A qualidade das sementes de soja depois de La Niña, uma caixa de pandora na Argentina

A qualidade das sementes de soja depois de La Niña, uma caixa de pandora na Argentina

   A preocupação mais iminente é a qualidade das sementes de soja, que está gravemente afetada pelas diversas condições ambientais que devem afetar os cultivos em grande parte da Argentina por um longo período de tempo. Os primeiros lotes de soja colhidos manifestam a presença de um amplo espectro de defeitos entre eles: sementes verdes, sementes pequenas, com tegumento rasgado e outras enrugadas. Sem dúvida, qualidades físicas indesejáveis em qualquer lote de sementes. 

   No entanto, um manejo adequado desses lotes nas plantas de acondicionamento permitirá “limpar” e “melhorar” os lotes para eliminar ou reduzir ao mínimo a presença de todas essas sementes indesejáveis a fim de otimizar a sua qualidade. São várias as perguntas que devem ser respondidas, para entender a magnitude da crise de qualidade que está enfrentando o setor sementeiro argentino, com vistas para a próxima safra de soja. Em primeira instância, é necessário conhecer as causas do aparecimento de sementes verdes, enrugadas e pequenas, assim como também o efeito que tem sobre a qualidade dos lotes.

Sementes esverdeadas, as protagonistas desta safra

   A presença de sementes verdes está intimamente associada com a ocorrência de condições ambientais estressantes para o cultivo, caracterizadas por períodos constantes de altas temperaturas, superiores a 32°C, combinadas com déficit hídrico prolongado. Nestas condições ambientais, o cultivo sofre um desequilíbrio fisiológico que afeta o processo natural de degradação da clorofila nas sementes. Quanto maior for a intensidade e a duração do estresse ambiental, mais grave será o desequilíbrio fisiológico. Além da ocorrência das condições ambientais estressantes mencionadas, também é importante conhecer o momento em que se produz o momento estresse. Dependendo do estágio de desenvolvimento em que se encontra o cultivo, o fenômeno das sementes verdes tende a ser maior ou menor. Quando o estresse ambiental ocorrer durante o estádio R6, a presença de sementes verdes será maior, já que é um estádio muito suscetível. Nesse momento do cultivo, as sementes se caracterizam por conter um conteúdo de umidade ao redor de 60%, com uma coloração verde uniforme em toda a sua estrutura. Essa coloração é consequência da acumulação natural de clorofila, que se degrada pelo metabolismo normal das sementes durante a maturação natural dos tecidos. Esta degradação natural da clorofila é interrompida quando a planta sofre o desbalanço fisiológico causado pelo estresse ambiental e aparece sementes com coloração verde pela retenção da clorofila.

   O ambiente de produção estressante não favorece apenas o aparecimento de sementes verdes, mas também influencia no desenvolvimento das sementes em um momento crítico para a determinação da qualidade, como é o estádio R7. Neste momento, denominado de maturidade fisiológica, as sementes alcançam seu máximo peso seco, adquirem capacidade para germinar e determinam sua longevidade e vigor. Por isso, o momento da ocorrência, a intensidade e a duração das condições ambientais estressantes podem causar uma variação importante na porcentagem de sementes verdes e na qualidade fisiológica do lote de sementes. E para complicar um pouco mais o problema das sementes verdes, é necessário descrever os diferentes tipos de sementes verdes que aparecem, já que existem características físicas diferentes que têm influência sobre a qualidade.

   A análise da qualidade de um lote com presença de sementes verdes é complexa devido às características deste tipo de sementes. Dependendo da intensidade da cor, da localização dos tecidos verdes na semente e da presença/ausência de outros tipos de danos, o lote de sementes pode ter qualidades muito diferentes. Lotes com alta porcentagem de sementes verdes podem ter uma qualidade aceitável, enquanto lotes com a mesma quantidade de sementes verdes podem ter uma qualidade muito menor ou não ser adequados para a semeadura.

   É a partir desta situação que surge a necessidade de realizar uma análise de qualidade profissional e não apenas do aspecto visual. No entanto, não são todas más notícias, já que, apesar dos problemas de qualidade que podem ter os lotes com sementes verdes, é possível melhorar esta qualidade com uma classificação adequada durante o beneficiamento. É assim que, as sementes verdes características por apresentarem depressões profundas na zona periférica e central dos cotilédones, denominadas sementes enrugadas (Figura 1 A), podem ser eliminadas facilmente na pós colheita com os equipamentos adequados, já que não apresentam a forma típica esférica das sementes de soja.

   Estes enrugamentos são consequência de condições muito estressantes do ambiente durante a etapa de desenvolvimento das sementes. Por outro lado, em um lote de sementes também é possível encontrar sementes enrugadas com características típicas do ambiente. Estes enrugamentos localizam-se na parte dorsal da semente (Figura 1 B) e podem ser superficiais ou profundas dependendo da intensidade e evolução do ambiente. Diferente das sementes murchas, as sementes enrugadas geralmente conservam a forma esférica característica da soja. Un terceiro tipo de sementes verdes são aquelas que não apresentam outro dano e são perfeitamente esféricas (Figura 1 C).

