Congresso Brasileiro de Sementes

Os Caminhos da Pesquisa em Sementes

Edição III | 06 - Nov . 1999
Gladis M. Rota-gladismr@ufpel.tche.br
    Uma Visão Geral dos Trabalhos Apresentados no Congresso
    Setecentos e cinqüenta pessoas, interessadas em saber o que está acontecendo atualmente na área de sementes, participaram, em agosto, do XI Congresso Brasileiro de Sementes (CBS), realizado em Foz do Iguaçu, PR. Durante o evento, foram apresentados 368 trabalhos técnicos, tratando de diversos temas, como produção, tratamento, análise, beneficiamento, secagem e armazenamento de sementes, entre outros.
    Os trabalhos possibilitaram uma visão geral do que a pesquisa em sementes no Brasil tem realizado, quais os problemas mais estudados, quais as culturas alvo da pesquisa e o que está surgindo de novo nesta área fundamental para a agricultura. Vigor de sementes, controle de qualidade e pós-colheita, foram os assuntos onde se verificaram a maior quantidade de trabalhos neste último congresso, sendo soja e milho, seguidos por arroz e feijão, as culturas mais estudadas.
    Alguns trabalhos voltaram-se para a avaliação da qualidade das sementes produzidas no País nos últimos anos, mostrando os problemas existentes. Nos estados produtores de soja (PR, MG, RS e GO), foi observado que a deterioração das sementes por umidade é um grande problema e que a diminuição da qualidade fisiológica deveu-se principalmente aos danos mecânicos, sendo que lesões causadas por ataque de percevejos não chegaram a comprometer a qualidade. Além das quebras, os elevados índices de dano mecânico e de ruptura do tegumento das sementes de soja afetaram drasticamente a qualidade física da semente produzida. Geralmente, estes problemas estão diretamente relacionados com ajustes não adequados do sistema de trilha das colheitadeiras, demonstrando a importância da regulagem das máquinas utilizadas.
   Quando analisadas as características de mercado e de tecnologia associadas com sementes de soja no estado do RS, das safras 96 a 99, a boa notícia é que aumentou a participação de variedades lançadas por programas de melhoramento e com menos de 10 anos no mercado, em detrimento de antigas introduções e com mais de 30 anos no mercado, enquanto tem diminuído lentamente a utilização de sementes não fiscalizadas na formação de lavouras em todo o estado.
    Este tipo de levantamento de dados é fundamental, uma vez que a identificação dos problemas já é o primeiro passo para sua solução. Neste sentido, foi igualmente realizada uma avaliação crítica da utilização de sementes de feijão e trigo no Paraná, mostrando que a taxa de utilização de sementes de feijão foi de 10% e de trigo, 95%. Ficam as questões: existe um descompasso entre as cultivares demandadas pelo mercado e as produzidas pelo setor sementeiro? O uso de sementes próprias de feijão em larga escala é em função da falta de acesso às sementes comerciais? O uso de sementes próprias tem reduzido o custo de produção, possibilitando assim maiores ganhos por parte dos agricultores?
    A crescente conscientização da sociedade pelos problemas ecológicos vem aumentando muito o interesse pela produção de sementes de espécies florestais, tanto para reflorestamento como para recuperação de áreas degradadas. Várias pesquisas têm sido desenvolvidas nestas espécies, devido a falta de conhecimentos mais profundos sobre a morfologia, germinação e dormência de suas sementes.
    Foram apresentados estudos sobre as condições ideais para germinação de sementes de várias espécies: medicinais, florestais, ornamentais e frutíferas, assim como os testes de vigor mais adequados para avaliar sua qualidade. É de grande importância este tipo de estudos, uma vez que a propagação por sementes em escala comercial de muitas espécies esbarra em dificuldades relacionadas à falta de um maior conhecimento dos fatores que estimulam ou que inibem a germinação das sementes, assim como os procedimentos para superação da dormência apresentada por sementes de várias espécies nativas.
    Cerca de 50 trabalhos foram apresentados sobre a determinação de condições ideais para germinação de sementes de diversas espécies, sendo avaliadas temperatura, luminosidade, substrato e período de duração dos testes em laboratório. Os resultados obtidos são fundamentais para uma avaliação mais acurada do potencial germinativo das sementes em laboratório. Também para espécies frutíferas, ornamentais e florestais, é muito importante o conhecimento dos fatores que influenciam sua germinação visando maior produção de mudas para viveiros comerciais e/ou reflorestamento.
    A dormência das sementes, apesar de ser um mecanismo importante para a preservação das espécies em seu habitat natural, pode trazer problemas na avaliação da qualidade das sementes em laboratório e também no estabelecimento de um estande uniforme no campo. Pensando nisso, vários pesquisadores dedicaram-se a estudar tratamentos para superação da dormência. Foram testados vários tipos de tratamentos em sementes de várias espécies, tais como imersão em água quente, uso de baixas temperaturas, escarificação mecânica ou com ácido sulfúrico, pré-secagem, uso de ácido giberélico, tratamento com Nitrato de Potássio, pré-esfriamento, com resultados diversos.

