de sementes deve primar pela utilização correta dos métodos e
equipamentos necessários para a condução das análises, devendo as mesmas ser
realizadas por técnicos treinados e qualificados para este fim. Não se pode
esquecer que quanto mais sensíveis forem os procedimentos de uma análise,
maiores deverão ser os cuidados quanto à observância dos possíveis fatores
envolvidos com a sua precisão.”