O Negócio Sementes: combinando inovações tecnológicas e gestão estratégica

Edição XV | 02 - Mar . 2011
Volnei Krause Kohls-vkkohls@terra.com.br

    Com a crescente integração dos mercados mundiais, novos agentes econômicos têm afetado o cenário competitivo das organizações. Esse novo contexto traz efeitos difusos, pois, ao mesmo tempo em que abre novas oportunidades, coloca também ameaças e desafios a serem superados e, sobretudo, exige um grande esforço de adaptação às mudanças. O ritmo da competição global e a mudança tecnológica estão forçando as empresas a adotarem uma postura de aprendizagem intensiva, enquanto buscam a identificação de estratégias que viabilizem resultados satisfatórios.

    As empresas são pressionadas a adotarem estratégias competitivas, através de novas concepções, ações e atitudes, nas quais produtividade, custo e eficiência se impõem como regras básicas, mas não suficientes, na busca da sua sustentação duradoura no mercado. Para além de produtividade, custo e eficiência, conceitos como aprendizagem e inovação – pela combinação apropriada de recursos e capacitações – passam a constituir eixos fundamentais na condução da gestão estratégica. 

    Inseridas nesse ambiente de mudança, risco e incerteza crescentes, as empresas do agronegócio em geral e, em especial, as produtoras de sementes, também são instigadas a buscar estratégias competitivas e a repensar suas formas de organização, tanto em nível interno de concepção e execução da produção, como no externo, em suas relações com outras empresas. Assim, o fortalecimento de relacionamentos com atores externos são, via de regra, as fontes do valor gerado e percebido pelos clientes. 

    Num cenário onde os produtos, os preços e a qualidade são cada vez mais iguais e os consumidores cada vez mais informados e exigentes, a simples sobrevivência das organizações traz novos desafios aos profissionais responsáveis pela sua gestão. Então, compreender os clientes, as suas necessidades e os direcionadores de valor que orientam as suas escolhas é fundamental, mas além disso, também é importante entender o ambiente onde as empresas atuam. Com o intuito de auxiliá-lo na gestão estratégica de sua empresa, apresentamos na sequência três ferramentas que o ajudarão a diagnosticar o ambiente da sua empresa (análise ambiental), a avaliar os direcionadores competitivos do(s) produto(s) da sua empresa (análise de direcionadores) e a avaliar o desempenho dos seus produtos vis-à-vis ao interesse dos seus clientes e a performance dos seus concorrentes (matriz de importância – desempenho). 


    Análise Ambiental

   A análise ambiental ajuda a tornar os sistemas de decisão de produção e marketing mais eficientes. Como as empresas formam um sistema de dependência e interação mútua com o ambiente, a análise ambiental ajuda a prever as combinações de variáveis econômicas, sociais, políticas, naturais, competitivas, etc, e, portanto, a reduzir – mas não eliminar – as incertezas. Ela divide-se em três níveis: O ambiente geral, o ambiente competitivo e o ambiente interno, ou seja, a própria organização.

    O ambiente geral é composto pelas forças motrizes que afetam todas as empresas. As empresas não têm controle sobre estas forças, por isso é importante que elas criem condições para a tomada de decisões eficazes quando diante de oportunidades e/ou ameaças. 

    O ambiente competitivo é composto pelos atores que estão mais próximos da organização. O objetivo da análise do ambiente competitivo é identificar oportunidades para o desenvolvimento das competências da organização, entender os clientes e suas necessidades, identificar ameaças atuais e potenciais, bem como entender o mercado dos fatores de produção. Conhecendo o ambiente competitivo, a empresa poderá melhor se posicionar. 

    A última etapa da análise compreende a análise do ambiente interno. Ela consiste em avaliar as competências da empresa, bem como as suas limitações. Deve-se avaliar a empresa em áreas como: a estrutura organizacional, capacidade operacional, participação no mercado, recursos financeiros, experiência, imagem e cultura da empresa, gestão e qualidade dos recursos humanos, portfólio de produtos e serviços, entre outras. A meta é identificar pontos fortes que possam ser alavancados e pontos fracos que possam ser superados na organização. 


    Análise de direcionadores de competitividade

    A caracterização e análise dos segmentos que compõem uma cadeia agroindustrial revelam a existência de um variado conjunto de fatores internos e externos que afetam o seu desempenho competitivo. A análise contempla um conjunto de fatores denominados de “direcionadores de competitividade”, os quais, vão indicar o estágio competitivo em que se encontra uma determinada cadeia produtiva e suas organizações. Esta ferramenta, adaptada para o negócio sementes, permite diagnosticar o estágio competitivo do conjunto das empresas do setor no seu ambiente macro, além da avaliação de suas competências internas. O método consiste em elaborar uma matriz passo a passo, com todos os elos da cadeia representados. 