    Pré-tratamento de sementes
    Atualmente, a pesquisa em sementes tem se dedicado muito ao estudo dos diversos tipos de prétratamentos que podem ser utilizados para aumentar a percentagem de germinação, a velocidade de emergência e melhorar o desenvolvimento inicial das plantas, favorecendo o estabelecimento da lavoura e dando à espécie cultivada vantagem em relação às plantas invasoras. Entre estes pré-tratamentos, temos a aplicação de micronutrientes, de reguladores de crescimento vegetal (como o ácido giberélico), tratamento com fungicidas, ácido salicílico e condicionamento osmótico das sementes.
    Esta último tem sido utilizado principalmente em sementes de hortaliças e flores, com o objetivo de acelerar a germinação e uniformizar a emergência das plântulas em campo, especialmente em condições adversas. Vários experimentos têm sido conduzidos para verificar as condições mais adequadas para realização deste tratamento, sendo observado que sementes de alface, pimentão, melão, tomate, cenoura, cebola, cedro e canafístula apresentam maior rapidez e percentagem de germinação após o condicionamento osmótico. Pelos resultados obtidos até o presente, vale a pena seguir investindo em estudos sobre esta técnica, principalmente levando em conta o alto preço de sementes de flores e hortaliças.

    Testes de vigor
    Os testes de vigor constituem-se em uma ferramenta de uso cada vez mais rotineiro nos programas de qualidade de sementes. Testes, tais como o de condutividade elétrica das sementes, envelhecimento acelerado, teste de frio, teste de tetrazólio e deterioração controlada, tiveram sua eficiência comprovada em diversas culturas, além de terem estabelecidas quais as condições mais adequadas para sua execução, principalmente em termos de temperatura e período de duração dos mesmos.
    As empresas de sementes, devido à crescente demanda por sementes de alta qualidade e à competitividade do mercado, necessitam de testes que, além de eficientes, possibilitem a obtenção de respostas rápidas para agilizar o processo de tomada de decisões relacionadas ao manuseio e comercialização das sementes. O teste de tetrazólio tem sido adotado rotineiramente em muitas empresas e a pesquisa continua estudando as condições mais indicadas para diferentes espécies e formas de diminuir seu período de realização para obtenção de resultados mais rapidamente. No caso de sementes de soja, por exemplo, foi determinado que o período de pré-embebição das sementes pode ser reduzido de 16 para 6 horas/41ºC. Para a soja, o teste de tetrazólio é um dos mais completos para avaliação da qualidade, uma vez que fornece informações sobre viabilidade, vigor, índice de danos mecânicos, de deterioração por umidade, e de danos de percevejo.
   O teste de condutividade elétrica foi considerado um teste de vigor muito eficiente na detecção da deterioração das sementes de muitas espécies, como soja, milho, feijão, pimentão e arroz. Quanto ao teste de envelhecimento acelerado, um dos principais problemas com relação à sua adoção diz respeito a reprodutibilidade dos resultados, uma vez que os equipamentos em uso pelos diversos laboratórios nem sempre proporcionam umidade relativa e temperatura adequadas durante a condução do teste. Além disso, ainda não existe um consenso sobre as condições ideais para as sementes de espécies diferentes. Outro teste de vigor cuja metodologia mais adequada ainda está sendo avaliada é o teste de frio, utilizado para sementes de milho, soja, feijão, algodão. Foram propostas algumas metodologias alternativas para a realização deste tipo de testes.

