Ecologia sementeira

Edição X | 01 - Jan . 2006
James Delouche-JCDelouche@aol.com
    A ecologia era um assunto quase esquecido quando eu estava na faculdade. Fiz um curso sobre Lavoura Ecológica na graduação, mas me lembro que era mais geografia do que ecologia do cultivo. O curso tratava basicamente onde e como várias espécies eram cultivadas, com pouca atenção ao motivo porque elas eram cultivadas ou onde eram cultivadas, isto é,  por que o arroz é a maior cultura de grãos alimentícios nos sub-trópicos e trópicos úmidos, enquanto o trigo é uma cultura dominante em climas temperados e mais frios? Talvez, o professor sentisse que os motivos eram tão óbvios que não havia necessidade de considerá-los.             
    Enquanto aquela era a minha única exposição acadêmica formal à ecologia, muito tempo depois me dei conta de que havia muito de ecologia na fisiologia, bioquímica, botânica,  até mesmo genética e outros assuntos que eu tinha estudado, especialmente em biologia das  sementes. A ecologia já não é mais esquecida ou ignorada. Ela tornou-se cada vez mais  conhecida, popular e um assunto bastante em voga, uma vez que a preocupação com as  questões com o meio ambiente começaram sua ascensão a posições de alta prioridade nos  debates socioeconômico e político, em níveis nacional e internacional, cerca de 40 anos atrás,  e a ecologia e o ambiente passaram a ser vistos por muitos como sinônimos. Estas mudanças  têm aspectos bons e ruins.          É muito bom que a importância das configurações ambientais, isto é, a ecologia,  indo de desertos a terrenos alagadiços, de florestas à neve ártica, para o bem-estar dos  sistemas vivos, incluindo “a nós”, embora esteja tão amplamente reconhecida e apreciada,  infelizmente o zelo com as questões ambientais e ecológicas estão sendo consideradas e dirigidas de forma agressiva e simplista por alguns extremistas. Este, entretanto, é um assunto ambicioso demais  para esta edição, então vamos focar em algo menor, a semente.
               
     Papéis das sementes nos ecossistemas                   
    As sementes têm papéis cruciais na manutenção, regeneração e migração das populações e comunidades vegetais, incluindo as da agricultura. Ao desempenhar tais papéis,  beirando a perfeição, como fazem, as sementes revelam e mostram capacidades incríveis para  sobreviver às adversidades, adaptar-se a mudanças, e tirar vantagem de oportunidades  para aumentar seu número, distribuição e capacidade competitiva.              
     A ecologia e a fisiologia da semente fundem-se na eco fisiologia em muitas das reações das sementes às configurações ambientais e suas interações com vários componentes do meio  ambiente. Na agricultura, a ecologia ou eco fisiologia da semente está especialmente preocupada com o desempenho das sementes em qualquer variedade avançada ou tradicional. Obter um desempenho bom ou pelo menos aceitável das sementes foi,  talvez sempre, visto como o primeiro passo crucial na produção das lavouras. Historicamente, grande parte da tecnologia e dos esforços na agricultura foram direcionados à oportunização da melhor configuração "ecológica" possível para o bom desempenho da semente - germinação, emergência e estabelecimento das plântulas. 
     A preparação do leito da semente, isto é, a preparação da terra para a semeadura, recebeu  tanta atenção detalhada em alguns dos cursos de agronomia e horticultura que fiz, que era  mais a criação de uma obra de arte do que um lugar para plantio da semente. Esta paixão pelo  “leito da semente”, entretanto, começou a esfriar substancialmente nos últimos 25 anos,  como resultado das mudanças tanto no sistema tradicional quanto avançado de semeadura,  produzindo novas demandas e oportunidades no estabelecimento da lavoura.
                 
    Mudanças na configuração ecológica da lavoura                   
   
As mudanças relativamente recentes e contínuas na agricultura foram substanciais e  numerosas. A produção agrícola está sendo estendida a áreas que são mais frias e mais quentes, mais secas e mais úmidas, mais curtas e mais longas em termos de dias de  crescimento, e mais salgadas ou com teores mais altos de elementos tóxicos, por exemplo  alumínio. As taxas de produção de semente estão diminuindo devido aos preços mais altos  das sementes. Pastagens e outros relvados estão sendo renovados para introduzir e estabelecer espécies mais produtivas e nutritivas em algumas áreas, enquanto em outras áreas estão sendo feitos esforços para restaurar as espécies nativas dos relvados. Estas mudanças, como toda mudança, têm consequências.


