Pesquisa Científica

Edição VIII | 02 - Mar . 2004
Francisco Amaral Villela-francisco.villela@ufpel.edu.br
Nilson Lemos de Menezes-nmenezes@ccr.ufsm.br
    “A pesquisa científica requer, freqüentemente, elevados investimentos, tanto no que se refere à formação de pesquisadores, quanto às condições materiais para o seu desenvolvimento.”    
                   
    A pesquisa científica exige, muitas vezes, trabalho árduo do pesquisador. Mas nem sempre os resultados revelam esses fatores. Recente pesquisa de opinião sobre a percepção pública da ciência revelou importantes informações sobre o grau de compreensão do conhecimento científico e tecnológico e, também, sobre o consumo da informação científica nas sociedades consultadas. Entretanto, esse levantamento indicou que prevalece a imagem da ciência como fonte de melhoria da vida humana. Porém a grande maioria das pessoas ouvidas consideram-se pouco informadas sobre ciência e tecnologia, confirmando resultados de pesquisas anteriormente realizadas em diversos países.               
    Investimentos em ciência e tecnologia, sejam dos governos, sejam da iniciativa privada, bem como a persistência e competência dos pesquisadores, podem determinar altos níveis de eficiência econômica e de produtividade.               
    A produção de conhecimento não ocorre isoladamente pois compreende construção coletiva da comunidade científica, sendo um processo continuado de busca, que pode ser corroborado ou contestado por pesquisas subseqüentes, daí o caráter hipotético permanente de seus resultados. O trabalho científico requer, além de rigor, criatividade. Não se trata apenas de conhecimento acumulado, mas também de colaboração no desenvolvimento da ciência. Nesse caminho, exige-se lógica e competência.               
     A pesquisa científica não é uma atividade caótica, é uma investigação sistemática que contém critérios e instrumentos adequados. Exige um espírito crítico permanente com o mundo político, social e econômico que a envolve. A clareza e a exatidão são requisitos essenciais à pesquisa e compõem o método científico, que proporciona ao pesquisador a orientação geral para o planejamento, a execução e a interpretação dos resultados. A seriedade, a honestidade e o conjunto aprimorado de conhecimento do pesquisador concorrem para o estabelecimento e à confiabilidade da pesquisa.               
    O método científico é um conjunto de processos pelos quais se constrói a ciência. Envolve técnicas e procedimentos que vão prescindir da inteligência do pesquisador, para a compreensão dos fenômenos. Toda investigação decorre de algum problema observado. O pesquisador ao utilizar a imaginação criativa e o conhecimento disponível propõe a hipótese, ou seja, a solução provisória que norteará o processo de investigação.                
     A experimentação compreende o conjunto de procedimentos para a verificação da hipótese, buscando estabelecer relações. A eficiência do método empregado e a precisão dos dados coletados são componentes essenciais para o sucesso da pesquisa. O pesquisador, utilizando formação e maturidade intelectual bem como capacidade de análise, comparação e síntese, elabora as conclusões.                
    Na área agronômica, os objetivos da pesquisa são muito amplos, mas fundamentalmente refletem busca de benefícios econômicos com vista à satisfação das necessidades e progresso da sociedade. A produção científica nas últimas décadas pode ser considerada extraordinária. Os avanços em biotecnologia, por exemplo, tornaram possível a modificação genética com a alteração, adição ou remoção de determinadas características de uma planta. Cabe salientar, que em muitos países os princípios da biossegurança monitoram a pesquisa, quantificando e regulando riscos e benefícios, levando em consideração a bioética.                
     Os resultados da pesquisa, ao serem incorporados no processo produtivo, elevam a produtividade dos fatores de produção, que por sua vez, expandem o produto total da agricultura. O retorno social e econômico da pesquisa científica e tecnológica ninguém questiona, porém dados concretos são apresentados para sua comprovação.                
    No Brasil, de 1971 a 2001, a cultura da soja cresceu 1700%. No último ano, o país exportou 26 milhões de toneladas, tornando-se o maior exportador mundial de grãos desta leguminosa. Uma das causas do crescimento no cultivo de soja nas últimas décadas é o uso de cultivares melhoradas portadoras de genes capazes de expressar alta produtividade, ampla adaptação e boa resistência a fatores adversos. O desenvolvimento de cultivares de soja com adaptação edafo-climáticas das principais regiões do país e o uso de sementes de alta qualidade influenciaram diretamente no sucesso da lavoura.

    
    Processo de marcação de plantas para minimizar a variação dos dados

    
    Proteção da flor masculina e feminina de milho: fruto do esforço científico
 
             