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   Este tipo de sementes pode ter uma qualidade regulatória variável, dependendo da intensidade da coloração e do grau de maturidade das estruturas que o compõem. Com base nas características físicas das sementes verdes esféricas e enrugadas, a separação das mesmas do lote exigirá o uso de tecnologias e/ou equipamentos especiais que poderão ser empregados em grandes volumes e que permitirão a correta identificação da coloração verde e sua separação da massa de sementes.

   Antes da complexidade que supõe a separação de sementes após sua coloração, é factível pensar em uma porcentagem máxima de sementes verdes na bolsa que não afete a qualidade fisiológica do mesma. Para determinar esse nível máximo de tolerância de sementes verdes em um lote comercial de sementes, o Laboratório de Sementes de INTA Oliveros realizou um trabalho no qual se avaliou a qualidade fisiológica de lotes de sementes de soja com diferentes porcentagens de sementes verdes esféricas. As figuras 2 e 3 mostram os valores de qualidade expressos em termos de germinação (PG), viabilidade por Tetrazólio e vigor por Envelhecimento Acelerado (EA) para dos lotes comerciais de sementes com diferentes porcentagens de sementes verdes em sua composição.

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   Os dados das figuras 2 e 3 mostram que os lotes de sementes com porcentagens superiores a 10% de sementes verdes apresentam uma importante redução da germinação quando comparados com aqueles lotes de sementes onde o conteúdo de sementes verdes foi menor que 10%. A produção de plantas normais na germinação foi alta na maioria dos casos com 0%, 6% e 10% de sementes verdes para ambos os lotes, alcançando valores compreendidos entre 88% e 96%. Por outro lado, os valores de viabilidade foram iguais ou superiores a 90% em ambos os lotes, para as amostras que apresentam igual ou menos de 10% de sementes verdes. Respeito à condição de vigor, avaliada pela avaliação de EA, observa-se para ambos os lotes uma diminuição do mesmo respeito à mostra com 0% de sementes verdes. Isso indica que as sementes verdes apresentam uma grande quantidade de deterioração em relação às sementes amarelas, quando foram expostas a condições adversas de alta temperatura e umidade elevada em relação ao teste de EA. Isso sugere que os cotilédones verdes estariam diretamente associados a condições de baixo vigor ou bem, que as condições ambientais nas quais se desenvolvem as sementes verdes conduzem à produção de sementes de baixo vigor.

   A conclusão do trabalho foi que lotes de sementes com conteúdo de sementes esféricas completamente verdes iguais ou inferiores a 16% apresentam valores de germinação iguais ou superiores ao valor de comercialização de sementes de soja que é 80%. Portanto, o nível máximo de tolerância de sementes verdes para lotes destinados a semeadura poderia ser estabelecido em 16% a fim de garantir o design adequado das sementes no campo, sempre que as condições ambientais fossem favoráveis para a germinação e emergência das plântulas.

Recomendações: Devido aos problemas causados pela alta presença de soja verde nesta safra, recomendamos a adoção de algumas medidas para minimizar a perda de qualidade:

- Realize um processo adequado de limpeza e classificação de lotes com a finalidade de melhorar a qualidade física e regular de lotes, removendo as sementes murchas.

- Realize uma análise profissional da qualidade das sementes em laboratórios certificados, para obter informações precisas sobre a qualidade dos lotes já que os lotes com sementes verdes podem ter condições muito diferentes entre si.

- Armazenar os lotes de sementes mais limpos, secos, frescos saudáveis que possível para conservar os atributos de qualidades fisiológicas alcançadas após o beneficiamento.

- Realizar monitoramentos periódicos da qualidade para conhecer o estado e a evolução da mesma durante o armazenamento

Sementes secas… frágeis e problemáticas

   Ao consultar a sementes secas, se refere a lotes de sementes com conteúdo de água baixo, e nos referimos precisamente entre 8 a 11%. Neste caso, os lotes de sementes de soja devem ser tratados com o maior cuidado que o habitual, pois as sementes secas ou com baixo teor de umidade são mais frágeis e suscetíveis a danos físicos que podem trazer problemas ao ambiente de produção. Todos aqueles golpes que afetam as sementes secas durante a colheita e pós colheita são traduzidos na aparição de lesões cortantes sobre as distintas estruturas da semente. Estas lesões, de maior ou menor grau, afetarão a produção de plantas normais e o estabelecimento de um estande adequado de plantas no cultivo. Os danos ocasionados pela colheitadeira e/ou pelas máquinas utilizadas durante a classificação são denominados comumente como danos mecânicos, em referência à participação de algum tipo de máquina em sua produção.

