Ecologia sementeira II

Desafios do cultivo

Edição X | 02 - Mar . 2006
James Delouche-JCDelouche@aol.com
    Os ecossistemas foram essenciais e necessariamente estabelecidos pela transformação ou substituição de partes de ecossistemas naturais, e este processo ainda  prossegue até hoje em dia. Evidências históricas e ecológicas mostram que os ecossistemas  complexos naturais foram manipulados em etapas graduais, discretas, e em fases, para criar  sistemas de produção artificial mais simples com a evolução da lavoura agrícola.
    Dois  sistemas de produção contrastantes emergiram destas transformações e manipulações. Um  sistema de produção de semente, baseado em espécies vegetais que se reproduzem por meio  de sementes, desenvolvido em áreas mais temperadas e subtropicais no Velho e no Novo  Mundo, enquanto um sistema de horticulturas, baseado em espécies propagadas vegetativamente desenvolvido nas áreas tropicais úmidas das Américas, Sudeste da Ásia  e Oeste da África. Embora sistemas indígenas de horticultura sejam usualmente mais  variados e ecologicamente estáveis e conservados do que os sistemas indígenas de  produção de sementes, eles estão desaparecendo aos poucos através da intrusão  de lavouras estabelecidas por sementes e a simplificação para monoculturas, por exemplo,  plantações de cana-de-açúcar e mandioca. 
                 
     Adaptação Sazonal dos Cultivos                     
   A manipulação dos ecossistemas agrícolas, para torná-los mais simples, mais eficazes, mais eficientes e convenientes para a produção de alimentos, fibras e outros materiais e,  especialmente, para adaptar os sistemas a outros ambientes e estações, apresentou aos  agricultores e pesquisadores muitos desafios e problemas e isto também continua acontecendo na atualidade.
     Na década de 30, os cientistas agrícolas russos receberam o  desafio ecológico de adaptar um sistema de cultivo de inverno à primavera, isto é, converter  trigo de inverno em trigo de primavera. O problema é que o trigo de primavera da região  semi-árida das estepes ucranianas começou bem, mas então era, com frequência, seriamente  danificado pelas altas temperaturas do verão no início da formação do grão. O cientista  vegetal russo T. D. Lyssenko, que tinha feito algum trabalho pioneiro no desenvolvimento  dos vegetais, achou que o problema poderia ser resolvido submetendo-se as sementes de  trigo de inverno às condições de verão simuladas.                     
   As condições ou tratamento simulado de inverno, chamado vernalização, encurtaria  (teoricamente) o período vegetativo e aceleraria o florescimento e a formação dos grãos do  trigo de inverno plantado na primavera sob os longos dias do fim da primavera e início do  verão. As sementes do trigo de inverno foram vernalizadas apenas por meio do ajuste do grau  de umidade e da sua manutenção sob temperaturas similares às do inverno, logo acima do congelamento, isto é, 1 - 2°C, por períodos de até 60 dias.
     O tratamento pareceu funcionar de acordo com a teoria, e pelos 20 anos seguintes ou mais, estava difusamente promovida na Rússia e aceita pelos pesquisadores em outros países para a conversão de cultivos de cereais de inverno em lavouras de primavera, por exemplo, trigo, cevada, centeio, induzindo à florescência e à formação da semente de algumas forrageiras de clima temperado, por exemplo, alfafa, azevém, sob condições desfavoráveis e acelerando a florescência e a formação de sementes em hortaliças, como alface e cebola.                       
   Os resultados produzidos pelo tratamento, entretanto, eram bastante inconsistentes e, em muitos casos, apenas marginalmente melhores do que os controles. Enquanto a vernalização ainda era um tópico interessante e popular em seminários, durante meus estudos de graduação no início da década de 50, as pesquisas e aplicações práticas do tratamento tinham caído criticamente até mesmo na Rússia. Vários outros métodos para alterar a estação de cultivo foram tentados com sucesso limitado. O plantio de culturas de primavera em regiões mais ao norte e mais frias, como no Canadá, é frequentemente retardado devido  às condições ruins para cultivo e semeadura. Alguns estudiosos, entretanto, começam a pensar em meios pelos quais se consiga semear durante um período favorável no outono, mas sem germinar nem emergir até que as condições tornem-se favoráveis na primavera seguinte.                       
    Uma experiência, passada, nos anos 60, era genética e fisiológica. Foi introduzida dormência suficiente na semente de Avena sativa, de modo que ela podia ser semeada no outono, perdesse a dormência durante o inverno e germinasse só depois da primavera seguinte. As variedades especiais que se desenvolveram foram chamadas de dormoats. Uma outra experiência um pouco mais tarde, nos anos 70, era química e mecânica. As sementes de  trigo foram cobertas com um material termo sensível para semeadura no outono, o qual  impedia a absorção de água até o solo aquecer-se a um nível favorável na primavera seguinte.                       
    Estes foram experimentos bastante criativos para resolver problemas ecológicos do tempo de semeadura, porém as ideias eram mais avançadas do que a tecnologia disponível para sua aplicação com sucesso. É interessante que avanços bastante recentes na química  de polímeros e tecnologia de cobertura tenham renovado o interesse nos métodos químicos/mecânicos e similares enquanto a engenharia genética será a tecnologia apropriada para o método genético/fisiológico para alterar a adaptação sazonal dos cultivos.     
             