    Nas diversas turmas do Mestrado Profissional em Ciência e Tecnologia de Sementes da UFPel, compostas principalmente por profissionais das áreas de agronomia, engenharia agrícola, biologia e administração, tem-se trabalhado intensivamente questões de biotecnologia, tecnologia de produção e pós-colheita, além do planejamento e gestão estratégica do negócio sementes, entre eles soja, arroz, milho, trigo, sorgo, hortaliças, etc. Para exemplificar a aplicação desta ferramenta, utilizaremos um exemplo de trabalho exercitado pelos mestrandos na área de sementes de soja, desenvolvido no Brasil.

    A primeira tarefa, então, é definir os direcionadores de competitividade e os respectivos critérios competivos. Neste caso, optou-se pelos seguintes direcionadores: ambiente institucional, gestão de negócio, tecnologia, logística, relação de mercado e marketing. Conforme pode-se observar, no âmbito de cada direcionador de competitividade, estão indicados os diversos critérios competitivos avaliados. Por exemplo, o direcionador “logística” tem como critérios competivos o sistema de transporte, o custo, a flexibilidade de entrega, o fluxo de informações e a acessibilidade do cliente.

    Na sequência, atribui-se responsabilidade(s), ou seja, quem controla de fato cada critério competitivo, com as seguintes opções: a empresa (EMP), a coordenação da cadeia produtiva (CAD), o governo (GOV), se é quase controlável (QCON) ou não controlável pelos agentes (NCON).


    O segundo passo do procedimento metodológico é definir a intensidade do impacto de cada critério competitivo e sua contribuição para o efeito agregado dos direcionadores. Para tanto, pode-se utilizar uma escala do tipo “likert”, variando de “muito favorável” (MF +2), quando há significativa contribuição positiva do critério; “favorável” (F +1); “neutro” (N zero); “desfavorável” (D -1); e “muito desfavorável” (MD -2), no caso de impacto muito negativo do critério. A atribuição de valores (de +2 a -2) permite visualizar os resultados através de uma representação gráfica, bem como combinar quantitativamente os valores atribuídos aos critérios, para que se possa fazer avaliações agregadas. Assim, a combinação quantitativa dos critérios, de modo a gerar uma avaliação para cada direcionador de competitividade e seus respectivos critérios, envolve ainda uma etapa de atribuição de pesos relativos. A motivação para esse procedimento de ponderação é o reconhecimento da existência de graus diferenciados de importância para os diversos critérios, em termos de sua contribuição para o efeito agregado. Cada um dos direcionadores de competitividade também deve ser ponderado em função de sua contribuição para a competitividade da cadeia sob avaliação.

    Esta fase do trabalho – a atribuição de pesos relativos sobre o impacto de cada critério e seu efeito agregado na competitividade da empresa e/ou do setor – é a mais complexa e rica da análise, pois permite aos participantes expressarem o seu conhecimento e as suas convicções acerca de cada direcionador e seus respectivos critérios competitivos. É um momento chave para o resultado do trabalho, pois, além de exigir um conhecimento profundo da equipe sobre o setor de sementes que está sendo avaliado, normalmente são necessárias várias rodadas de debates e discussões até chegar-se a uma resposta consensual acerca de cada item da matriz dos direcionadores de competitividade.

    Retomando a sequência da matriz, desenvolveu-se um exemplo hipotético de análise dos direcionadores de competitividade de uma empresa produtora de sementes de soja e sua respectiva cadeia produtiva. Na primeira coluna (direcionadores e critérios competitivos) foram estabelecidos seis direcionadores de competitividade (ambiente institucional, gestão de negócio, tecnologia, logística, relação de mercado e marketing) e seus respectivos critérios competitivos. Na segunda coluna (controlabilidade), foram indicadas as responsabilidades ou co-responsabilidades de cada critério competitivo, entre os agentes da cadeia produtiva e governo. Na terceira coluna (peso), definiu-se o peso relativo atribuído a cada direcionador e a cada critério, os quais se constituirão em informação-chave para obter-se o impacto real de cada critério e seu efeito agregado na competitividade da empresa e do setor. 

