Ciência, tecnologia e negócio de Sementes

Congresso Brasileiro de Sementes 2015

Edição XIX | 06 - Nov . 2015
Silmar Teichert Peske-silmar@seednews.inf.br
Geri Eduardo Meneghello-gmeneghello@gmail.com
Francisco Amaral Villela-francisco.villela@ufpel.edu.br

    A Associação Brasileira de Tecnologia de Sementes (ABRATES), criada em 1970, promoveu, em seu 45o ano de existência, o XIX Congresso Brasileiro de Sementes, realizado na cidade de Foz do Iguaçu, em setembro último. O evento constou de palestras, mesas-redondas, seminários, pôsteres científicos e show-room tecnológico, registrando mais de 1.400 participantes, inclusive de vários países da América do Sul. O ambiente pode ser caracterizado como sendo científico, tecnológico e comercial, pois o negócio de sementes no país ultrapassa a seis bilhões de reais, e várias empresas aproveitam o evento para realizar as mais diferentes transações relacionadas à área de sementes. 

Palestras

    Em termos de palestras, estas versaram sobre o agronegócio brasileiro, com ênfase na soja e no milho, sobre a tecnologia GURT (Genetic Use Restriction Tecnology), que tem potencial para criar macho-esterilidade para produção de híbridos, entre outros efeitos; a cadeia produtiva das hortaliças, com o tomate liderando em importância; o uso de Drones na produção de sementes, com sua versatilidade e precisão; o resfriamento de sementes, com ênfase na combinação dos sistemas dinâmico e estático; detecção, identificação e quantificação de modificações genéticas em sementes; identificação de cultivares via recursos moleculares; e situação atual do controle da qualidade sanitária de sementes em nível mundial. Como pode ser constatado, as palestras abordaram assuntos atuais e bastante importantes para vários atores da cadeia de sementes.


Mesas redondas

1- A rastreabilidade na produção, controle de qualidade e na comercialização de sementes

    Este processo utiliza a informática, juntamente com a navegação por satélite e os avanços científicos e tecnológicos, para permitir ao agricultor obter várias informações sobre a semente que está utilizando, como local de produção, época de colheita, tempo e condições de armazenamento, vigor, entre outras. Trata-se de um processo que profissionaliza o produtor de sementes, com acentuados benefícios ao agricultor, minimizando a utilização de sementes sem origem.

2- Ações contra a pirataria de sementes 

    O negócio de sementes possui uma plataforma legal que permite às empresas investirem em pesquisa e aprimoramento da qualidade da semente com a expectativa de um retorno pecuniário de seu investimento. Entretanto, há situações em que as empresas ou os agricultores não reconhecem os investimentos realizados por outros para criação e desenvolvimento de novas e melhores cultivares. Quando isto ocorre, chama-se pirataria ou semente pirata. 

    A plataforma legal é constituída basicamente por quatro leis, a da produção e comércio, a da proteção de cultivares, a de biossegurança e a lei de patentes. No Brasil, no momento, praticamente 40% da semente de soja utilizada pelos agricultores, para citar um exemplo, não reconhece o trabalho dos melhoristas para a criação e desenvolvimento de novas cultivares. Neste sentido, conforme informações de deputado participante na mesa-redonda, já está em andamento no Congresso Nacional proposta para minimizar esta situação. 

3- Avanços em fisiologia da germinação e dormência de sementes 

    Esta mesa-redonda tratou basicamente de sementes de variedades florestais, abordando aspectos de maturação para sementes recalcitrantes e seu potencial de armazenamento, assim como substrato e temperatura adequada para o teste de germinação. Quanto à dormência, a ênfase foi com métodos de superação.  