    Produção de Sementes
   Sabe-se que as várias práticas utilizadas no manejo da lavoura influenciam a produção de sementes. Porém, os efeitos que a adubação pode apresentar sobre a qualidade das sementes produzidas ainda é um assunto controverso. Cerca de 20 trabalhos, com diversas espécies, dedicaramse a este estudo e os resultados foram muito variados. Algumas conclusões, contudo, podem ser apresentadas: a época mais indicada para aplicação de nitrogênio em aveia-preta, visando maior produtividade, é quando a planta está na fase de perfilhamento; uréia é a fonte de nitrogênio mais adequada para obtenção de sementes de feijão de alta qualidade; a adubação potássica em canola produz sementes com maior potencial de armazenamento; a aplicação de silício aumenta a produtividade de lavouras de arroz de sequeiro e aumenta o vigor das sementes produzidas, entre outros resultados de possível aplicação prática imediata.
    Quanto a aplicação de produtos na lavoura, foi apresentado um trabalho mostrando que plantas de arroz irrigado tratadas com ácido giberélico (Pro-Gibb), no estádio de florescimento pleno, apresentam aumento de produtividade, devido ao maior peso de mil sementes e percentagem de grãos cheios por panícula.
    Cerca de 10% da área cultivada com soja no Brasil recebe a aplicação de dessecantes foliares para antecipar a colheita e também com o objetivo de obtenção de sementes de maior qualidade.
   A pesquisa concluiu, porém, que não há embasamento técnico para esta recomendação objetivando produção de sementes com maior germinação e vigor. O manejo da irrigação da lavoura para obtenção de sementes com maior qualidade fisiológica foi estudado em arroz de sequeiro, arroz irrigado, soja e sorgo granífero. Entre os diversos resultados apresentados, temos que a irrigação por aspersão em arroz leva à maior produtividade e à produção de sementes com maior germinação e vigor do que aquelas produzidas sob condições de sequeiro.
   A colheita é um dos momentos cruciais da produção de sementes, sendo importante sua realização na época certa e com as colheitadeiras bem reguladas. No Paraná, foi realizada uma avaliação dos desperdícios durante a colheita mecânica da soja, detectando-se que o copo medidor é pouco utilizado em muitas regiões, onde um percentual elevado de produtores ainda considera razoável perdas em torno de duas sacas por hectare. Ficou assim evidenciado que, apesar da disponibilidade de uma tecnologia simples, eficaz e econômica, ainda persiste o erro de não utilizá-la para monitorar as perdas durante a colheita.
    A escolha da melhor época para realizar a colheita, de forma a obter-se sementes com a mais alta qualidade possível, foi objeto de muitas pesquisas, tendo sido estudada a época indicada para colheita de sementes de algodão, feijão, teosinto, crotalária e também de algumas espécies ornamentais.

    Secagem, beneficiamento e armazenamento
    A tecnologia de pós-colheita foi tema de diversos trabalhos apresentados no congresso. Quanto a secagem de sementes, constatou-se que sementes de arroz irrigado submetidas à secagem intermitente apresentam qualidade fisiológica superior àquelas submetidas à secagem estacionária. Recomenda-se especial atenção na fase final da secagem de sementes de arroz, quando há uma tendência de aumento da percentagem de sementes fissuradas e de redução da percentagem de grãos inteiros.
    Em avaliação do desempenho dos equipamentos usados no beneficiamento de sementes de arroz, com a finalidade de melhorar o processo de obtenção de sementes de alta qualidade em nível de pós-colheita, com o mínimo de perdas e o máximo rendimento dos equipamentos, concluiu-se que há necessidade de mecanismo que controle melhor a alimentação das máquinas. Dados interessantes são que na máquina de ar e peneiras são removidos 50% dos materiais durante o beneficiamento.

    
    As sessões técnicas caracterizaram-se pela alta qualidade dos trabalhos apresentados.
 
   Vários pesquisadores dedicaram- se ao estudo das condições ideais, em termos de embalagem, temperatura e umidade relativa, para armazenamento de sementes de diversas espécies: soja, algodão, arroz, amendoim, café, azevém-anual, melão, mamão, melão, abóbora, acerola, canola, gergelim, maracujá, canafístula, ipê-roxo, jacarandáda- bahia, monjoleiro, tapirira, seringueira, pau-santo, ipê-amarelo, cumaru, mentrasto, jucá, peroba-de-gomo, guatambu-vermelho, paineira. Cada cultura exige condições específicas para que as sementes possam manter sua qualidade no armazenamento.
    A incidência de microrganismos em armazenamento é um dos fatores que leva à diminuição do potencial germinativo das sementes. Além de afetar a qualidade das sementes, os patógenos fazem com que estas constituam-se em fonte de inóculo primário nas lavouras, sendo o tratamento de sementes com fungicidas uma prática recomendável, pois além de reduzir o inóculo primário, protege as plântulas em uma fase bastante suscetível ao ataque de patógenos. Vários fungicidas e diferentes misturas de produtos tiveram avaliada a sua eficácia no tratamento de sementes, em culturas como milho, sorgo, soja, feijão, algodão, paineira... Em geral, é obtida maior preservação da qualidade fisiológica das sementes com a aplicação de fungicidas.
    A relação das propriedades físicas das sementes com sua qualidade fisiológica também recebeu atenção no CBS, revelando que sementes de soja com tegumento preto apresentam melhor qualidade fisiológica e sanitária do que aquelas de tegumento amarelo, enquanto sementes rajadas de branquilho, espécie utilizada para enriquecimento de matas, germinam mais do que as sementes escuras e claras. Logo, quando o assunto é sementes, a cor pode ser documento...

 
Também colaborou nesta matéria Prof. Silmar T. Peske / UFPel.  

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