O Negócio Sementes no Paraguai

Edição VIII | 05 - Set . 2004
José Arnando Paiva Aguero-japaiva@hotmail.com
Luís Enrique Arréllaga Acosta-learrelaga@gesgolondrina.com.py
   O Paraguai, país mediterrâneo com 406,7 mil km2, apresenta duas regiões com capacidades agroecológicas muito diferentes: a região ocidental, que ocupa cerca de 60% do país e cuja principal atividade é a pecuária, e a região oriental, onde se encontrava a maior parte dos bosques tropicais com madeira de alto valor comercial, que, a partir de 1945, foram dando lugar aos campos agro-pastoris desta região. Nessa última é produzida a quase totalidade dos cultivos agrícolas para consumo e para exportação.                
    O principal cultivo em termos de superfície é a soja, ainda que o algodão continue ocupando, econômica e socialmente, um lugar preponderante no país.      
           
    Produção de sementes                
    A indústria de sementes nacional passou a apresentar um desenvolvimento mais expressivo a partir da década de 80, implementando-se normas de fiscalização da produção, inclusive com um sistema de certificação de qualidade por meio do uso de selos aplicados temporariamente pela Direção de Sementes, entre os anos 1991-92, sistema que voltou a ser implementado a partir de 1999, em um acordo entre o DISE e a Aprosemp. Este acordo levou a uma diminuição do comércio de "bolsa branca" e a uma grande melhoria na qualidade das sementes produzidas. O trabalho conjunto do setor público e privado, por sua vez, diminuiu a entrada de sementes de países vizinhos sem a devida autorização e fiscalização. Atualmente, a produção nacional de sementes supre 35% das necessidades dos principais cultivos.   
              
    Cifras do comércio de sementes                
    Na década passada, o uso de sementes próprias chegava a 50% do total utilizado pelos agricultores, sendo os outros 50% repartidos igualmente entre a produção interna e a importação. Através do esforço do setor, essa situação foi revertida, sendo que atualmente estamos superando amplamente às sementes importadas. Porém, isso não deve fazer com que nos acomodemos, já que ainda existe uma fração importante de sementes de diferentes espécies com déficit de provisão. O valor estimado das importações de sementes chega a US$ 13,9 milhões anuais, soma essa que poderia formar parte do PIB nacional. O valor do produto dos "sementeiros" nacionais alcança 24,4 milhões de dólares, enquanto o valor total do que é semeado gira em torno de 70 milhões de dólares.
·      Autosuficiência - Deve constituir-se num dos principais objetivos, tanto para os produtores como para o setor governamental, fazer com que a produção de sementes a ser utilizada para semeadura seja obtida internamente, principalmente para aqueles cultivos em que contamos com tecnologia, capacidade de produção e competitividade.              
·         Elevar o nível de penetração da semente fiscalizada.              
·        Regularização da semente geneticamente modificada (GM). O ingresso das sementes de soja transgênicas (soja RR), que atualmente estima-se ocupar 60-70% da superfície ocupada com soja, levou a uma drástica redução no comércio de sementes, uma vez que aumentou a produção própria.             
·         Enfatizar a produção para exportação daqueles cultivos nos quais temos qualidade e competitividade.               
·         Facilitar o comércio entre os países da região.     
                  
    Atualmente, o comércio fluído dos países vizinhos para o nosso país não tem encontrado reciprocidade. O Mercosul deve funcionar em uma "via de mão dupla" para os sócios da região.
               
    Sementes GMs               
   Devemos reconhecer que, devido à facilidade de introdução ilegal de produtos em nosso país, com a semente GM não foi diferente, particularmente com a soja. As primeiras sojas biotecnológicas (soja RR) introduzidas no Paraguai vieram da Argentina. Variedades não adaptadas às nossas condições foram cultivadas com pouco sucesso; porém, o constante ingresso de novos materiais genéticos que estavam sendo liberados no mercado do país vizinho, com características mais adequadas a nossas latitudes, permitiu que o agricultor paraguaio identificasse materiais de alta produtividade, que, no entanto, ainda são produzidos na ilegalidade.               
    No Paraguai, os produtores e comerciantes de sementes consideramos inadequada a situação a que nos submetem os organismos governamentais em razão do não reconhecimento de uma tecnologia que já está inserida em nosso país e é utilizada por uma grande parte dos agricultores. Não podemos continuar sendo o país onde a ilegalidade esteja institucionalizada.                 
    Ao liberar-se a soja RR, entrará em vigor a lei de sementes que prevê estas situações e deverão ser "legalizadas" as variedades que estão sendo utilizadas no mercado, que não estão registradas e que têm "seus proprietários" intelectuais.                
    Em alguns aspectos, podemos afirmar que a região já se apresenta como um "bloco produtivo" ante o comércio mundial. Esta situação nos facilita em variados aspectos, como a apresentação de reclamações em setores que nos afetam de maneira comum, como é o caso da semente de soja transgênica. Da mesma forma, nos permite trabalhar de maneira conjunta na detecção e pesquisa de doenças nas diferentes cultivares, propagadas geralmente através de sementes, e buscar processos de eliminação que sejam factíveis para todos.            
    