4- Propriedade intelectual e o cenário da indústria de sementes 

    Praticamente todos os países da região possuem lei de proteção de cultivares com base na ATA da UPOV de 1978, com exceção do Peru, que está na ATA de 1991. A ATA de 1978 protege as inovações tecnológicas (novas cultivares) até a semente, enquanto a de 1991 protege as novas cultivares até o grão. Assim, na maioria dos países, quem utiliza seu grão como semente não paga o royalty para quem criou e desenvolveu uma nova cultivar, distorcendo o programa de semente de um país. Como o percentual de quem utiliza grão como semente é alto, vários países da região estão sob pressão dos programas de melhoramento e dos produtores de sementes, para que a criação de novos materiais não cesse.

Delegação da UFPel


    Na região, o Uruguai, através de um programa denominado de Valor Tecnológico, liderado pela URUPOV, consegue recolher mais de 90% dos royalties referentes ao uso de sementes de uma cultivar protegida. O Paraguai, através de uma grande negociação entre os atores da cadeia de sementes, também consegue recolher os royalties das cultivares protegidas, o mesmo ocorrendo na Bolívia, com adesão do governo para implementação. Por outro lado, no Brasil e na Argentina, países com forte atuação no agronegócio, a proteção intelectual referente à criação e desenvolvimento de novas cultivares necessita melhorar, para o benefício da sociedade.

5- Padrões de sementes para comercialização  

    Para soja, a percentagem mínima para germinação é de 80%, ou seja, um lote de sementes pode ter até 20% de sementes mortas ou plântulas anormais, e ainda assim pode ser comercializado. Neste sentido, a representação dos agricultores no estado de Mato Grosso encaminhou à Comissão de Sementes de seu estado (CSM-MT) uma solicitação para aumentar o padrão mínimo de germinação para 85%, o que foi aceito pela CSM-MT e encaminhado ao MAPA para possível aprovação.  

    Desta maneira, o MAPA encaminhou a todas CSMs dos estados este requerimento para apreciação, e a ABRATES aproveitou a oportunidade para também discutir o assunto durante o seu congresso de sementes.  Há consenso de que houve várias inovações tecnológicas nos últimos anos, que possibilitam a obtenção e manutenção de sementes de soja de alta qualidade em quantidade para atender o agricultor, citando como exemplo o momento de colheita, controle de insetos e doenças, colhedoras mais adequadas, cuidados com danos mecânicos, frio dinâmico e estático e o tratamento industrial.



    Conforme dados obtidos junto a várias empresas de sementes, o percentual de lote de sementes, na faixa de 80-84% de germinação, é inferior a 10%, o que pode ser reduzido com uma maior adoção das inovações tecnológicas. Assim, num primeiro momento, o aumento do padrão significará uma perda de até 10% nos lotes de sementes; entretanto, com a utilização dos avanços tecnológicos, este percentual será minimizado, a exemplo do que ocorreu com outros padrões, como o de arroz vermelho no estado RS, que era de 15 sementes/700 g e atualmente é ZERO. 
    A elevação do padrão significa que mais sementes de alta qualidade serão utilizadas pelos agricultores, e com isso maior produtividade será obtida. Vários são os trabalhos científicos, ratificados em escala comercial, no sentido de que um lote de alto vigor pode produzir mais de 15% do que um de baixo vigor e isto com um mesmo estande. Entretanto, como lotes de sementes de baixo vigor tendem a apresentar maior número de falhas e duplos, o ganho de produtividade pelo uso de sementes de alta qualidade de soja pode facilmente alcançar mais 20%.
    Os produtores de sementes do estado de Mato Grosso, associados à APROSMAT, decidiram que irão ofertar somente semente de soja com germinação mínima de 85%, enquanto algumas empresas isoladas garantem germinação mínima de, inclusive, 95%, e outras garantem a obtenção adequada de um estande, o que só pode ser obtido com lotes de sementes de alta qualidade. Neste sentido, a Fundação Pró-Sementes está oferecendo um serviço, atestando lotes de sementes com a germinação mínima de 90%  e vigor pelo teste de envelhecimento acelerado de 80%, os quais serão denominados de semente PREMIUM. 