    Desta maneira, após ampla discussão entre os agentes envolvidos e especialistas, através do método Delphi, atribuiu-se o peso de 8% para o ambiente institucional, 22% para a gestão do negócio, 19% para tecnologia, 21% para logística, 18% para a relação de mercado e 12% para o marketing, além dos pesos relativos aos critérios competitivos, dentro de cada direcionador. Obviamente, a soma dos direcionadores deve fechar em 1, assim como os pesos relativos dos critérios dentro de cada direcionador. Nas duas colunas seguintes (avaliação dos critérios e quantificação da avaliação), foram atribuídos os níveis de desempenho em que se encontram cada critério, desde Muito Favorável (MF, +2) até Muito Desfavorável (MD, -2). Os valores da última coluna (avaliação x peso dos critérios), resulta da multiplicação do nível de cada critério (+2, +1, 0, -1 ou -2) pelo respectivo peso relativo do critério, atribuído anteriormente, dentro de cada direcionador de competitividade. O impacto de cada direcionador é obtido pela soma algébrica dos resultados do impacto de cada critério, multiplicado pelo peso relativo atribuído a cada direcionador, na terceira coluna. 


    O resultado da matriz pode ser visualizado na figura. Note-se que os direcionadores – gestão do negócio e tecnologia – basicamente de responsabilidade da empresa, são os que estão impactando mais positivamente a competitividade. Por outro lado, o direcionador – logística –, cuja responsabilidade é compartilhada entre governo e empresa, está impactando negativamente a competitividade da empresa.

     As relações de mercado, o marketing e o ambiente institucional, embora de forma menos significativa do que a logística, também estão impactando negativamente a empresa. Assim, de um modo geral, pode-se concluir que a avaliação dos direcionadores de competitividade desta empresa junto à cadeia de produção de sementes, estão com desempenho regular, mas podem ser melhoradas, necessitando de ações específicas e urgentes na área de logística, especialmente na flexibilidade de entrega por parte da empresa e sistema rodoviário por parte do governo, assim como ações nas áreas de relações de mercado e marketing.

    A partir do resultado da matriz dos direcionadores de competitividade, os agentes econômicos ligados à cadeia de produção de sementes analisada, poderão projetar suas ações estratégicas de curto, médio e longo prazos. Uma vez que o trabalho teve a participação de todos os envolvidos, este documento pode se transformar no instrumento orientador e articulador de ações concertadas entre os empresários dos diversos elos da cadeia, assim como das instituições governamentais envolvidas.


    A matriz Importância x Desempenho
    Outra ferramenta interessante de diagnóstico empresarial foi desenvolvida por Slack. De acordo com o autor, a construção de um conjunto de metas e objetivos para a produção é uma questão de traduzir as necessidades atuais e potenciais dos clientes, e identificar como as empresas rivais estão desempenhando tais necessidades. Ou seja, para poder fazer uma avaliação, o autor desenvolveu uma matriz que relaciona a importância para os clientes (dos critérios competitivos) com o desempenho da empresa (nestes mesmos critérios), em comparação com o desempenho dos concorrentes.
    Em função desses dois agentes econômicos – clientes e concorrentes – o autor desenvolveu um modelo de avaliação dos critérios competitivos, através de uma matriz de “importância” (para os clientes) versus “desempenho” (dos fornecedores em relação à concorrência). Em outras palavras, a escala de “importância” indica como os clientes veem a importância relativa de cada critério competitivo, e a de “desempenho” classifica cada critério segundo níveis atingidos pelos concorrentes.
    Do cruzamento dessas informações, é possível uma avaliação bastante clara do estágio da empresa dentro do setor avaliado e quais os critérios competitivos que podem orientar o gerenciamento estratégico da organização. 
    Adaptando a matriz “Importância x Desempenho”, de Slack (2002), considera-se no eixo horizontal, a escala com cinco opções de níveis de importância para os clientes, de cada critério pesquisado, num continuum, que vai desde “importância decisiva” para a escolha do produto e/ou serviço, até aspectos de baixa importância. No eixo vertical está indicada a escala com cinco opções de níveis de desempenho de cada critério em relação aos concorrentes, num continuum que vai desde “muito acima ou melhor” até “muito abaixo ou pior”. 
    Essa matriz possui quatro zonas de enquadramento dos critérios competitivos, que resultam da importância atribuída a cada um por parte dos clientes, e do estágio do desempenho das empresas, em relação aos seus principais concorrentes, em cada um desses critérios. Para visualizar espacialmente os critérios na matriz, eles podem estar plotados em uma das quatro zonas, em função do grau de importância atribuído pelos clientes e o desempenho da empresa frente aos seus concorrentes:  “zona de ação urgente” (vermelho); “zona de melhoramento” (amarelo); “zona apropriada” (verde); e “zona de excesso” (azul).
    Portanto, considerando o eixo horizontal, todos os critérios que estiverem do centro para a direita são muito valorizados pelos clientes, e os que estiverem do centro para a esquerda são pouco valorizados. Por outro lado, ao considerar-se o eixo vertical – todos os critérios que estão do centro para cima –, a empresa está com um desempenho melhor que os concorrentes e, do centro para baixo, a mesma demonstra um desempenho inferior aos concorrentes. 
    Na zona de ação urgente todos os critérios competitivos que se enquadram nessa área da matriz devem merecer uma atenção especial e imediata da empresa, pois são critérios muito valorizados pelos clientes (estão no canto inferior direito da matriz) e a própria empresa, na sua avaliação, está com um desempenho bem inferior aos seus concorrentes. Nesse caso existe uma grande lacuna no desempenho da empresa, que deve agir imediatamente no sentido de elevar esses critérios para os estágios superiores (zona de melhoramento, num primeiro momento, e zona apropriada na sequência). Ou seja, as ações devem se dar no sentido da seta que parte da zona de ação urgente, verticalmente, em direção à zona apropriada, na figura do texto.



