Secagem a Alta Velocidade

Edição XII | 02 - Mar . 2008
Silmar Teichert Peske-silmar@seednews.inf.br
Francisco Amaral Villela-francisco.villela@ufpel.edu.br
    Estudos em soja mostram que as sementes levam de duas a três semanas para secarem de 50% umidade (maturidade fisiológica) a 13%, dependendo das condições climáticas e a ocorrência de chuva quando a umidade estiver abaixo de 20%, praticamente a inutiliza como semente.
    Em arroz, os agricultores sabem, de longa data, que devem colher o material, tanto para semente como para grão, quando a umidade estiver entre 24 e 20% e realizar a secagem artificial. A semente é um material vivo e, quanto mais úmido, menor é seu potencial de armazenamento. Assim, para efeitos práticos, em condições de armazenamento convencional, considera-se que uma semente com umidade de 13% pode ser armazenada por oito meses. Portanto, toda semente colhida com mais de 13% deve sofrer secagem e quanto antes melhor, requerendo assim, para grandes volumes de sementes, que se utilize secagem artificial, que pode ser de diversas maneiras.
    Entretanto, neste artigo será discutido e apresentado o sistema intermitente com uma capacidade de secagem superior a um ponto percentual (pp) por hora. Este sistema consiste basicamente em manter as sementes em contínuo movimento e submetê-las a uma corrente de ar quente a intervalos regulares de tempo. A semente é um material higroscópico, ou seja irá ganhar ou perder umidade em função da umidade relativa do ar (UR) e esta característica é utilizada pelos secadores para propiciar que a umidade da semente seja removida.
     Para manter um ambiente de secagem é necessário que a umidade ao redor da semente seja transportada para “longe”, e para isso se utiliza o ar que é insuflado ou succionado através da massa de sementes por um ventilador. Quanto mais alto o fluxo de ar, mais rápida é a secagem até um certo limite, pois depende da migração da umidade do interior para a periferia da semente.
 
    VELOCIDADE DE SECAGEM
    Em termos práticos, pode-se considerar a velocidade de secagem sob dois aspectos:
1.A remoção de pontos percentuais de umidade por hora, e
2.Toneladas de sementes secas por dia (considerando uma secagem de 18 para 13% de umidade, por exemplo). Neste artigo será considerada a velocidade de secagem em pontos percentuais de umidade por hora, pois se adapta melhor ao sistema de secagem intermitente.