   E importante ter em conta que o dano físico nas sementes de soja incide diretamente sobre a longevidade das mesmas no armazenamento. Os tecidos afetados pelo dano físico têm uma respiração mais alta que os tecidos intactos e, portanto, se deterioram com maior rapidez durante o armazenamento. Devido aos efeitos negativos dos danos físicos sobre a germinação e a longevidade das sementes, surge a necessidade de minimizar as lesões cortantes que as máquinas produzem sobre os lotes de sementes, particularmente em lotes secos que são sementes mais frágeis. A ocorrência de danos mecânicos nas sementes se traduz em danos de magnitude distinta sobre as plântulas, causando lesões que impedem a instalação da plântula no campo. A “figura 4” mostra algumas anormalidades em plântulas originadas por sementes com danos mecânicos.

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   Os danos físicos sobre as sementes se associam com maior frequência aos equipamentos, porém, existem danos físicos que se produzem nas sementes durante seu período de formação dentro das vagens, as quais são comumente denominados de fraturas. A aparição das fraturas pode ser explicada pela diferente distribuição do conteúdo de umidade sobre a superfície e o interior de cada semente, o que gera uma série de tensões físicas entre os diferentes tecidos que conformam a semente. As áreas de tecidos secos e úmidos da semente ficam úmidas com velocidades diferentes, sendo que as pressões geradas provocam a separação ou fratura dos tecidos. Este processo de fraturamento é espontâneo e pode ocorrer no ambiente de produção ou bem durante as práticas de conservação. Algumas cultivares apresentam maior predisposição à produção de fraturas durante o desenvolvimento e crescimento das sementes no interior da vagem, associadas a ciclos de secagem e reidratação no ambiente de produção. Estes materiais exigem maior atenção no momento da colheita com respeito à hora do dia, a humidade relativa ambiental, a velocidade da colheitadeira e, sobre todo o estado de conservação dos equipamentos utilizados. Com um baixo conteúdo de umidade das sementes, aumentará o risco de aparecimento de rachaduras durante a manipulação do lote.

   A germinação das sementes e/ou a produção de plantas normais, a capacidade de se desenvolver e se estabelecer no campo, será afetada em maior ou menor medida dependendo da localização das fraturas nas sementes. Diferente dos danos mecânicos, as fraturas se manifestam seguindo um padrão definido pela localização na área interna e central de um ou ambos os cotilédones e geralmente em posição transversal no lado maior dos mesmos (Figura 5 A). No caso das fraturas que se apresentam pelo embrião, são geralmente transversais ao mesmo e podem produzir a perda completa da capacidade de germinar ou bem a emergência de uma planta com graves defeitos nas raízes e/ou sistema de talo (Figuras 5 B e 5 C).

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   Por outro lado, a presença de fraturas nos lotes de sementes não só influencia a capacidade de germinação, mas também é uma via de entrada para patógenos, que pode causar doenças com a consequente perda de qualidade. É importante ter em conta que a prática de inoculação de lotes de sementes secas com alto volume de caldo pode gerar o aparecimento de fraturas que levam à perda de qualidade e aumentam o risco de fitotoxicidade.

Recomendações:

- Use colheitadeiras com cilindros axiais, em bom estado de uso e conservação e tenha em conta uma regulagem adequada.

- Use cintas transportadoras ou bem recobertos internamente com gomas especiais, reduza o número de passadas por eles e selecione adequadamente o equipamento de beneficiamento.

- Durante a inoculação e tratamento, use caldas que não superem 450- 500 cc por cada 100 quilos de semente. Para isso é necessário o uso de equipamentos profissionais com elementos distribuidores que consistem no uso de sistemas pneumáticos com atomizador de produtos.

- Realizar análise de qualidade antes e depois da passagem das sementes pelos diferentes equipamentos, para conhecer e identificar possíveis pontos de origem de danos nas sementes, com o objeto de aplicar medidas corretivas para minimizar perdas perdidas de qualidade.

   Como podemos ver esta safra deixou um sabor amargo com respeito à produção de grãos e sementes, mas ao mesmo tempo plantamos um grande desafio. Isso significa que se deve aguçar todos os sentidos e aplicar todos os conhecimentos adquiridos nas safras anteriores, já que, como se observou, não há nada novo, somente muitas cosas juntas. 

   Nesta safra 22/23, a engenhosidade terá que ser colocada em prática, trabalhar-se cada lote com muito cuidado, buscando combinar os equipamentos de limpeza e classificação, peneiras de diferentes orifícios, espirais e, mesas densimétricas. Teremos que eleger as combinações mais apropriadas para atingirmos o máximo proveito dos lote de sementes. Por outro lado, sugere-se realizar uma análise de qualidade no laboratório de sementes, em diferentes pontos do processo e momentos para a tomada de decisões. Se dispõe de muitas ferramentas, na planta de processamento para alcançarmos os melhores lotes e também no laboratório, para estimar a qualidade e sua possível longevidade.

Fonte: INTA por Carina del Valle Gallo e Miriam Raquel Arango

*Esta notícia foi publicada por “Ruralnet” e pode ser acessada em seu idioma original em: https://ruralnet.com.ar/2023/04/18/la-calidad-de-sementes-de-soja-despues-de-la-ninauna-caja-de-pandora/ 

Subject:Sementes

Author:Ruralnet

Publication date:23/04/2023 17:28:09

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