   
   O plantio direto requer sementes com maior desempenho  



    Há alguns anos participei de um workshop para produtores de soja e algodão no processo de mudança do sistema de cultivo convencional para o de cultivo mínimo. Os  tópicos que receberam maior atenção foram a obtenção de um estande de plantas e controle  de ervas daninhas. Alguns produtores sentiram que o tratamento da soja, que não é uma prática usual nos sistemas de cultivo convencional, era essencial nos sistemas de cultivo mínimo ou plantio direto. Outros sentiram que, além do tratamento da semente, o monitoramento rígido da temperatura do solo e da sua condição de umidade era crítico para assegurar que estivessem em níveis favoráveis a semeadura.                      
   Um outro tópico que frequentemente entrava nas discussões eram os custos crescentes da semente, e assim, a necessidade urgente de evitar perdas associadas a populações menores do que as adequadas e os múltiplos custos do replantio. Deixei o encontro com uma enorme apreciação da crescente complexidade da agricultura e agradecido por ter me aposentado e, assim, não ter que me esforçar atrás de respostas para as muitas perguntas difíceis dos produtores participantes, como os especialistas que lideravam o workshop frequentemente tiveram que se esforçar. 
                 
    Diversidade nos ecossistemas                     
    Produtores do Texas plantaram sementes de sorgo tratadas com fungicidas e um antídoto para um herbicida específico com semeadoras enormes em fileiras estreitas ou  convencionalmente espaçadas. Produtores da costa do Lago Chad na África Central plantaram  e aguaram manualmente sementes de sorgo em leitos especiais, de modo que as plântulas  estivessem prontas para transplante à beira do lago para tirar vantagem da umidade residual,  já que ela emerge com a recessão da água, isto é, a seca do lago. No Mississippi, produtores de algodão semeiam algodão GM deslintado, tratado em sistemas de cultivo convencional ou mínimo quando a temperatura do solo na profundidade da semente fica acima de 18°C por vários dias.                     
   Produtores da China plantam sementes de algodão não deslintado, frequentemente não tratadas, no solo, em pequenos recipientes de filme plástico, que são reunidos sob abrigos  de filme plástico, isto é, “mini-estufas”, para produzir plântulas de algodão de duas a três  semanas de idade para transplante, que permite a extensão da produção de algodão ao norte,  para áreas frias demais para o plantio convencional. Ao longo do Rio Congo, também na África  Central, produtores semeiam arroz manualmente entre árvores caídas para produzir de dois a três anos antes de se mudarem para outro lugar, enquanto na Louisiana (EUA) as sementes de arroz às vezes são lançadas nos campos pelo ar com uma leve inundação de água, isto é, semeadura por água, devido ao clima adverso que impede o uso de equipamento de solo e/ou para tratar infestações graves com arroz vermelho. A questão dessa ladainha sobre sistemas diversos e contrastantes de cultivo é essa: embora os sistemas sejam incrivelmente diferentes, as sementes, para produzir, são essencialmente as mesmas. Até o presente momento, não houve uma melhoria significativa nas qualidades geradoras inatas dos sistemas de sementes. 
                 
    Tradicionais preocupações agrícolas na ecologia da semente                     
    Na agricultura, a ecologia da semente tem se preocupado com o estabelecimento e/ou regeneração das plantas que são desejadas -as lavouras - e aquelas que não são desejadas - as ervas daninhas que infestam os campos de produção. As práticas culturais  tradicionalmente usadas na produção estão quase que igualmente divididas entre aquelas  que favorecem e realçam o estabelecimento do cultivo e aquelas que pretendem minimizar  ou impedir o estabelecimento das ervas daninhas.                
   Grande parte da boa base informacional descritiva e quantitativa na ecologia da  semente está relacionada à migração e à regeneração das comunidades e populações  vegetais em áreas não cultivadas ou marginalmente cultivadas, como pastagens, terrenos montanhosos, outros relvados, florestas, terrenos úmidos, e assim por diante. Em anos recentes, entretanto, informações muito boas foram desenvolvidas por cientistas  de ervas daninhas que buscavam formas mais eficazes e eficientes de controlá-las. Algumas  das descobertas desta pesquisa e suas implicações mais amplas na agricultura serão revistas na próxima parte deste ensaio.
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