    Como comentado anteriormente, a velocidade de secagem é basicamente função de duas propriedades físicas do ar, a UR e o fluxo de ar que passa pelas sementes. Em relação à UR, a maneira mais fácil e econômica de baixá-la é aquecendo o ar, e, para efeitos práticos, considera-se que para cada aumento de 1ºC na temperatura do ar diminui-se de 2 a 4% a UR. Assim, nos secadores intermitentes utilizam-se temperaturas do ar entre 60 e 70ºC, a UR do ar de secagem é inferior a 10%, tendo assim uma grande capacidade de absorver a umidade retirada da semente.
     Caso o controle da operação de secagem não seja adequado, a umidade da semente irá equilibrar-se com a umidade do ar muito baixa. Para que isso não ocorra, deve-se determinar a umidade das sementes no secador, a intervalos regulares de tempo (20 - 30minutos). Temperaturas do ar de secagem são, em geral, bem maiores que a temperatura da massa de sementes. Tendo em vista a existência de vários modelos de secador do tipo intermitente, é aconselhável que nas primeiras secagens se relacione a temperatura do ar de secagem com a temperatura da massa de semente. Por segurança, recomenda-se que a temperatura da semente não ultrapasse a 40ºC para sementes de soja ou 43ºC para arroz, trigo e milho no final da secagem, ou seja, quando a semente estiver com umidade ao redor de 14%. Quanto mais seca a semente, maior pode ser a temperatura de secagem.
     A outra característica física do ar que influi na velocidade de secagem é o fluxo de ar que passa pelas sementes, sendo este estabelecido na fábrica conforme tipo e modelo de secadores, cujos valores são superiores a 60m3/min/tonelada de semente. Para se ter uma ideia do fluxo deste ar, constata-se que o ar quase levanta a semente no final da operação de secagem. Mesmo o ventilador sendo dimensionado na fábrica, é comum ocorrer que o fluxo de ar que passa pelas sementes seja baixo, acarretando uma baixa velocidade de secagem, pois nesta situação o ar terá pouca capacidade para transportar a umidade liberada pelas sementes para fora do ambiente de secagem. Isto ocorre geralmente no processo de aquecimento do ar, pois normalmente o ar deve ser aquecido de 25-30ºC para 60-70ºC, utilizando-se para isso de fornalhas que empregam as mais variadas fontes de energia para aquecer o ar.
     No Brasil, a lenha é bastante comum, enquanto o emprego de gás vem apresentando expansão considerável. O sistema de aquecimento deve ser tal que o ar não seja estrangulado; para isso, os secadores do tipo intermitente, em seu sistema de aquecimento do ar, contemplam geralmente uma entrada de ar frio para misturar com o ar quente. É normal o ar sair da fornalha com temperatura superior a 150ºC para ser misturado ao ar frio, de tal maneira que o ar, ao entrar no secador, esteja na temperatura de 60-70ºC. Sem a mistura com ar frio do ambiente, a fornalha deve ser muito bem dimensionada para não estrangular o ar.
    Um secador do tipo intermitente deve secar no mínimo três cargas por dia, considerando uma redução na umidade de 20 para 13%. Para essa capacidade de secagem considera-se não somente a velocidade da remoção de água, que deve ser superior a 1pp/hora, como também o tempo necessário para carregamento e descarga do secador, que requer ao redor de 40 minutos, dependendo do modelo. Assim, considerando um modelo de secador intermitente de capacidade estática de 25 toneladas, a sua capacidade de secagem será no mínimo de 75 toneladas/dia.

    

     
    DIA E NOITE
   Há alguns anos, recebeu-se um secador intermitente para ensino e pesquisa e, no primeiro ano, o secador foi utilizado para secar sementes básicas de um programa de melhoramento. Como ainda não se tinha pessoal treinado como secadorista, buscou-se no mercado operadores que supostamente estavam acostumados a secar. Começou-se a secagem de arroz numa tarde, conseguindo uma velocidade média de secagem de 1,5pp/hora. Ao entardecer, deixou-se dois secadoristas para o turno da noite. Na manhã seguinte, os secadoristas estavam bem dispostos, informando que a carga do secador estava em vias de terminar.
    Ao fazer rapidamente as contas, constatou-se que a velocidade de secagem tinha sido muito baixa. Perguntou-se aos secadoristas o que tinha ocorrido, e a resposta foi que à noite a semente seca mais lentam ente do que durante o dia. Evidente que não é assim. Durante o dia, novamente, conseguiu-se uma velocidade de secagem de 1,5pp/hora e à noite deixou-se, a secagem para os secadoristas especialmente contratados para tal fim. Na manhã seguinte, o secador foi encontrado parado, devido a embuchamento de sementes no sistema de transporte.
     Na noite seguinte, convidou-se dois alunos e realizou-se a secagem, também conseguindo uma velocidade de secagem de 1,5pp/hora. Moral da história, secar à noite ou de dia não faz diferença na velocidade de secagem, pois se utiliza uma mesma UR do ar de secagem e um mesmo fluxo de ar. A diferença está no consumo de combustível, que à noite é maior, pois a temperatura ambiente é menor. Durante o dia, eleva-se a temperatura de 25-30ºC para 60-70ºC, enquanto à noite geralmente se eleva a temperatura de 20ºC para 60-70ºC.
     
