Empresas sementeiras da Argentina enfrentam sérios problemas de quantidade e qualidade para a próxima safra
Alfredo Paseyro, é diretor executivo da Associação Argentina de Sementeiras (ASA). Formado pela Universidade CAECE como Analista de Sistemas, possui pós-graduação em Agronegócios (UBA) e outra em Estratégia Política, esta última realizada na China. Possui 36 anos de experiência de trabalho no agronegócio, principalmente em economias regionais e sempre em produções para exportação. Além disso, possui ampla participação em organizações sindicais relacionadas à atividade.
- Como a seca afetou a indústria de sementes? Um mercado de US$ 8 bilhões
O impacto foi semelhante ao que os produtores estão sofrendo. Depende das zonas, mas em geral temos usado irrigação suplementar e, de qualquer forma, não foi suficiente para contrariar esta seca histórica. Normalmente irrigamos 150 milímetros, que são adicionados ao regime de chuvas para completar o que as lavouras precisam. Este ano tivemos que dobrar essa quantidade devido à escassez de água, mas as altas temperaturas também tiveram um impacto na viabilidade do pólen e no enchimento dos grãos.
- Que resultados foram observados na colheita de sementes?
Em termos gerais, a agroindústria de sementes plantou quase 20% a mais de área para recuperar os estoques, mas os rendimentos foram em média 15% menores do que o esperado. A produção de sementes de trigo também apresentou dificuldades nas avaliações de pureza e poder germinativo, razão pela qual a produção de sementes de trigo ficou aquém. Em seguida, o Instituto Nacional de Sementes (INASE) viabilizou o que se chama de plantio de produtores de primeira multiplicação, com autorização do melhorista e auditoria do INASE, para garantir a qualidade da semente que o produtor recebe. Na soja, a campanha foi atrasada devido à estiagem, com a qual estamos apenas avaliando a colheita incipiente, selecionando qualidade em quantidade adequada.
- Então, espera-se que a safra se recupere, mas podem faltar sementes?
A diminuição do número de sementes não é dramática, mas a oferta de variedades e grupos de maturidade pode não ser tão ampla a ponto de atender a demandas específicas dos produtores. A mesma coisa acontece no Uruguai e pode acontecer que o país vizinho precise importar sementes. Como a genética que eles usam é de origem argentina, eles estão vendo se podem comprar de nós, mas não sabemos se poderemos aproveitar essa oportunidade comercial devido à qualidade.
- Acima de tudo, há restrições à importação de fertilizantes e produtos fitossanitários.
Claro, a produção funciona como um sistema. A melhor genética precisa de fertilização e produtos fitossanitários para proteger as culturas. E nesse contexto, vão aparecer alguns fatores, como o adensamento de plantio, que no caso do milho de plantio tardio requer menos sementes por hectare, e a pecuária também tem um papel com o qual poderíamos ter um equilíbrio que seja suficiente para cobrir a demanda de plantio.
- Como afeta o gado? Hoje a fazenda de gado começou a recuperar espaço, onde havia sido deslocada pela agricultura. Pode ser visto na rota 2, rota 5, entre outras. Assim, a produtividade de parcelas que não são idealmente agrícolas também é desenvolvida com sorgo e milho de duplo propósito, que exigem menos densidade do que o milho granulado. Um produtor de destaque, de Carhué, contou que em partes de seu campo, como a crista de uma duna, se semeiam 30.000 ou 40.000 sementes por hectare. E na zona central costumamos falar de 80.000 sementes por hectare. É uma novidade muito interessante, porque tem a ver com a semeadura variável. Vale tudo, e o milho já é vendido pela semente, ao contrário da soja e do trigo que são vendidos ao quilo ou à saca.
- Quanto foi o investimento da cadeia de insumos agrícolas na safra que termina?
Estima-se um mercado de US$ 8 bilhões, que infelizmente não deu os resultados esperados pelos produtores. Por isso, olhando para o futuro, o fator financeiro é outro elemento a ter em conta. Os bancos estão se reunindo com as empresas fornecedoras de insumos para ver como estão suas carteiras, e as empresas de sementes, fertilizantes e fitossanitários, por sua vez, estão analisando suas contas correntes com os produtores. Vemos que muitos produtores vão ficar com saldos pendentes por conta da questão climática, para isso terão que ser refinanciados e também repassar os insumos para que voltem a plantar e saldar os compromissos dessas contas. Muito se falou sobre isso na Expoagro e as ações estão sendo feitas em toda a cadeia.
- Como estão as negociações com o Governo?
Todos nós temos que trabalhar para que os insumos que são importados cheguem em tempo hábil. O Governo está trabalhando nisso, embora estejamos cientes das restrições do Banco Central. As câmaras de sementes, fertilizantes e produtos fitossanitários têm contato diário e fluido com as secretarias de Agricultura e Comércio Exterior.
- Com quais restrições você está mais preocupado?
Neste momento, estamos muito cientes das restrições. Por exemplo, no caso da ASA, que representa quase todas as empresas de sementes hortícolas da Argentina, as importações têm sido administradas, acreditamos que o governo entende do assunto e semana a semana é liberado. O que acontece é que os ciclos são decisivos, porque se estivéssemos falando do trigo não adiantaria que as sementes entrassem em novembro, quando acaba a semeadura. Sobre isto, estamos colaborando para estabelecer com as autoridades as prioridades com base na data de plantio.
- Recentemente foi realizado em nosso país o 4º Congresso Mundial do Girassol. O que representou para as empresas argentinas de sementes?
Foi uma grande oportunidade, principalmente para a delegação indiana. Depois da guerra na Ucrânia, o setor argentino de sementes de girassol ampliou sua produção e as condições para crescer estão mais maduras. Há uma estimativa de semeadura de mais de 2 milhões de hectares e, nesse caso, há disponibilidade de sementes em quantidade e qualidade, para o que abrimos a expectativa de aprofundar o vínculo com a Índia, que é um grande comprador.
- Que outras oportunidades têm a indústria argentina de sementes fora dos cultivos principais?
Você tem que levar em conta o algodão e os 400.000 hectares em que está plantado, as leguminosas com a mesma superfície, o amendoim com 380.000 hectares. São setores em que o melhoramento genético é relegado. E são setores que devem ser valorizados. No caso do algodão, por exemplo, a genética vem do INTA e é promovida comercialmente por uma PME nacional. O mesmo vale para o grão-de-bico. Há também oportunidades aí e esperamos que o Projeto de Lei de Promoção de Exportações prospere no Congresso, que em um de seus pontos contempla o incentivo ao uso de sementes autógamas controladas. Esperemos que se avance, como um incentivo concreto aos produtores, com benefícios fiscais e a amortização do investimento. Embora não seja a solução para todos os problemas de competitividade, seria um avanço.