Mudanças na Produção de Sementes

Edição XII | 05 - Set . 2008
James Delouche-JCDelouche@aol.com
   Biologicamente, a produção de sementes não mudou muito desde o início da cultura pecuária. A natureza sempre se encarregou da maioria dos estágios técnicos. Grãos de pólen caem das anteras, são transferidos para os estigmas receptivos, germinam, e os tubos polínicos entram no ovário, onde as células de esperma fertilizam os óvulos e núcleos polares nos óvulos, os quais se desenvolvem em sementes. Só no século passado, ou antes, entretanto, ocorreram mudanças revolucionárias em QUEM produz as sementes, ONDE as sementes são produzidas, e num menor grau, COMO isto acontece.
 
    “Os primeiros agricultores foram os primeiros produtores de sementes. Eles entenderam que as sementes precisavam ser armazenadas após a colheita para semeadura das lavouras na próxima safra.”
 
   Os primeiros agricultores foram os primeiros produtores de sementes. Eles entenderam que as sementes precisavam ser armazenadas após a colheita para o plantio das lavouras na próxima safra. A produção e armazenagem de sementes na fazenda, que começaram cerca de 9.000 anos atrás, continuaram sendo o método comum de suprimento de sementes até o século XX, quando começaram a ocorrer mudanças revolucionárias em quem, onde e como as sementes são produzidas. Estas mudanças na produção de sementes foram completas, em grande parte, nos países industriais e agricolamente avançados, enquanto nos países menos desenvolvidos, especialmente da África, foram implementadas num nível significativo, apenas para algumas culturas especiais, tais como hortaliças.


   A transição dos anos
   Quando comecei meus estudos e trabalho com sementes, em torno da década de 50, a maioria dos fazendeiros dos EUA selecionava e armazenava sementes para o plantio de todas as suas culturas principais, exceto milho, por exemplo, algodão, trigo, soja, aveia, sorgo, cevada, arroz. Eles raramente obtinham sementes de vizinhos, cooperativas ou pequeno produtor especializado em sementes quando precisavam mudar a variedade, ou perdiam seu suprimento de sementes como resultado de algum desastre natural ou apenas negligência.
   Como observado, o milho era a exceção entre as grandes culturas. A produção de milho nos EUA se deslocou amplamente de variedades de polinização aberta, para híbridos, no início dos anos 50. Como a produção de sementes híbridas requisitava acesso a linhas puras adequadas, conhecimento e estratégias além das que a maioria dos agricultores possuía, a produção e fornecimento de sementes híbridas de milho foram assumidos por empresas especializadas em sementes híbridas.
   Assim, para a cultura do milho, mudanças dramáticas já haviam ocorrido em quem produzia as sementes, companhias especializadas em híbridos ao invés de fazendeiros individuais, e como as sementes eram produzidas, pela polinização cuidadosamente controlada de linhas puras compatíveis ao invés do cruzamento aleatório de populações com polinização aberta.
   Mudanças significativas em quem produzia as sementes de muitas das  culturas secundárias, tais como leguminosas, forrageiras e cereais, já tinham ocorrido antes de 1950. Muitas culturas são produzidas a fim de extrair outros produtos que não as sementes - isto é, folhagens, raízes, frutos -, de modo que a produção e armazenagem de sementes são difíceis, inconvenientes e inconsistentes. Como a maioria dos fazendeiros precisava de quantias relativamente pequenas de sementes, eles dependiam muito das empresas especializadas para suas sementes de olerícolas, e dos negócios baseados nos agricultores locais e pequenas empresas, para obter seu suprimento de forragem, pastagens e sementes de gramíneas.
   A produção de sementes era oportunista. Os representantes das empresas pesquisavam a área em busca de fazendas com lavouras de pastagem e forragem com bom potencial para a produção de sementes e negociavam com os proprietários os direitos de arrendar e/ou gerenciá-los para que produzissem sementes. As empresas então colhiam, limpavam e embalavam as sementes para comercializá-las com fazendeiros da região. Para estas culturas menores, portanto, a mudança em “quem” produz as sementes tinha sido grande. Apenas uma minoria dos fazendeiros continuava produzindo sementes no campo e armazenando as que eram necessárias para tais tipos de culturas.
   As mudanças em “onde” as sementes de leguminosas, forrageiras e cereais foram produzidas se verificaram grandemente nos anos 50 e início da década de 60. A produção de sementes de alfafa (Medicago sativa), muitas das lavouras de trevo (Trifolium spp.) e leguminosas foram mudadas das áreas onde as lavouras eram cultivadas para os vales irrigados da Califórnia. Os estados do noroeste do Pacífico de Oregon e Washington passaram a ser os maiores produtores de sementes de importantes pastagens e gramíneas, como as várias espécies de poa (Poa spp.), azevém (Lolium spp.), festuca (Festuca spp.) e outras.
   Estas mudanças de milhares de quilômetros na produção de sementes de onde elas poderiam ser comercializadas e cultivadas ocorreram a fim de tirar vantagem das condições ambientais extremamente favoráveis na Califórnia e Noroeste do Pacífico para a produção econômica e consistente de sementes de alta qualidade. Entretanto, elas poderiam não ter ocorrido sem o transporte e sistemas de comunicação eficientes e eficazes já disponíveis no local e, mais importante, sem a rede de empresas especializadas em sementes que se desenvolveram para produzir, transportar, e comercializar as sementes.
   Assim, para as culturas de leguminosas, forrageiras, cereais e várias outras especialidades, as importantes mudanças em “onde” as sementes foram produzidas, Califórnia e Noroeste do Pacífico, ao invés dos estados onde seriam cultivadas, e “quem” as produziu, empresas especializadas em sementes ao invés de produtores e empresas de sementes locais, foram largamente completadas em meados dos anos 60. Embora muitas empresas de pequeno e médio porte estivessem envolvidas na produção de sementes das grandes culturas nos anos 50 e 60, a produção e armazenagem de sementes pelos próprios agricultores continuou sendo a fonte principal de suprimento de algodão, trigo, soja, cevada e arroz até os anos 70.       
   Variedades híbridas de sorgo foram desenvolvidas no fim  dos anos 50 e o suprimento de sementes foi rápida e eficientemente absorvido pelas empresas de sementes híbridas, a maioria das quais já estavam bem estabelecidas na produção de milho híbrido e suprimento de sementes.
 