Apresentação de posters

    O MAPA, em sua manifestação sobre o assunto, salientou que todo produtor de sementes pode oferecer lote de sementes com um padrão mínimo superior ao estabelecido pelas normas de produção e comercialização, respondendo pelo novo padrão;

6- Produção de sementes de culturas em expansão 
    Entre as culturas em expansão, mereceu destaque a crotalaria como forrageira tropical, o milheto como forrageira e cobertura vegetal e o caupi (feijão miúdo) para alimentação humana. Estas três culturas possuem programas fortes de melhoramento vegetal e produção de sementes. A crotalaria possui programas privados e públicos de melhoramento, enquanto  para milheto o melhoramento é liderado pelo setor privado há muitos anos; já o caupi é liderado pelo setor público. 

Pesquisa
    Os trabalhos de pesquisa foram apresentados em forma de pôsteres durante o evento, com um número de 1.120 trabalhos distribuídos em oito temas, quais sejam: 

1 - Produção, maturação e colheita - este tema teve 136 trabalhos, abordando principalmente a deterioração de campo, a desuniformidade de maturação, o ponto de maturidade fisiológica e metodologia de avaliação;
2 - Pós-colheita - Os trabalhos deste tema foram principalmente sobre secagem e armazenamento de sementes. Na secagem, teve ênfase a temperatura do ar de secagem que as sementes das diversas espécies podem suportar, enquanto no armazenamento a ênfase foi na aplicação do frio dinâmico e estático para manutenção da qualidade fisiológica das sementes;
3 - Morfologia e biologia molecular - Por ser um tema relativamente novo na área de sementes, teve apenas 37 trabalhos, muitos deles relacionando atributos fisiológicos de sementes com marcadores moleculares;
4 - Viabilidade - Aqui entram os trabalhos de germinação e dormência. Referente à germinação, muitos trabalhos foram com espécies cuja metodologia de avaliação ainda não está nas regras de análise de sementes, como florestais e muitas forrageiras tropicais. Quanto à dormência, a ênfase foi em métodos para superação e suas causas;
5 - Vigor - Neste atributo de qualidade de semente, a ênfase foi em metodologias de avaliação, principalmente nos testes de envelhecimento acelerado, condutividade elétrica e o de tetrazólio. Também foram conduzidos trabalhos relacionando vigor com produtividade em várias espécies, ratificando sua estreita relação, ou seja, sementes de alto vigor propiciam plantas com maior produção;
6 - Espécies florestais - Este tema foi o que maior número de trabalhos teve, com 268 participantes. Isto demonstra a importância que as sementes possuem para a sustentabilidade de nossas florestas;
7 - Espécies forrageiras - Os avanços científicos em ciência e tecnologia de sementes de forrageiras têm sido apreciáveis, pois o Brasil evoluiu da condição de país importador de sementes para a de um país exportador, isto devido à adoção dos avanços técnico-científicos desenvolvidos principalmente no país. Os 52 trabalhos apresentados evidenciam o interesse do setor na produção e qualidade de sementes;
8 - Patologia - A semente é um bom veículo para disseminação de doenças, sendo essencial uma semente sadia para a obtenção de altos rendimentos. Neste tema, a ênfase foi com métodos de avaliação. 

José de Barros França Neto (Presidente Abrates 2013/2015) recebendo homenagem de Francisco Carlos  Krzyzanowski (Presidente Abrates 2015 /2017)


Simpósios
    Foram três os simpósios desenvolvidos durante o evento: o XII Simpósio Brasileiro de Patologia de Sementes, o II Simpósio Brasileiro de Sementes de Espécies Forrageiras e o VII Simpósio Brasileiro de Tecnologia de Sementes Florestais.
    O simpósio de Sementes Forrageiras enfatizou o combate às sementes piratas e o padrão mínimo de pureza para as sementes de braquiária. O negócio de sementes de forrageiras ultrapassa a meio bilhão de reais por ano; entretanto, grande parte é informal. Por outro lado, há a tradição de comercializar no país as sementes com pureza bastante baixa, sendo atualmente o mínimo de 60%, enquanto a semente exportada é realizada com 98%. 