    Impedimentos Ambientais                     
 
  Muitos cultivos de estação fria são produzidas nos desertos do oeste dos EUA  durante o inverno. Algumas das lavouras são semeadas em setembro, quando a temperatura  do solo pode ser bem quente. As sementes de alface, um dos cultivos mais importantes,  são sensíveis a temperaturas altas - então é difícil obter uma população comercial  adequada de mudas em setembro.
     Vários tratamentos foram desenvolvidos para vencer  a restrição imposta pela temperatura alta e pela escuridão do ambiente sobre a produção  de alface. O tratamento das sementes com giberelina e/ou priming da semente amplia a  faixa de temperatura para germinação e estabelecimento das mudas para temperaturas  mais quentes que são comuns em setembro.                       
    O priming, ou osmocondicionamento, também é eficaz na promoção da germinação  de outros tipos de sementes sob condições que são normalmente desfavoráveis. Mudanças na época de semeadura e no ciclo da lavoura, isto é, maturidade, também podem mudar condições ambientais, a ecologia, a cultura na florescência crítica, enchimento de sementes e períodos de maturação. O aumento considerável na densidade da semeadura foi obtido por meio de aprimoramentos na irrigação, fertilização, proteção da lavoura e, especialmente, no período de maturidade das lavouras. Lavouras que tinham períodos de maturidade de 200 ou mais dias, no passado, agora amadurecem em 120 - 140 dias ou menos. Em regiões com estações úmida e seca distintas, o encurtamento do ciclo da cultura frequentemente resultou na maturação da lavoura durante a última estação de chuvas, ao invés da primeira estação seca, o que requeria mudanças importantes no gerenciamento do cultivo, colheita, e no  manejo da produção para minimizar as perdas pós-colheita.        
              
    “As sementes de trigo foram cobertas com um material termo sensível para semeadura no outono, o qual impedia a absorção de água até o solo aquecer-se a um nível  favorável na primavera seguinte” 
                       
   
 Dificuldades na produção de sementes e grãos de qualidade das variedades de soja de  maturação precoce, no sudeste dos EUA, foram por muito tempo uma restrição ao uso de  tais tipos precoces num mix de variedades para alcançar as vantagens de minimizar riscos, mão-de-obra, maquinário e irrigação por um longo período de tempo. As variedades precoces eram, geralmente, semeadas após o cultivo do algodão, aproximadamente de maio até meio de junho, o que sujeitava-as a frequentes secas prolongadas no fim de julho e em agosto, durante a florescência e período de enchimento de grãos, e às chuvas frequentes e a alta umidade, durante o fim da maturação e do período de colheita, em setembro. Também com  frequência os resultados foram rendimentos baixos, sementes de má qualidade e grãos bastante prejudicados pelo clima.          Algumas pessoas, entretanto, decidiram ir contra a prática usual e semear cedo as variedades de maturação precoce. Assim fizeram e a lavoura atingiu a maturação cedo, escapou da seca e foi colhida antes das chuvas do fim de setembro. A transição para a semeadura precoce da soja, é claro, envolveu muito mais do que alguém tentando e tendo sucesso.                     
     A cultura do arroz é um dos ecossistemas de lavoura mais interessantes e não tão  simples. Isso e a ecologia das plantas daninhas serão examinados no seguimento desse ensaio  sobre a ecologia da semente.  


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