     FORNALHA
     Os professores, muitas vezes, são contestados pelos alunos, o que é bom. Entretanto, às vezes a situação se torna difícil, sendo necessário demonstrar in loco o fato. Durante uma aula de secagem, ao informar que um secador intermitente deve secar três cargas por dia, no mínimo, houve contestação de tal forma que não havia outra saída a não ser visitar o sistema de secagem que estava secando apenas uma carga por dia. A unidade de beneficiamento de sementes situava-se a 300 km de distância.
    No local, após amável recepção pelo responsável técnico da unidade de beneficiamento, de imediato foi-se ao sistema de secagem de sementes de arroz. Eram seis secadores de 10 toneladas cada um, todos operando normalmente com a temperatura do ar de 70ºC, que aquecia a semente no final da secagem a 42ºC, sinal que, em relação à temperatura, tanto do ar quanto da semente, estava bem. Após a verificação da temperatura, verificou-se o sistema de ar e a primeira providência foi inspecionar os ventiladores.         
     Entretanto, eram originais, o que levou a pensar em outras causas menos frequentes. Caminhando ao redor dos secadores, constatou-se que a regulagem da temperatura era feita diretamente pelo ar que sai da fornalha, ou seja, não havia entrada de ar frio, tornando o fluxo de ar estrangulado, pois os seis secadores eram alimentados por uma só fornalha, de forma ineficiente. Como solução, recomendou-se a abertura de uma janela para entrada de ar frio (o que proporcionava mais fluxo de ar para o secador), o que foi acatado, e o resultado obtido foi a elevação da velocidade de secagem para 1,3pp/hora.
     
    CUIDADOS
    A secagem empregando alta velocidade requer cuidados especiais, sendo possível destacar os mais importantes:
a) Super secagem - a secagem intermitente é realizada com baixa UR e alto fluxo de ar. Por isso, a determinação da umidade das sementes deve ser realizada a intervalos regulares de tempo (20-30 min) para que não ocorra super secagem, ou seja, que sementes sequem a 10% de umidade em vez de 12-13%. Baixa umidade da semente propicia a danificação mecânica, e secagem excessiva aumenta o tempo de secagem com a diminuição da eficiência de secagem, entre outros inconvenientes.    
    É importante ressaltar que na secagem intermitente, como as sementes estão em movimento, não há frente de secagem, significando uma secagem mais uniforme das sementes;
b) Danos mecânicos - as sementes estão em contínuo movimento e passam várias vezes por elevador, havendo risco de ocorrer danificação mecânica das sementes, caso o elevador esteja desregulado ou não seja do tipo adequado. Na secagem, como as sementes entram úmidas no secador, a danificação mecânica é desprezível, desde que cuidados especiais sejam tomados com o elevador. Em princípio, quanto menos voltas a semente der pelo sistema secador-elevador, menores serão os riscos de danificação mecânica.
c) Secagem muito rápida - é importante uma secagem rápida, entretanto deve-se respeitar o princípio físico segundo o qual a umidade do interior da semente necessita migrar para a periferia e aí ser transportada pelo ar para fora do ambiente de secagem. Caso ocorra uma secagem muito rápida, em que a periferia da semente tenha uma umidade muito diferente de seu interior, haverá danos internos (como fissuras em sementes de arroz e milho), que afetarão a qualidade da semente. Assim, recomenda-se que a velocidade de secagem seja, no máximo, de 1,3pp/hora, para soja e feijão, e 1,8 a 2pp/hora, para arroz e trigo. Em arroz, acima de 2pp/hora, ocorrem fissuras nas sementes, ocasionando um baixo rendimento de grãos inteiros.

