Proteção de Cultivares

Edição III | 02 - Mar . 1999
James Delouche-JCDelouche@aol.com
    A adoção da Lei de Proteção de Cultivares para variedades superiores e o surgimento da UPOV (organização internacional para proteção de cultivares) foram eventos revolucionários na história da agricultura.

     Direitos X Direitos
    Nos termos do acordo comercial para aspectos relacionados à proteção de cultivares, os países membros da OMC (Organização Mundial do Comércio) são obrigados a providenciar proteção via patente em todos os campos da tecnologia, para qualquer invenção, produto ou processo. No caso de plantas, entretanto, é permitido excluir a obrigação de patenteá- las, desde que a proteção seja auferida por um efetivo sistema sui generis que confirma legalidade. Esses termos da OMC estão previstos para revisão neste ano de 1999. Em geral, assume-se que a adoção da convenção de 1978 ou 1991 da UPOV satisfaz os requerimentos de proteção sui generis da OMC, desde que se exclua as espécies comuns contidas na maioria das legislações de proteção de cultivares e permitida pela UPOV.
   É surpreendente que a implementação da lei de proteção de cultivares fosse, com o passar do tempo estimular a promoção de direitos essencialmente opostos. A conferência da FAO de 1983 adotou a internacionalização dos recursos genéticos vegetais, anunciando o princípio universal, segundo o qual os recursos genéticos são uma herança da humanidade e assim deveriam ser disponíveis sem restrição. Como esse princípio foi anunciado em 1983, 10 anos após a promulgação da primeira convenção da UPOV e há mais de uma década de implementação da lei de proteção de cultivares em muitos países europeus, houve incompatibilidade com os direitos auferidos por muitas legislações nacionais sobre proteção de cultivares. Entretanto, a proteção auferida pela UPOV foi considerada compatível com o enunciado da FAO, resultando na criação do reconhecimento do direito do agricultor, inclusive com a idéia de criar-se um fundo internacional para recursos genéticos para implementação desses direitos.

     “A internacionalização dos recursos genéticos vegetais, embora regulada pela UPOV, deve reconhecer a soberania dos países sobre suas cultivares.”

    Na convenção da UPOV de 1991, o enunciado da FAO foi considerado, reconhecendo-se que os países têm a soberania sobre seus recursos genéticos. Interessante observar que a proteção não se aplicava para o agricultor que guardava sua própria semente. Os países da comunidade européia colocaram em suas legislações que a proteção de cultivares não se aplica para pequenos agricultores e os outros estão também discutindo calorosamente a situação das empresas agrícolas que guardam suas próprias sementes. Assim, como o enunciado internacional da FAO não possui legalidade, é ignorado quando aparece conflitos sobre a proteção de cultivares.
     As discussões sobre direitos naturais também estão voltadas para a comunidade indígena, comunidade de pequenos agricultores, plantas medicinais e de cerimônia.

     Projetando situações
    Algumas pessoas acreditam que a implementação da proteção de cultivares, de acordo com a OMC e a convenção de 1991 da UPOV, irá substituir o teste de cultivares e os requerimentos de registro para produção e comercialização de sementes. Isso irá tirar do estado o importante papel de orientar e proteger a agricultura. Essa visão parece incorreta, pois o país poderá requerer que as variedades sejam testadas e registradas antes de sua produção e comercialização, independente de sua proteção sob a OMC, UPOV ou patente. Assim, o registro de cultivares pode ser utilizado para proteger o interesse do agricultor e ser usado como barreira não alfandegária para materiais estrangeiros.
     Atualmente alguns países permitem proteção via patente para processos genéticos, gens e sistemas de gens, além da tradicional proteção via UPOV. Outros países excluem as cultivares, inclusive as transgênicas, de serem patenteadas. Essas diferenças irão acarretar crescentes problemas. Outro assunto polêmico é a cultivar essencialmente derivada, conceituada na convenção da UPOV de 1991. Esse conceito poderá ser difícil de implementar em muitas ocasiões, considerando as semelhanças entre cultivares, mesmo utilizando os procedimentos de identificação genética (DNA) disponíveis. Finalmente, o tradicional critério de DHE (diferente, homogênio e estável) para as plantas necessita ser atualizado. Algumas cultivares modernas são selecionadas mais por sua heterogeneidade para alargar sua base genética, para aumentar sua adaptação. A uniformidade necessita ser substituída por identificável e a estabilidade necessita ser abrandada e limitada no tempo.
     Com certeza, a criação de cultivares, produção e comercialização de sementes, está tornando-se muito mais complicada, em todos os aspectos, em relação à época que elegi trabalhar em ciência e tenologia de sementes, há 50 anos. Não consigo visualizar totalmente as mudanças para os próximos 50 ou mesmo 25 anos. Entretanto, estou certo de que as mudanças serão ainda mais revolucionárias e no mínimo desconfortantes para as pessoas de mais idade ou no fim de suas carreiras.

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