Todo ensaísta tem um pouco de futurólogo. Se não tiver, por falta de competência técnica, faz de conta que possui e pronto. Existe uma ânsia incontida do ser humano de que olhando de onde se está e como as informações “privilegiadas” de que supomos dispor seremos capazes de enxergar o que os demais não percebem. E isso se intensifica exatamente no final ou no início de cada ano, assim como por encanto, talvez em função dos sortilégios do Natal.
Mas isso não ocorre sem razão. De outro lado, o leitor interessado no agronegócio, por exemplo, tem esperança, por mais velada que seja, de que alguém escreva sobre o que virá pela frente, principalmente em relação ao clima e o mercado. Exatamente duas áreas de prognóstico controverso e de alta probabilidade de insucesso. Assim, ao se arriscar a prognosticar o que virá no agronegócio, assume-se temeridade dupla.
Com coragem contida proponho algumas observações do presente e também para o ano que se inicia. É bom lembrar, entretanto, que no agronegócio, o de produção pelo menos, o ano agrícola está mais para o meio do que para encerrar este ou começar outro. Mas de qualquer sorte, vamos utilizar com cautela o ano civil, adotado pelo restante das organizações como balizador temporal das atividades.
Mais Mercado do que Clima
Há algum tempo, o sentido lógico de ano bom e ruim na agricultura se atinha à questão climática, considerando o jugo da sorte e o empirismo como era tratada. Normalmente, as informações eram incipientes, coletadas apenas através da observação dos produtores e menos afeitas a indicadores emprestados da cientificidade.
Agora, o clima e os seus riscos são bastante conhecidos em quase todas as regiões onde a agricultura é praticada ou se pretende praticar. À custa de mapas pluviométricos detalhados, isoietas, simuladores e outras ferramentas do gênero, muita informação e conhecimento estão disponíveis para melhorar o nível de assertividade na implantação de culturas e criações.
Contudo, o clima sozinho não tem mais o peso nas decisões como há algum tempo, posto que as informações de mercado assumiram importância suficiente para, junto com as estratégias de gestão, colocar o produtor no azul, crescendo, ou na berlinda.
O mercado é uma variável dependente do clima e da demanda, aos quais, por isso, está intimamente ligado. Mas essa interdependência não é diretamente proporcional, uma vez que também a estratégia de gestão pode fazer com que, mesmo em anos de clima desfavorável, o produtor possa obter bons resultados – assim como ano de clima excepcional também não é garantia de sucesso e lucratividade.
Isso significa que, diferente do que antes, observar o clima requer atenção às principais regiões produtoras da sua atividade, e entender, por consequência, a sua influência sobre o mercado do seu negócio. Num resumo raso seria ‘entender o global para atuar no local’. O ano que se inicia deverá ser característico para confirmar ou refutar essa máxima, principalmente em função do histórico recente que experimentamos no país, de clima complicado em algumas regiões, compensado por preços acima da média ou nunca antes imaginados.