     MILHO EM ESPIGA
    Sabe-se que o ar deve passar pelas sementes para que ocorra a secagem, e quanto mais fácil passar, mais rápida será a secagem. Neste sentido, questionava-se com frequência por que o milho em espiga leva muito mais tempo para secar do que o milho debulhado, uma vez que em um m3 de milho debulhado tem-se tem-se 750 kg e, por outro lado, apenas 450 kg quando o milho está em espiga. Realmente, o ar passa relativamente fácil através das espigas de milho, entretanto tem dificuldade em passar pelas sementes que estão presas ao sabugo - e se o ar não passa não haverá secagem, pois a umidade não será transportada para fora do ambiente de secagem. A propósito, o sabugo, mesmo possuindo maior umidade do que a semente, não é o responsável pela secagem lenta do milho em espiga - embora seja tecnicamente recomendável a colheita de sementes de milho com umidade acima de 30% e secagem em espiga.
     Em regiões de baixa ocorrência de chuvas na época de colheita, empresas realizam a colheita de sementes de milho debulhado com umidade ao redor de 20% e realizam secagem intermitente, obtendo velocidades de secagem superiores a 1,0pp/hora, pois o ar passa facilmente através das sementes de milho, quando debulhadas.
    
    O MITO
    Escuta-se com frequência que a secagem torra a semente. Entretanto, a verdade é outra. Quem não seca semente demonstra que produz muito pouco ou que muitos de seus lotes sofreram deterioração de campo. A secagem é garantia de quantidade com qualidade.
    
    A CAPACIDADE DE SECAGEM
    Considerando um secador com capacidade estática de 25 toneladas de sementes de soja por carga e realizando 3,5 cargas por dia durante uma colheita de 40 dias, este secador terá secado, no fim da colheita, 140 cargas de 25 toneladas cada, ou um total de 3.500 toneladas, que pode ser considerada uma quantidade apreciável de sementes.
    Um produtor de sementes de soja que tenha uma demanda para 8.000 toneladas (200.000 sacos de 40kg) receberá em sua unidade de beneficiamento de sementes ao redor de 11.000 toneladas (considerando uma perda no beneficiamento de 25%), e, considerando que secará 60% de sua produção (6.600t), deverá providenciar dois secadores com capacidade estática de 25 toneladas (total da safra 7.000t) para atender a necessidade de secagem. Com este dado pode-se determinar o custo da secagem para a obtenção de sementes em quantidade e qualidade. O custo, considerando o sistema de secagem, a amortização em 10 anos, pessoal e combustível, é inferior a R$ 1,00/saco de sementes de 40kg.
    Outras situações poderiam ter sido utilizadas, principalmente em relação à capacidade estática do secador. Entretanto, pela quantidade de semente utilizada como exemplo, o secador de 25 toneladas ajusta-se melhor pela facilidade de que cada carga de secador pode ser considerada um lote de sementes e assim ter um registro mais eficiente do seu histórico. O percentual da produção de sementes de soja estimado para ser seco pode variar de região para região; porém, a utilização de 60% é um bom referencial, mesmo porque é aconselhável ter capacidade de secagem superior ao necessário, pois as necessidades de secagem
não são uniformes durante a colheita.
     
   “Em tempos em que o negócio sementes requer, cada vez mais, que os processos sejam otimizados, a secagem é uma das operações que devem ser consideradas para a obtenção de sementes de qualidade, em quantidade e a um preço competitivo. Neste artigo, discutiu-se a operação de secadores do tipo intermitente, que propiciam uma velocidade de secagem superior a um pp/hora, ou, em outras palavras, possuem uma capacidade de secagem de, no mínimo, três cargas/dia. Aspectos de UR e fluxo de ar são apresentados, assim como cuidados especiais para a obtenção de uma alta capacidade de secagem sem prejudicar a qualidade das sementes. Ilustra-se também a necessidade de secadores para uma empresa de sementes que comercializa 8.000 toneladas de sementes/ano.”
    Esta informação da capacidade de secagem dos tipos de secadores intermitentes é importantíssima, pois o usuário do secador consegue relacionar imediatamente com o desempenho de seu secador e muitas são as ocasiões em que a capacidade do secador é inferior a três cargas por dia. Neste sentido, serão detalhadas algumas experiências com causas de um baixo desempenho de secador.



     
    Algumas dicas de secagem.

      
    Relação entre temperatura e umidade de semente de soja.

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