    Na cultura da batata, quase 80% da semente de alta sanidade utilizada no Brasil é importada, a um custo anual de U$ 9 milhões. A batata semente importada representa 35 a 40% do custo de produção da lavoura por hectare. A par desta situação, foi desenvolvida uma técnica de aproveitamento do broto para a produção de minitubérculos, utilizando como matéria-prima a batata semente importada. O uso de minitubérculos reduz 40% o custo no plantio, o que possibilitara a diminuição do número de importações.               
    Técnicas moleculares baseadas na análise de proteínas e DNA têm sido aplicadas nas pesquisas agrícolas, o que tem permitido rápidos avanços nos estudos sobre qualidade de sementes. As isoenzimas apresentam variações em função dos estádios de desenvolvimento ou deterioração das sementes e podem ser utilizadas como marcadores de dormência, germinação e deterioração das sementes. Os métodos baseados em PCR (reação em cadeia da polimerase), tais como RAPD, ALFP e SSR, que utilizam o DNA, têm sido preferencialmente usados para identificação, caracterização de cultivares e determinação de pureza genética em lotes de sementes. A análise de imagens, apesar do elevado custo dos equipamentos, a partir de radiografias de raios - X, já é uma realidade para a determinação da qualidade das sementes, que assegura grande precisão.           As imagens radiográficas são examinadas uma a uma de modo ampliado, indicando detalhadamente as condições das sementes. Posteriormente, as sementes submetidas aos raios-X são levadas ao teste de germinação e desta forma, é possível o estabelecimento de possíveis relações entre as imagens e as ocorrências na germinação.               
    A imagem digital de raios-X serve para avaliar a morfologia do eixo embrionário e tecido de reserva. É utilizada para identificar danos mecânicos, de secagem e ataque de insetos, além dos danos externos e internos. Também permite observar danos por umidade e por percevejo. Em sementes de arroz, a grande vantagem do teste de raios- X é a identificação das fissuras ocasionadas pela secagem com altas temperaturas. 

    “PESQUISA CIENTÍFICA: Trabalho, criatividade, confiabilidade, abrangência, recursos e benefícios.”            
        
    A pesquisa na área de sementes, além de exigir todo rigor científico, pode ser também ser muito trabalhosa, principalmente a de campo. Exemplo disto é o estudo da maturidade fisiológica em uma determinada espécie. Todos os cuidados de preparo de solo e manejo da cultura, assim como, preventivamente, controles de pragas e as doenças devem ser rigorosamente seguidos.                
    No momento da antese, as plantas devem ser marcadas para o estudo. O número de plantas usado é variável, em função do número de sementes por planta, das avaliações a serem executadas e da precisão requerida no experimento e pode atingir 4000 a 5000 plantas. As colheitas devem ser realizadas em intervalos de 4 a 7 dias e deverão cobrir todo o período reprodutivo da cultura. A cada colheita, um número de plantas deve ser coletado para as avaliações planejadas, a fim de acompanhar a maturação das sementes. No laboratório, o material proveniente de cada colheita é submetido a determinação de teor de água, tamanho ou volume, massa seca, germinação e vigor, empregando um grupo de testes e composição química. As chuvas, ataque de doenças, animais, ventos fortes e outras condições adversas são freqüentes na fase de campo e podem inviabilizar o experimento, caso contrário, o grande volume de dados deve ser tabulado, analisado e interpretado.               
    A conclusão, por exemplo, de que o máximo vigor das sementes de sorgo é alcançado aos 45 dias após a fecundação, com umidade em torno de 30%, não dá a idéia do volume de trabalho executado. A pesquisa científica não é barata, mesmo a de simples execução ou realizada em períodos curtos tem custos elevados, pois envolve equipamentos, reagentes, materiais biológicos e mão-de-obra especializada.               
    Os grandes projetos realizados em rede de cooperação científica envolvem grandes investimentos. A pesquisa sobre o genoma da bactéria Xylella fastidiosa, causadora da praga do amarelinho, que ataca a laranja, foi orçada em U$ 15 milhões. O custo da pesquisa é uma limitação ao desenvolvimento científico e tecnológico. Há um relativo consenso que os países em desenvolvimento investem pouco em pesquisa agrícola, com exceção de algumas nações asiáticas, evidenciando assim que a produção científica está na dependência direta dos investimentos aplicados, e que o insuficiente apoio governamental configura- se como um dos principais fatores de inibição de maior desenvolvimento científico e tecnológico de um país. Embora se possa pretender a universalização do conhecimento científico e tecnológico, é inegável que sua recepção, apropriação e utilização são processos localizados socialmente e dependentes tanto das especificidades culturais de cada sociedade, quanto da realidade social, histórica e concreta destas sociedades.               
   De qualquer forma, embora exista disponibilidade de recursos necessários à pesquisa científica, pesquisadores capacitados, criativos e dispostos a abraçar o árduo labor científico, há necessidade de outros mecanismos capazes de permitir que a sociedade usufrua plenamente dos resultados alcançados pela pesquisa. 
                
    RESUMO               
    A pesquisa utiliza procedimentos lógicos e sistemáticos na compreensão e transformação da realidade, a fim de elaborar novos conhecimentos.                
   Essa atividade requer do pesquisador curiosidade, conhecimento científico, criatividade e persistência. A adequação metodológica e a isenção na análise interpretativa dos dados asseguram um componente indispensável, a confiabilidade da pesquisa. A contribuição da pesquisa agrícola tem permitido ganhos substanciais de produtividade pela otimização no uso de sementes e máquinas, pela eficiência no controle fitossanitário e pelo aprimoramento das tecnologias de secagem e armazenamento. A exemplo disso, no Brasil, nas últimas três décadas, a produção de soja apresentou aumentos expressivos, decorrentes do desenvolvimento de cultivares adaptados às regiões de produção, acompanhados da utilização de sementes de alta qualidade. Os resultados de pesquisa, no entanto, nem sempre refletem o esforço despendido, o investimento realizado e, às vezes, nem mesmo sua importância na construção do conhecimento.

 
    Esta matéria foi solicitada aos Professores Nilson Lemos de Menezes, da Universidade Federal de Santa Maria, e Francisco Amaral Villela, da Universidade Federal de Pelotas, ambos pesquisadores bolsistas do Conselho Nacional de Pesquisas Tecnológicas (CNPq), para sensibilizar os leitores da SEED News sobre o trabalho envolvido, a criatividade, a confiabilidade dos resultados e os recursos necessários para obter-se um produto ou desenvolver um processo.  
 

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