Vista parcial do show-room tecnológico


    O tradicional simpósio de Patologia de Sementes enfatizou a patologia em sementes de hortaliças, as quais em grande parte são importadas. O simpósio é coordenado pelo Comitê de Patologia de Sementes da ABRATES, que possui entre seus objetivos estipular padrões sanitários para a comercialização de sementes.
    A ênfase do simpósio de Sementes Florestais recaiu sobre sistemas de produção de sementes em reserva legal, áreas de coleta e comércio de sementes. A ABRATES também possui um comitê de sementes florestais.

Instituições de Pesquisa
    O Brasil, em seu plano nacional de sementes, elaborado no início dos anos 1970, colocou como um de seus subprojetos a pesquisa em sementes, e hoje, 45 anos após, se constata que as ações foram muito bem implementadas, tanto pelo número de trabalhos apresentados no congresso – de 1.120 –, como de pesquisadores, em número de 2.520, e das instituições de pesquisa, em número de 142. Estes indicadores são a base para os grandes avanços ocorridos em ciência e tecnologia de sementes, viabilizando a oferta em qualidade e quantidade ao agricultor e, inclusive, possibilitando o crescimento das exportações, que já ultrapassam centenas de milhões de dólares anuais.
    A distribuição dos trabalhos de pesquisa por instituição é pouco concentrada, sendo que 13 delas apresentaram no mínimo 20 trabalhos. A apresentação variou de 96 trabalhos, feita por pesquisadores  ligados à UFLA e 21 ligados à UTFPR. A UFLA se destaca pelos trabalhos realizados com sementes florestais e na área de patologia, enquanto a UFPel, segunda colocada, com 68 trabalhos apresentados, destaca-se por trabalhos em sementes de grandes culturas. Assim, cada instituição demonstrou sua fortaleza, através de atividades de pesquisa que alavancam o sistema de sementes no país, cujo maior beneficiário é a sociedade. 

Show-Room Tecnológico
    O negócio brasileiro de sementes ultrapassa a seis bilhões de reais por ano, e para isso muitas empresas estão diretamente envolvidas, como as de máquinas e equipamentos para secagem, limpeza e armazenamento de sementes, equipamentos e materiais para laboratório de análise de sementes, embalagens e produtos para proteção e desempenho de sementes. Estas empresas aproveitam o evento para promoverem seus produtos e serviços, constituindo um ambiente profissional e bastante concorrido. Neste ano, mais de 40 empresas participaram da vitrina tecnológica. 

Nova Diretoria 
    Habitualmente, a ABRATES elege a sua diretoria durante a realização do congresso, e neste ano elegeu, em chapa única e por aclamação, o pesquisador da Embrapa Soja, dr. Francisco Carlos Krzyzanowski, tendo com seu 1º vice-presidente Fernando Henning, também da Embrapa Soja, e como 2º vice-presidente Maria Laene de Carvalho, da UFLA. 


Diretoria Abrates 2015/2017

    
    A ABRATES, além de promover a realização do congresso a cada dois anos, também publica a revista científica Journal of Seed Technology (antiga Revista Brasileira de Sementes) e realiza, em parceria com várias universidades, cursos específicos em sementes. Em termos de relacionamento, a entidade faz parte da ABRASEM, está conectada com a International seed Testing Association (ISTA) e com a American Official Seed Testing Association (AOSA). É uma entidade pró-ativa com grande inserção no cenário sementeiro nacional e internacional. A SEED news congratula os dirigentes e membros da entidade. 

Odete H. T. Liberal primeira presidente da Abrates recebendo homenagem de José de Barros França Neto

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