   Poderosos agentes de mudança
   Várias razões importantes, isto é, agentes de mudanças, foram responsáveis pelas mudanças na produção de sementes que ocorreram, em grande, parte na última metade do século passado. Alguns destes agentes de mudanças foram mencionados e discutidos. Um dos primeiros e mais importante foi o desenvolvimento de variedades híbridas. A produção de sementes para variedades híbridas é complexa e ultrapassa a capacidade e da maioria dos agricultores, de modo que o “quem” e o “como” da produção de sementes mudaram dos agricultores para as empresas especializadas em sementes híbridas.
   A produção própria das sementes da maioria dos tipos de leguminosas, forrageiras e cereais tornou-se cada vez mais inconveniente, resultando no “quem” produz as sementes ter mudado para as empresas e agricultores locais. Por sua vez, sérios problemas de confiabilidade e qualidade encontrados na produção local de sementes levaram a uma mudança no “onde” elas eram produzidas para áreas com climas bastante favoráveis para a produção de altos rendimentos de sementes de alta qualidade e livres de doenças, embora fossem muito distantes de onde muitas das culturas são cultivadas.
   Os dois agentes de mudanças mais significativos e amplamente reconhecidos, que influenciavam o quem, onde, e como da produção de sementes, tornaram-se operantes durante as três últimas décadas do século XX. Primeiro, houve a promulgação e a implementação de leis - proteção de variedade vegetal (PVP) - que contemplavam a propriedade ou os direitos proprietários das variedades de culturas aos indivíduos, instituições e/ou empresas que as desenvolveram.
   Embora a isenção de um fazendeiro não permitisse a produção de sementes em campo, a proteção provida pela PVP dava os incentivos para investimentos mais pesados do setor privado na seleção e desenvolvimento das principais culturas com autopolinização - por exemplo, soja, trigo, algodão, etc., com o resultado de que estas atividades tinham sido quase totalmente assumidas pelas empresas privadas no fim da década de 80. Segundo, o extraordinário progresso na biologia molecular vegetal e a genética recombinante resultaram no desenvolvimento e lançamento de variedades transgênicas de algodão, soja, milho, canola e outras culturas no começo dos anos 90.
   A maioria destas variedades tem dupla proteção de PVP e patentes. As variedades patenteadas não têm a isenção dos agricultores, e a produção de sementes por qualquer um além do proprietário licenciado é proibida.
 
   A situação atual
   No caso das variedades transgênicas e híbridas, bem aceitas e largamente cultivadas, e as variedades convencionais da maioria das lavouras de leguminosas, forrageiras e cereais, as mudanças na produção de sementes estão essencialmente concluídas nos países agricolamente desenvolvidos. A produção de sementes próprias, o sistema tradicional de suprimento de sementes, está rapidamente se desfazendo ao longo da história. Como um resumo, as mudanças na produção destes tipos de sementes podem ser agora reformuladas na forma de três questões: Quem produz sementes atualmente? - Os proprietários das variedades e seus licenciados.
   Onde as sementes são produzidas? - Em locais determinados pelos proprietários como os mais econômicos e/ou ecologicamente favoráveis. Como as sementes são produzidas? - Por técnicos altamente preparados, usando o melhor equipamento e procedimentos de garantia de qualidade, sob manejo profissional. Em países onde as circunstâncias e o desenvolvimento possibilitaram tais mudanças na produção de sementes, seu impacto foi bastante favorável, apesar de alguma oposição e temores. Porém, nos países com desenvolvimento inadequado e infra-estrutura marginal, sua implementação deverá ser sem pressa, cuidadosa e muito seletiva.

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