    Na zona de melhoramento todos os critérios que se enquadram nessa área da matriz, especialmente do centro para a direita, também são muito valorizados pelos clientes e a empresa – pode estar com um desempenho igual ou levemente inferior aos seus concorrentes. Entretanto, ao observar o lado esquerdo dessa faixa, ela está com um desempenho inferior aos concorrentes, mas são critérios pouco valorizados pelos clientes, o que minimiza, pelo menos momentaneamente, possíveis problemas da empresa nos critérios que venham a se localizar nesse lado da figura. De qualquer forma, todos os critérios competitivos que se enquadram nessa zona amarela também devem ser aprimorados pelas empresas, pois estão num estágio intermediário entre a zona de ação urgente (mais grave) e a chamada zona apropriada, onde a empresa já seria considerada competitiva. Os critérios que estão mais à esquerda na zona amarela também devem estar sob observação, pois, em função da dinâmica e velocidade das mudanças no ambiente de negócio considerado, podem passar a ser percebidos e mais valorizados pelos clientes e/ou consumidores. As ações devem se dar no sentido da seta oblíqua na figura, ou seja, ações simultâneas de melhoria de desempenho e busca de percepção e valorização por parte dos clientes e/ou consumidores.
    Na zona apropriada, todos os critérios competitivos que se enquadram nessa área da matriz, especialmente no canto superior direito da figura, também são muito valorizados pelos clientes e a empresa está, então, com um desempenho superior ou levemente superior aos seus concorrentes. Quanto maior o número de critérios que se enquadrem nessa faixa, mais competitiva é a empresa.
    Na zona de excesso todos os critérios competitivos que aí se enquadram são muito pouco valorizados pelos clientes, porém as empresas estão com um desempenho muito superior aos concorrentes. Nesse caso, as mesmas podem tomar duas providências não excludentes: primeiro, desenvolver um trabalho no sentido de que os clientes e/ou consumidores passem a valorizar esses critérios, pois a empresa é muito competitiva nos mesmos, ou seja, deslocá-los para a direita (ver seta horizontal que parte da zona de excesso na Figura), fazendo com que eles ingressem na chamada zona apropriada; segundo, fazer uma avaliação interna, no sentido de observar se não está havendo desperdício de recursos e/ou capacitações, que poderiam estar sendo utilizados em áreas onde a empresa esteja com fragilidades.


    Compreender os clientes, as suas necessidades e os direcionadores de valor que orientam as suas escolhas é fundamental na gestão estratégica dos negócios. Na economia global – e não é diferente no setor de sementes – as vantagens competitivas duradouras baseiam-se cada vez mais em fatos locais – conhecimentos, relações, motivações – que não podem ser facilmente imitados pelos concorrentes.
Para obter resultados num mundo que requer que as empresas inovem e mudem, os profissionais devem desenvolver capacitações que permitam entender o funcionamento operacional da empresa e da cadeia e/ou rede de produção e serviços onde estão inseridos, além de acompanhar de perto o funcionamento da economia. 
Assim, com o intuito de auxiliá-lo nesta tarefa, foi que apresentamos três ferramentas que poderão ajudá-lo a entender o seu ambiente de negócio, a avaliar os direcionadores competitivos do(s) produto(s) da sua empresa e a avaliar o desempenho dos seus produtos vis-à-vis ao interesse dos seus clientes e a performance dos seus concorrentes. 


    Também colaborou com esta matéria:
    Mario Duarte Canever
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