    Propostas do setor               
·         Regularização dos transgênicos através da Lei de Sementes, a fim de colocar a biotecnologia na legitimidade.               
·         Harmonização de sistemas de avaliação e registros; e que os mesmos sejam homologados por todos os países do Mercosul.               
·         Integração com setores de pesquisa, obtendo sinergias entre o caudal de conhecimentos, e o know-how entre produtores e comerciantes.                

    Parte legal               
    O Paraguai foi um dos primeiros a contar com uma legislação sobre Sementes e Proteção de Cultivares (1994), ainda que as regulamentações inerentes tenham sido sancionadas entre 1999 e 2000.       
         
    Registro Nacional de Cultivares Comerciais (RNCC)               
   As variedades, para serem utilizadas comercialmente, devem ser inscritas neste registro, cumprindo os requisitos de distinção, homogeneidade e estabilidade (DHE), e terem passado por testes de avaliação agronômica por, no mínimo, dois anos. Para inscrição nesse registro, exige-se, além da DHE, que os materiais tenham o caráter de novidade e contem com denominação adequada, tudo isso seguindo as linhas e critérios estabelecidos no Convênio da UPOV.

    

    Área dos principais cultivos no Paraguai                
    O Paraguai estendeu a proteção a todos os gêneros e espécies vegetais, tendo aberto até esta data oito espécies (algodão, alysycarpus, Digitaria milanjiana, Digitaria natalensis, mandarina, soja, tomate e trigo), com 66 variedades protegidas, sendo 15 nacionais e 51 estrangeiras, do Brasil (35), Argentina (10) e EUA (6). Exercem seus direitos quatro obtentores nacionais e sete estrangeiros.     
           
    Registro Nacional de Produtores de Sementes (RNPS)               
    Encontram-se registradas 94 empresas produtoras de sementes, entre pequenas, médias e grandes, que produzem em conjunto cerca de 60.000 t anuais de sementes certificadas, sendo as principais espécies: soja, trigo, aveia negra, algodão, sésamo, milho, arroz e forrageiras. Também tem-se registrado uma quantidade interessante de produção de sementes comuns de adubos verdes utilizados em sistemas mecanizados de semeadura direta, como aveia, nabo forrageiro, crotalária, lupino, e outras espécies mais adaptadas a pequenas propriedades, como mucuna cinza, mucuna anã, lupino, ervilha forrageira, etc.  
              
    Registro Nacional de Comerciantes de Sementes (RNCS)               
   Este registro tem inscritos 169 comerciantes de sementes distribuídos em todo o país, que sob supervisão de engenheiros agrônomos, constituem-se no principal canal de abastecimento de sementes e são quem assume a responsabilidade pela qualidade da semente entregue ao comprador final. Exige-se que todos os lotes de sementes a serem comercializados contem com o boletim de análise de sementes emitido por um laboratório habilitado.  
              
    Registro Nacional de Laboratórios de Sementes (RNLS)               
    Existem cinco laboratórios de análise de sementes que foram habilitados para funcionamento pelos padrões de credenciamento de laboratórios por acordo em nível de Mercosul.  
               
    Comentários finais               
   Atualmente, está vigente no Paraguai toda a normativa que permite a produção de sementes de acordo com os procedimentos e padrões utilizados em nível internacional. A isso soma-se o esforço das empresas produtoras de sementes que vêm utilizando, nos últimos anos, as melhores instalações de processamento e armazenamento disponíveis na região. Toda esta dinâmica, resultante da aplicação dos acordos regionais que facilitam o comércio de sementes contribuiu notavelmente para o desenvolvimento da indústria nacional. A presença de importantes referenciais de todo o Continente, obriga a assumir com maior responsabilidade o papel que cabe ao produtor de sementes, insumo que constitui fator elementar da agricultura.
 
Palestra apresentada no Seminário Panamericano de Sementes, Assunção/Paraguai

  

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